SOBRE VALORES E VACAS SAGRADAS
Pondo de lado a indignação diante das gigantescas falcatruas praticadas com o dinheiro do contribuinte brasileiro, vez em quando escolho um livro de leitura amena, que me tira do sério na direção do bom combate aos falsos heróis e seus feitos de araque. Um livro que me fez ficar mais por dentro de algumas peraltices da nossa história pátria, misturando saborosamente história e humor, respeito e esculacho de alto calibre, é de autoria de Mário Prata, um arretado produtor de mais de 3 mil crônicas e 80 títulos publicados, englobando romances, livros de contos, roteiros e peças teatrais, já tendo abiscoitado 18 prêmios nacionais e estrangeiros, com uma volumosa obra reconhecida no cinema, literatura, teatro e televisão.
Editado pela Record, Mário Prata Entrevista Uns Brasileiros recebeu a seguinte consagração da historiadora Mary Del Priore, talento e formosura dezoito quilates: “De raiz nietzschiana, o livro ataca valores e vacas sagradas, destrói os ídolos e é indiferente a toda forma de sentimentalismo. É um riso de combate. Combate aos falsos heróis e seus pseudofeitos”.
As vinte e duas entrevistas feitas com personalidades que fizeram parte da história do Brasil me fizeram gargalhar à vontade, principalmente agora que estou portando uma nova peça dentária, idealizada pelo conceituado dentista Clodoaldo Peixoto Filho, reconhecido por todos aqueles que se entregam a ela de boca sempre aberta. Que nem eu, que abandonei definitivamente com Sampaio o vício de me apavorar às vésperas de cada consulta.
A leitura do livro me trouxe novidades históricas para mim desconhecidas. A tropa do Álvares Cabral, por exemplo, se deslumbrou com as “meninas nuas”, depois de 44 dias de navegação, do Tejo à Bahia de Porto Seguro, sujos e fedorentos, sem qualquer mínimo de água nos “países baixos”. Que inspiraram um historiador português: “moças bem moças e bem gentis, com cabelos muito pretos e compridos pelas espáduas; e suas vergonhas, tão altas e tão cerradinhas e tão limpas das cabeleiras que, de as nós muito bem olharmos, não se envergonhavam”. Na entrevista feita com Cabral, soube que existe uma placa no seu túmulo, em Santarém, de mármore pesadíssimo, com os seguintes dizeres: “A Pedro Álvares Cabral, descobridor do Brasil, a homenagem de Paulo Salim Maluf”. Quase caí da cadeira de tanto rir!!!!
A entrevista com o bispo Sardinha (nenhum parentesco com Fernando Sardinha, meu amigo irmão da Capital Federal, avô da linda Luiza) revela que ele foi o primeiro bispo brasileiro comido literalmente pelos índios caetés e que gostava de anedotas apimentadas. Uma delas se referia a um papa que, segundo orientação médica, seria curado de uma brava doença se fizesse sexo. Depois de muitas recusas, sua santidade externou suas exigências: que a comida fosse cega, surda e muda e que tivesse os seios fartos e rijos, a la Fafá de Belém. Indagado sobre a razão de tão estranha exigência, ele declarou “Quia unus erit quia placet, uai”. Num português contemporâneo “Porque vai ser só uma e eu gosto muito, uai.” E soube ainda pelo livro que o bispo Sardinha foi cevado por três longos meses, onde engravidou três indiazinhas. Decididamente um bispo que comeu e foi comido.
No papo mantido por Prata com Dom Pedro I, fiquei sabendo que ele teve 19 (dezenove) filho: 7 com a imperatriz Leopoldina, 1 com a imperatriz Amélia, 5 com a Marquesa de Santos, 2 com a francesa Noémi Thierry, 2 com Maria Benedita de Castro Canto e Melo (irmã da Marquesa de Santos), 1 com a amante francesa Clémence Saisset e 1 com a monja portuguesa Ana Augusta, que cantava no coro de uma missa solene quando foi destravada. Com algumas outras características: cinco filhos chamados Pedro, quatro filhos em 1823, dois filhos num mesmo ano com duas irmãs. Um rei que tinha um pinguelo tamanho zebu!!
Com Dona Beja, com sua genitália vibrátil, contráctil, suçante, aspirante, envolvente e deglutante, segundo historiador da época, a entrevista aconteceu num bar chamado Cu do Padre, um boteco bem sujinho de Estrela do Sul, não muito distante de Araxá, onde ela vivenciou seus melhores momentos, depois representados pela Maitê Proença, num filme quase escaldante. Na conversa mantida, ela já tendo ultrapassado a marca de 7.0, declara que teve a felicidade de ver o cometa Halley, em 1800, com 35 anos, logo após o nascimento da primeira neta, fato nunca anunciado pela imprensa. Reclamou que recebeu merda de uma puta chamada Siá Boa, que enviou para ela uma caixa de presente, contendo merda rala. Que ela agradeceu enviando uma bandeja de prata, com um bilhete onde dizia apenas “Cada um dá o que tem!”. E confirmava umas histórias que atordoavam os moralistas: “Transei com dois homens casados e um padre, na minha vida no Araxá. Para aquele tempo isso era demais. Tive uma filha com cada um dos casados. Só isso. Com o padre, não. Ele cuspia fora”. E confessou que somente liberou de fato a perereca a partir dos 53 anos, quando chegou para a hoje cidade de Estrela do Sul. E que passou entre as coxas etc e tal toda a guarnição da Guarda Nacional do Imperador. Embora sendo analfabeta, chegou a juntar uns bons trocados, seu sonho atual sendo de colocar uma dentadura. Para sorrir bonito e gosto, a la Maité Proença.
Bom demais conhecer a fundo a história de nossa gente. Inclusive de algumas vacas sagradas, que se projetaram muito ardilosamente, tal e qual aquela figura do Maurício de Nassau, que partiu, demitido que foi a 30 de setembro de 1643, para a Europa, numa esquadra de 13 naus que transportavam uma carga sua avaliada em 2,6 milhões de florins. Numa época onde o juiz Sérgio Moro ainda não havia nascido…
(Publicado em 10.08.2015, no site do Jornal da Besta Fubana – www.luizberto.com)
Fernando Antônio Gonçalves