TEXTOS DAS INSÔNIAS


Tem gente que embola e rebola durante horas numa cama, vitima de insônias que causam prejuízos significativos em suas caminhadas existenciais. Salvo se uma inteligência criativa transformar tais horas indormidas em atividades prazerosas. É o caso do Edgar Matos, ex-Secretário de Educação de Pernambuco, também ex-presidente do Conselho Estadual de Educação, ex-companheiro de Fundação Joaquim Nabuco. Ele aproveita as horas de insonolência para escrever crônicas que revivem passados curtidos, ampliam saudades nutridas, refletem preocupações sociais com o futuro da Educação Brasileiro e enaltecem o Náutico Capibaribe, clube de futebol para o qual torcemos.

O ultimo livro do Edgar, Crônicas de um Insone, com prefácio do ex-governador Gustavo Krause, inteligência privilegiada e seu amigo de longa data, traz uma apresentação do advogado Arthur Carvalho, que declara: “o que mais chama atenção nessas deliciosas crônicas de Edgar Mattos são a honestidade de seus relatos, descendo a detalhes de veracidade, a memória privilegiada, demonstrando modéstia quando integra os acontecimentos do relato, e seu estilo escorreito e agradável, deslizando em leve ironia, estilo que empresta à leitura do livro momentos de prazer”.

Li o livro do Mattos no penúltimo final de semana, principiando pelas crônicas de títulos mais atraentes de cada uma das partes – Memórias, Cotidiano, Personagens e Saudades, Humor e Futebol – terminando por não saber qual delas era a mais bem escrita. E senti saudades do antigo prédio do Ginásio São Luís, onde um clube de futebol chamado Guararapes se rivalizava com o Ipiranga, o Edgar integrando a primeira agremiação como atleta cinco estrelas. Como também ele foi, anos 50, do Internacional, equipe da Vila dos Bancários, que congregava jovens das ruas 12 de Outubro, Amélia, Rui Barbosa, Esmeraldino Bandeira, João Ramos e do Cupim, onde o Edgar era conhecido como Bauer, em homenagem ao jogador do São Paulo, então titular da seleção brasileira.

Mas o inusitado do livro é a radiografia que, no final do volume, o Edgar Mattos faz de si próprio, uma autoavaliação merecedora de múltiplos aplausos, pela sinceridade demonstrada. Algumas das suas confissões: sendo vaidoso, não suporta elogios sobre dons que não possui; incomoda-se com as honrarias distribuídas a granel, indiscriminadamente; não gosta de ver seus defeitos proclamadas em público, perdoando sinceramente seus ofendedores; aprecia a sinceridade e ama a simplicidade, ainda que a precariedade lhe desagrade; reconhece os erros e por eles pede desculpas; cultiva as memórias do coração e assume total responsabilidade pelos seus atos, sendo muito exigente para consigo.

Admiro o Edgar Mattos por suas várias qualidades, três delas sendo indispensáveis no combate a uma cultura de fingimento que campeia nos tempos de agora. Uma, a sua capacidade de ler nas entrelinhas, “interpretando subtextos e vislumbrando intenções”. Sentindo-se bastante incomodado quando detecta hipocrisias e pretensões nada nobres, sendo implacável com covardias e traições, por ser demasiadamente franco e transparente. Não sendo dado a “melosidades”, exageros verbais e manifestações “puxasaquísticas”, é possuidor dos dons da liderança, sabendo falar em público, sendo capaz da rir de si mesmo com as próprias deficiências, sempre aceitando as brincadeiras dos amigos, desde que não possuam propósitos “ridiculativos”. A segunda qualidade do Edgar é a permanente demonstração inequívoca do seu amor pela Christina, sua esposa e inspiração de um bocado de anos de felicidade. Obediência sem subserviência, a terceira qualidade, é mote existencial basilar do Edgar. Que deveria ser o mantra de todo cidadão consciente de suas responsabilidades pátrias.

Confesso que a leitura do livro do Edgar Mattos me proporcionou alegrias, risos e saudades. Alegrias de juventude e saudades de fatos e feitos de ontens que não mais retornarão. E risos de montão, ao recordar numa de suas crônicas o desempenho pouco civilizado de Sulanca Vieja, uma atriz metida a global que encenou Maria, na Paixão de Cristo de Nova Jerusalém. Amplamente diferenciada da Maria mãe do Homão da Galileia, inclusive na faixa etária, a atriz já situada anos-luz do período inicial da sua menopausa, sempre a carecer de doses maciças de calmantes anti-fricoteiros.

Que o Edgar Mattos escreva mais textos saborosos como os que presenteou amigos e admiradores. Benditas insônias!!!!

(Publicada em 03/09/2012, no Portal da Revista ALGOMAIS, Recife – PE)
Fernando Antônio Gonçalves