UM FATO MUITO BIRUTA


O fato é conhecido de muitos, hoje transformado num episódio quase burlesco, tencionando deletar uma baita mediocridade faustosa. Ele representa um imenso alerta, tal e qual um biruta, aquele cone de lona hasteado num mastro, que serve para indicar a direção dos ventos, ou das tempestades.

Uma determinada autoridade eclesiástica, mais importante que o devido currículo, incluiu-se entre os oradores de uma solenidade mínima, numa igreja dirigida por um religioso jovem, de grande liderança comunitária, bem acostumado com a ecologia comportamental da sua freguesia. Subindo orgulhosamente a escadinha que levava até o púlpito, a autoridade começou a falar, perdurando-se por mais de hora, constantando ao final que metade da assistência já tinha se retirado, a outra metade, de cabeça baixa, cochilava com o máximo respeito. Desanimado, o prelado, também humilhado, desce lentamente as escadas e pergunta ao jovem colega de ministério o que ele tinha feito de errado. O jovem não se fez de rogado: “Se o senhor tivesse subido da maneira como desceu, poderia ter descido da maneira como subiu”.

Há uma necessidade imperiosa de se ampliar a criatividade comunicacional em todos os setores da vida moderna: nos palanques, nas entrevistas, nas salas de aula, nas televisões, nas palestras dos mais diferenciados temas e públicos, nas homilias e nos diálogos pais-filhos, mestres-alunos, executivos-funcionários, maridos-mulheres, vendedores-clientes.

A partir da década de 60 dos anos mil e novecentos, o mundo sofreu uma sem retorno mudança axial. Uma mudança significativa nas direções apontadas pela sua biruta. A viagem à lua, as mudanças ocorridas nas religiões, a queda do Muro de Berlim, a Internet, o aparecimento do feminismo, a revolução sexual, uma economia cada mais mundializada, o comércio eletrônico, o narcotráfico, a pirataria digital, o iPhone, o iPad, o Instagram, para não se falar de uma estupendamente imoral exclusão dos povos pobres do mercado planetário.

Na década de 90 última, na área da Administração, por exemplo, foram inventadas inúmeras panacéias, ferramentas infalíveis para o sucesso empresarial de qualquer iniciativa, não se apercebendo, autores e leitores, que as análises objetivas das direções apontadas pela biruta seriam muito mais significativas que os eventos obaobásticos, de excelentes lucratividades.

Quais seriam as tendências básicas para os próximos dez anos, segundo o ainda muito interpretado Peter Drucker? As principais: encolhimento da população jovem; declínio da indústria como geradora de riqueza e emprego. Além dessas, poderiam ser citadas a ampliação do Terceiro Setor, com todas as suas distorções e “oficialidades”, e o revigoramento de uma espiritualidade laica cada vez mais distanciada das descriativas estruturas eclesiais vigentes.

Se o caminho se faz andando, que cada um faça a sua parte, mesmo se reconhecendo naquele passarinho que vai e volta trazendo gotas para apagar um baita incêndio. Sem esquecer a reflexão do luso Fernando Pessoa, que parecia direcionada aos líderes e meganhas religiosos dos tempos de agora. Segundo Pessoa, “De tudo ficaram três coisas: a certeza de que estamos sempre começando, a certeza de que é preciso continuar, a certeza de que seremos interrompidos antes de terminar. Portanto, devemos: fazer da interrupção um caminho novo, da queda, um passo de dança, do medo, uma escada, do sonho, uma ponte, da procura, um encontro.”

Sempre cristãos, sem nunca desistir da inteligência que portamos. Valorizando cotidianamente a correlação inversa entre clérigos e religiosidade em algumas denominações desenvagelizadoras.

PS. Na sua apresentação primeira em solo pernambucano, no sábado passado, Paul McCartney, segurando a bandeira de Pernambuco, declarou que nós éramos um Povo Arretado!!! Merchandising à parte, vibrei com a declaração do artista. Me senti cada vez mais pernambucano, acima de tudo mais brasileiro!!! Sejamos cada vez mais um Povo Muito Arretado!!!

(Publicada em 23/04/2012, no Portal da Revista ALGOMAIS, Recife – PE)
Fernando Antônio Gonçalves