PRÁTICAS DE LIDERANÇA


Geralmente, com raríssimas exceções mundo afora, nos Cursos de Administração se estuda a liderança como se ela fosse um conjunto de muitas técnicas, nunca uma vivência. Daí um gigantesco clima de insatisfação nas graduações de Administração. Os alunos mais atilados percebem que algo mais deve prevalecer sobre “regrinhas e carimbos, ordens de serviço e portarias”.

Um livro recentemente lançado pela Edições de Janeiro, no outono passado, está sendo objeto de seminários e inúmeros debates entre empresários que buscam ampliar as suas liderança e a dos seus comandados, favorecendo um ambiente de trabalho mais humanamente apropriado para os enfrentamentos de um século ainda aturdido com as perspectivas dos seus amanhãs. Intitulado Liderança Heroica, de Chris Lowney, o livro ressalta as melhores práticas de liderança da Companhia de Jesus, que há mais de 450 anos vem mudando o mundo. Um livro para pessoas de qualquer crença, agnósticos e ateus, que aponta os principais valores desenvolvidos pelos jesuítas – a autoconsciência, a inventividade, o amor e o heroísmo – mesmo após 450 anos de fundação.

No prefácio do livro, seus autores informam: “Os jesuítas talvez sejam a ordem religiosa que mais tenha contribuído para aproximação da Igreja com a ciência e isso lhes dá, neste momento atual de revolução tecnológica, uma enorme responsabilidade para dentro e para fora da Igreja. Não se trata, entretanto, de um desafio novo para a Companhia, que se manteve quase todo o tempo, como o livro bem aponta, fiel aos valores atemporais praticados desde sua fundação.” E mais explicitam: “O autor é um empolgado humanista, cuja experiência de longos anos no J.P. Morgan, um dos maiores bancos de investimento do mundo, se soma aos anteriores sete anos no noviciado jesuíta. As lições repartidas conosco são resultado de uma leitura especialíssima que alimenta o interesse de todos que queiram um caminho seguro para a conquista da liderança via autoconsciência e vivência contínua de um comportamento inovador, conjugado à prática do amor ao que se faz e ao próximo”.

A leitura do livro do Lowney é gratificante, mormente agora, quando uma revoada de tecnocratas se imaginam senhores de um domínio carimbológico, repleto de papers quantitativos e alguns sorrisos para a midia, sem atentar para o que de realmente se manifesta por debaixo dos panos, como cantava o Mato-Grosso, esse menestrel de talento dos outrora notáveis Secos & Molhados.

Deve-se ficar atento para alguns capítulos do livro. No segundo, por exemplo (O que fazem os líderes), o autor ironiza os manuais que abarrotam as prateleiras das livrarias com títulos apocalípticos: “Sete milagres”, “Catorze técnicas poderosas”, “Doze simples segredos”, “21 leis irrefutáveis”, “Trinta verdades”, “101 erros fatais”, ”1001 caminhos”, entre outras apenas marqueteiras babaquices homéricas, dessas “pra inglês ver”, até mesmo o Príncipe Charles, o agora bicorno mais famoso do reino da Elizabeth.

No capítulo referido acima, um veredicto de John Kotter deveria estar estampado em todas as salas de aula dos cursos de Administração dos países em desenvolvimento ou em fase de frágil maturidade, caso brasileiro: “Estou completamente convencido de que a maioria das organizações de hoje não possui a liderança de que precisa. E o saldo devedor é imenso”. O déficit de liderança é aceito amplamente como sendo real, não um factoide. Basta ver as idióticas manifestações recentes sobre o “Padrão FIFA”, quando tudo não passava de uma gigantesca quadrilha iludindo milhões de torcedores do mundo inteiro, inclusive brasileiros, através de anestésicas arenas futebolísticas, gigantescos túneis cavados para mirabolantes lavagens de muitos milhões de dólares. No Brasil, fazendo concorrência ao alibabástico Petrolão, um entre muitos outros escoadouros da canalha financeira.

O livro comprova que “o estereótipo da liderança imediata, de cima para baixo, que tudo transforma, não é a solução: é o problema.” E dá dois motes excelentes: “A liderança não é definida pelo tamanho da oportunidade, mas pela qualidade da resposta”; “tornar-se líder é um processo continuo de desenvolver a si mesmo”. Segundo o autor, os jesuítas tornaram-se líderes através de quatro vertentes: compreenderam suas forças, suas fraquezas, seus valores e sua visão de mundo; inovaram com confiança, e se adaptaram para abarcar um mundo em contínua transformação; engajaram os outros com uma atitude positiva e amorosa; e energizaram a si mesmos e os outros através de ambições heroicas. As primeiras realizações jesuíticas estão impregnadas dessas quatro vertentes, que emergem dos escritos deixados e dominam vivências de muita fé, sempre com amor maior que os medos.

O texto do Chris Lowney, leitura aprazível para quem deseja saber aonde quer chegar, traz ainda ferramentas poderosas de aperfeiçoamento para toda a vida: os exercícios espirituais, a coragem de delegar afirmativamente, a inventividade num mundo em transformação, o compromisso com a excelência e como exercer a liderança ao modo jesuíta.

Capítulos que poderiam ser debatidos em seminários de secretários municipais e estaduais de governo, reitores e pró-reitores de universidades e dirigentes de estatais. Tudo acontecendo sob um único balizamento: O maior risco é não assumir nenhum risco!!!

(Publicado em 22.06.2015, no site do Jornal da Besta Fubana – www.luizberto.com)
Fernando Antônio Gonçalves