SAMURAIS E PEBAS


Vez por outra me deparo com dois tipos de gente. De um lado, observo os gentis, que são muito piedosos e de bom coração, ainda que não consigam canalizar tais qualidades na construção de realizações consistentes e duradouras. Também, no palco da Vida, verifico a presença dos que promovem grandes eventos, são agressivamente vocacionados para o empreendedorismo, embora nunca levem na devida conta a sensibilidade dos que integram os seus derredores. Os dois tipos – os muito piedosos e os agressivamente empreendedores – são, frequentemente, egoístas e autocentrados, como se todo o resto dependesse exclusivamente deles e das suas intenções.
Desde os tempos de universidade, tenho admiração por aqueles que sabem conjugar talento, coragem e ética, na efetivação de empreendimentos que marcam cenários, transformando-os ou catapultando-os para novos patamares civilizacionais. E os “mandamentos” deixados por um filho de samurai, o Miyamoto Musashi, nascido em 1584, oferecidos em sala de aula pelo professor Germano Coelho, que foi paraninfo da nossa turma, ainda balizam o meu cotidiano existencial. Regras comportamentais plenamente válidas para muitos séculos do porvir: 1. Nunca pense desonestamente; 2. O caminho está no treinamento; 3. Trave contato com todas as artes; 4. Conheça o caminho de todas as profissões; 5. Aprenda a distinguir ganho de perda nos assuntos materiais; 6. Desenvolva o julgamento intuitivo e a compreensão de tudo; 7. Perceba as coisas que não podem ser vistas; 8. Preste atenção até ao que não tem importância; 9. Não faça nada que de nada sirva.
Nos anos 90, um livrinho apaixonante, intitulado Gerência em Pequenas Doses foi sucesso editorial. Foi escrito por um especialista em pesquisa, Russell L. Ackoff, à época já bastante conhecido dos profissionais brasileiros. Nele, são ministradas 52 bem medidas doses, onde se mesclam informações, provocações e oportunos desabestalhamentos. Úteis para quem busca assimilar procedimentos inovadores, ousados e criativos, indispensáveis nos primeiros passos de toda camimhada profissional. Propositadamente, explicito aqui apenas três reflexões do livrinho-gigante: 1. Quanto mais desenvolvidos se tornam os indivíduos, organizações ou sociedades, menos dependem de recursos e mais podem fazer com qualquer recurso que tiverem; 2. Aperfeiçoar é pensar sem restrições. Pensar sem restrições é pensar criativamente; 3. Aqueles que não sabem, mas pensam que sabem, são conselheiros mais perigosos do que aqueles que não sabem, mas sabem que não sabem.
O texto do Ackoff muito favorece aqueles que desejam associar a impulsividade empreendedora com uma serenidade convivencial. Integrando a capacidadede de sonhar, tal e qual fazem os iniciativos, e uma efetiva postura comunicacional. Sempre a diferenciar as utopias das ilusões passageiras, uma comunicação pessoalista substituindo a comunicação individualista, a primeira voltada para pessoas de todos os matizes e regiões. E que percebem que Internet e Intranet não garantem, em si, uma comunicabilidade densamente afetiva, posto que não reproduzem emoção e crença, irmãs siamesas que envolvem corações e mentes. Siamesas que pressentem que as causas dos problemas estão, inúmeras vezes, por debaixo dos panos, como canta o Matogrosso, talento brasileiro. E que sabem ainda diferenciar a enorme distância entre aceitar e acreditar, nunca subestimando os efeitos corrosivos dos pietismos que camuflam as arrogâncias.
Ultimamente, estou recomendando aos que buscam ampliar-se como pessoa num mundo cada vez mais competitivo uma leitura diferenciada: Como Ser Extraordinário em um Mundo Comum – A Filosofia Samurai, de Brian Klemmer, editora Larousse. Suas reflexões em muito ampliarão a compreensão sobre o que o medo representa: uma estratégia suicida, que inibe as multiqualificações profissionais, agigantando as distâncias culturais entre o talento e o tá-lento. A ratificar o pensar de Ortega y Gasset: “Diga-me em que você presta atenção e lhe direi quem você é”. Se samurai, como os talentosos. Ou peba, como Manuel Zelaya, metido a herói, com cjapéu de cowboy e seu circo de apaniguados.
PS. Para João Carlos Paes Mendonça, um samurai nordestino, admiração crescente de longa data.