TEXTOS DESASNADORES


No último feriadão, no Portal de Gravatá, um ambiente pra lá de boas conversas e excelente cardápio, deletei-me com umas leituras desasnadoras, o adjetivo sendo criação do Monteiro Lobato, embora ainda não devidamente inserido no Aurélio. Uns textos muito ótimos, daqueles que deixam a gente com os atributos empavonados e com uma peninha danada das vítimas, algumas tornadas por pura zonzeira, outras por inserção abestada na vida, as demais por puro merecimento.
Na segunda manhã, ao terminar um copão de leite ordenhado por um vaqueiro de mesmo, pressenti a curiosidade de dois jovens, vinte e poucos anos, certamente cursando escola de nível superior. Ou inferior mesmo, como a maioria. Sadiamente enamorados, não externavam animalidades, nem as esfregações típicas dos macaqueiros no cio.
Correspondendo à intenção explicitada através de um “bom dia, amigos”, descompliquei o ambiente, deixando-os aptos para a indagação que portavam: “Que livros eram aqueles que o senhor lia, na rede do alpendre, deixando-o com um ar de incontida satisfação?”. A resposta foi antecipada de duas categóricas condições. A primeira dizia respeito à retirada do termo “senhor”, posto que numa vacaria o ambiente não permitia tamanha cerimônia, mesmo porque, ali, a autoridade era o ordenhador, talento necessário para o ocasião. A segunda condição seria conseqüência da inicial: primeiro, a devoção, a degustação dos copões de leite que ainda estavam à disposição dos chegantes, para depois uma conversa amiga com hora marcada de finamento: o instante de começar a espetacular Paixão de Cristo do Zé Pimentel, transmitida, na Sexta-Feira Santa, pela TV Jornal do Commercio, um verdadeiro presente de Páscoa para milhares que não puderam se deslocar até o Marco Zero. Um presentão de primeiríssima qualidadade, como tudo que faz o Pimentel, esse pernambucano gota serena de arretado. E como otimamente propicia a TV Jornal, emissora que sabe bem curtir as coisas da gente.
A surpresa maior, entretanto, ainda estava para acontecer: os dois jovens eram alunos de um Curso de Administração 6A da capital pernambucana. Estavam concluindo o quinto período e buscavam binoculizar os amanhãs com os que já tinham alguns bons quilômetros rodados, que nem eu. Três minutos iniciais de papo ofereceram um diagnóstico preciso sobre os dois universitários: antenadíssimos, mentalmente prontos para o bom combate no mercado de trabalho. E que, por um acaso nunca verdadeiro, tinham acabado de também saborear o livro Executivos Neuróticos, Empresas Nervosas, do Thomaz Wood Jr, Negócio Editora, uma coletânea de textos bussolínicos, que servem tal e qual aquelas birutas plantadas nos campos de aviação, que não mostram a direção correta, mas que apontam para as circunstâncias mais favoráveis, alertadoras, desabestalhadoras por excelência.
Confesso que muito me entusiasmou as cucas do jovem casal. Feliz do docente que encontra pela frente alunos calibrados, culturalmente adequados às suas faixas etárias, sem quaisquer menosprezos pelas curtições e entra-e-sais de uma sexualidade sadia, de comunicação fácil e princípios norteadores capazes de iniciativas e ultrapassagens de excelentes retornos, para si próprios e para o entorno social que deles necessita.
Muito gostaria que inúmeros lessem, assimilando, os textos do Tomaz Wood Jr, talento da Fundação Getúlio Vargas, para quem o Brasil, “aos 500 anos se porta como adolescente esclerosado”. Sintoma preocupante de uma cidadanização mínima e de um corporativismo canhestro, indutores de posturas governamentais fascistóides.
Voltei para o Recife satisfeito. Com o Portal, com o Zé Pimentel, com a TV Jornal do Commercio e com os dois talentos encontrados. Senti firmeza em todos, apesar das maquinações eleitoreiras de uma conjuntura nada alvissareira.