SOBRE GUERRA E ESPIONAGEM
I – SOBRE GUERRA
Quatro homens poderosos, Roosevelt, Stálin, Churchill e Truman, no período acontecido entre a Conferência de Yalta e o bombardeio de Hiroshima, testemunharam acontecimentos que alteraram a arquitetura política mundial: a transformação dos Estados Unidos e da União Soviética nas duas nações mais poderosas do planeta; a derrota da Alemanha nazista e do Japão imperial; o Império britânico à beira de um colapso econômico; a morte de um presidente três vezes eleito; um ditador doentio que quase conquistou o mundo; um primeiro-ministro que havia inspirado seu povo durante os dias de guerra derrotado em eleições livres; milhões de pessoas sendo enterradas em vala comum; cidades históricas reduzidas a escombros; e um tzar vermelho redesenhando o mapa da Europa e erguendo uma “cortina de ferro” entre Oriente e Ocidente. Além da aliança entre exércitos de duas grandes potências, oficialmente aliadas, embora guiadas por ideologias opostas, configurando a previsão de Alexis de Tocqueville, efetivada mais de um século antes: “Seus pontos de partida são diferentes, assim como seus percursos não são os mesmos; contudo, cada um deles parece destinado pela vontade dos céus a conduzir o destino da metade do globo”.
Para quem deseja se inteirar melhor do ocorrido entre Yalta e Hiroshima, o livro Seis Meses em 1945: Roosevelt, Stálin, Churchill e Truman; da Segundo Guerra Mundial à Guerra Fria, do historiador e jornalista Michael Dobbs, também professor de Princeton e Harvard, Compahia Das Letras, 2015, é uma excelente recomendação para quem apreender com segurança os dramáticos acontecimentos verificados em metade de um ano.
Num último capítulo, Michael Dobbs analisa o início e o fim da Guerra Fria, quando já nos primeiros dias do segunda semestre de 1945, americanos e russos já tinham comprovações suficientes de que o outro lado não estava cumprindo os acordos estabelecidos em Yalta.
No mundo político, onde quase todos fingem cumprir diretrizes partidárias, a lição do homem público Darcy Ribeiro deve ser decantada em prosa e verso: inteligência transcende posicionamentos políticos, integridade analítica independe de cores partidárias, divergir com honestidade se posta acima dos alicerces do cotidiano convivencial. Por estas plagas, os bundas de cá costumam aplaudir tudo o que chefe de cá faz, lascando o pau no chefe dos bundas de lá, como se erros e omissões de todo calibre não existissem nos dois lados da banda.
Outro dia, aqui no Recife, alguém foi convidado para um café com bolacha na casa de um renomado líder político, consagrado nacionalmente por saber administrar bem a mauricéia. Recusou delicadamente, alegando que o seu chefão poderia não gostar, sendo muito provável sua queimação, se comparecesse. E uma amizade sólida quase fica chamuscada por uma frouxura tamanho família. Um cagaço de entrar pro livro dos recordes.
II – SOBRE ESPIONAGEM
Para quem leu Arte da Guerra, de Sun Tzu, a espionagem é um ato só permitido entre beligerantes, nações, grupos guerrilheiros em guerra e/ou guerrilha. Consiste na prática de obter informações de caráter sigiloso relativas a governos ou organizações, sem a autorização desses, para obter certa vantagem militar, política, econômica, científica, tecnológica e/ou social.
Consultando o Google, a palavra “espionagem” vem da palavra francesa “espionner”, que significa “espionar”, e do italiano clássico “spione”. A palavra “spy” é originária de várias palavras antigas significando “olhar e observar”, como no latim “specere” ou no anglo-normando “espier”.
Os antigos egípcios possuíam um sistema completamente desenvolvido para a aquisição de informações, e os hebreus também o usaram. Mais recentemente, a espionagem teve participação significativa na história da Inglaterra no período elizabethano. No entanto o primeiro serviço secreto oficial foi organizado sob ordens do rei Luís XIV de França.
Em muitos países, a espionagem militar ou governamental é crime punível com prisão perpétua ou pena de morte. Nos Estados Unidos, por exemplo, a espionagem é ainda um crime capital, embora a pena de morte seja raramente aplicada nesses casos, pois em geral o governo oferece ao acusado um abrandamento da pena, em troca de informações.
Aos interessados em saber mais sobre o assunto, recomendo a leitura de A História da Espionagem, de Ernest Volkman, SP, editora Escala, 2013. O autor é uma autoridade consagrada no assunto, possuindo vários livros sobre inteligência e segurança nacional. Veterano da inteligência do Exército dos EUA, reside em Massachusetts. Seu livro analisa o assunto desde os tempos antigos até o mundo pós-9/11, numa ordem cronológica cativante e excelentemente bem exposta.
Segundo Volkman, a inteligência funciona em três níveis: o estrategico, de avaliar as intenções e evoluções; o tático, que operacionaliza; a contrainteligência, que protege os segredos a partir de operações efetuadas por outras áreas/instituições. Como toda atividade do ser humano, tudo sempre sujeito aos seus caprichos. Daí nunca ser infalível qualquer tipo de espionagem.
Como nasceu a espionagem? Surgiu a partir das obcecadas ideias das grandes civilizações antigas – egípcia, hitita, assíria, babilônica e persa – de edificarem impérios universais, para isso sempre carentes de informações dos concorrentes. Tabuletas de barro, gravadas há mais de 4.000 anos já descreviam operações de espionagem. E uma tabuleta, encontrada na Mesopotâmia, continha informações sobre o fabrico de esmalte, o maior segredo da antiga Suméria, prova cabal de que a espionagem industrial era também dos tempos a.C..
O livro do Volkman é uma agradável leitura instrutiva para quem deseja ampliar conhecimentos sobre espionagem, desde os tempos pré-bíblicos até as contemporâneas guerras contra o Terror e a espionagem nuclear. Desde antes Judas até o inesquecivelmente trágico 11 de setembro.
(Publicada em 24.10.2016, no site do Jornal A Besta Fubana e no www.fernandogoncalves.pro.br)
Fernando Antônio Gonçalves