UNICOISAS E COISAS BOAS
Há certos neologismos que são por demais oportunos, criados para incorporação breve aos dicionários mais especializados. Unicoisa é um deles, explicitado por uma mulher de rara inteligência, especializada em Filosofia Política, com pós-doutoramento na Universidade de Genebra.
Para a filósofa Maria Constança Pisarra, por unicoisa se caracteriza um tipo de instituição fingidamente de nível superior, que se esmera na concessão de diplomas de pouca valia, desfavorecendo imagens profissionais, ampliando frustrações, desconstruindo motivações e gerando múltiplas ações predatórias, físicas e jurídicas, públicas e empresariais.
As unicoisas iludem alunos e familiares com modernosidades as mais seduroras, olvidando-se por completo de oferecer um ambiente acadêmico moderno consistentemente emulador, compatível com os desafios de um contexto histórico celeremente evolucionário em todos os segmentos societários.
As unicoisas não privilegiam ampliação dos acervos bibliográficos, menosprezam desburocratizações, desestimulam a criticidade construtiva dos mais lúcidos, esmagam as potencialidades intelectivas dos mais atilados e favorecem o desenvolvimento de uma cultura de fingimento lastreda numa insípida relação professor-aluno, onde o primeiro finge que ensina e o segundo se imagina instruído, embora jamais educado.
Considero um crime de lesa-pátria a tolerância demonstrada nos últimos anos para com autorizações de cursos superiores possuidores de um exame de seleção de faz-de-conta, onde até alguns candidatos relacionados como aprovados sequer comparecem aos dias de prova.
A correção das atuais deficiências do ensino superior somente se concretizará quando alguns sinais emergirem nos horizontes do terceiro grau: pressão comunitária, fiscalização dos conselhos profissionais, atuação mais efetiva do Ministério Público e uma ampla auditagem delegada pelo Ministério da Educação aos colegiados estaduais responsáveis para coibição dos abusos praticados.
Entretanto, no ensino superior nem tudo está se degenerando. Há inúmeras iniciativas louváveis, ainda que minoritárias e incipientes. As mais promissoras: estímulo às reestruturações das representações acadêmicas, favorecendo uma maior cidadanização discente através de amplos debates sobre temas contemporâneos. Meio ambiente, ética profissional, compromisso comunitário, prestação de serviços voluntários, alfabetização de adultos, hortas comunitárias, associação de moradores, partidos políticos, candidaturas fichas-limpas, latinoamericanidade, fé e ciência, cooperativismo, entre tantos outros motes, seguramente principiarão a desindividualizar aqueles intoxicados por individualismos pernósticos e outros isolacionismos mórbidos, alguns respaldados em ontens e sobrenomes que nada mais estão a significar.
Em algumas institições superiores, um micro-questionário é preenchido por ocasião das matrículas. O exemplar que me chegou às mãos tinha apenas cinco questões: 1. Que temas você gostaria de coletivamente debater, no seu curso superior, para ampliar sua profissionalidade futura? 2. Que iniciativas você sugeriria ao seu Diretório Acadêmico ao longo do ano de 2010, fortalecendo uma maior integração entre corpos docente e discente? 3. Que textos você gostaria de ver disponibilizados na Biblioteca, incrementando sua indispensável complementação cultural? 4. Que sugestões você daria para uma avaliação discente isenta da falcatrua dos trabalhos remunerados elaborados por terceiros, que apenas privilegiam os financeiramente mais taludos? 5. Que duas questões você sugeriria na elaboração do questionário do próximo semestre?
Com o sistema de cotas, por etnia ou por escola pública, urge uma necessidade de agigantar as atenções para estratégias integracionais interclasses e intraclasses, desfavorecendo a formação de guetos, sempre discriminaórios, sementes primeiras de distorções comportamentais amesquinhadoras as mais diferenciadas.
No ensino superior, vale a pena ser um pouco mais criativo. Democrático sempre, populista nunca. O mérito sendo visto como alavancador, jamais promovendo rejeições espúrias de quem quer que seja.
(Portal da Globo Nordeste, 07/01/2010, Blog BATE & REBATE)
Fernando Antônio Gonçalves