POR UMA SADIA EXISTENCIALIDADE (*)


Eis um livro de autoajuda desfrescurizado, sem salamaleques nem idiotismos baratos. Um trabalho elaborado por um arquiteto talentoso, companheiro de caminhada cristã, que conjuga com extraordinária competência o trinômio espiritualidade/liderança/planejamento pessoal, também percebendo cotidianamente que, em múltiplas ocasiões, “criar o silêncio é descansar no colo de Deus”. Para melhor assimilar um futuro já instalado entre nós, onde “em poucas décadas a humanidade conseguiu prolongar a duração da vida média, decuplicar a população mundial, abolir a escravidão, construir obras surpreendentes, fazer descobertas científicas inimagináveis, escrever obras-primas literárias e músicas suaves, inventar próteses úteis e confortáveis, explorar células e planetas com a mesma precisão”, utilizando o descrito por Domenico de Masi em seu último livro (O Futuro Chegou, Casa da Palavra, 2014), muito embora não tenha havido progresso na felicidade média global de uma comunidade planetária que hoje oscila entre desorientação, angústia e medo.

O livro do Fábio Vasconcelos chegou num momento significativo, onde a maior tragédia do homem brasileiro está na sua dominação pela força dos mitos, abdicando de uma soberana capacidade de discernir e discordar, indispensável no trato da cotidianidade. Por via de consequência, os mais jovens estão mitificando os seus superiores, para breve se arvorarem de primogênitos de deus. Olvidam-se que no palco da vida há coisas, mil coisas, que custam bem pouco mas acarretam efeitos extraordinários. Um telefonema, por exemplo. Um cartão de agradecimentos. Ou um atendimento personalizado, quando o assunto merecer importância. Procedimentos que diferenciariam o agora de um passado ditatorial, tecnocrático e pernóstico, até bem pouco tempo vivido e observado pelos que ainda não estão de cabeça baixa.

Combatente vigoroso dos três mosqueteiros do desequilíbrio existencial – passividade, acomodação e conformismo – em seu livro Fábio incentiva todos a “cortar o umbigo dos nossos ontens”, nos transformando em “caçadores de felicidade”. Posto que, ao longo da nossa existência, morremos quando um amigo se vai, diante dos punhais cravados pelos parentes aparentes, pelas animalidades cometidas por amigos de mentirinha, ou quando as arrogâncias corroem um debilitado humanismo século XXI.

Ao longo das nossas vidas, diante da inexorabilidade da morte, tomamos quatro atitudes diferentes. Quando crianças, a morte nos é indiferente. Um acidente da vida como outro qualquer. O escuro, quando se é criança, provoca muito mais medo que a própria morte. Para não falar das almas do outro mundo. Brinca-se até de morto como se brinca de bandido ou de mocinho. Na adolescência, principiamos a pensar na morte. Idealizamos a morte, mitificamos a morte. Começamos a pensar na própria morte. E principiamos a morrer, diante dos primeiros desmoronamentos provocados em nosso castelo-derredor. Mas ainda encaramos a morte como final de uma aventura, sem tropeços nem maldades, apenas coroamento, sem as pedras do caminho . A inimizade se inicia na porteira da maturidade. A morte torna-se a maior inimiga, temida, mais analisada, filosófica e religiosamente. A indagação de São Paulo inquieta: “Morte, onde está tua vitória?.” A morte é término ou passagem? Túmulo ou túnel, como magistralmente o pastor Campos costumava dizer em suas pregações. Com crença ou sem ela, a agonia da morte se torna presente e o viver um contínuo e resoluto foco de resistência. No último quadrante da vida, entretanto, “a mesa está posta e a cama feita”, como nos dizia o poeta Bandeira, que vivia aos trancos e barrancos com a Última Dama.

Creio firmemente que a concepção da morte é determinada pela concepção que se faz da vida. Superar a morte, eis o desafio maior dos libertos dos encantamentos supérfluos, das prestimosidades dos lambetas, das pantufas sabichonas, dos burregos tecnocratas que desconhecem os valores de uma sociedade emergente e dos recalcados recalcitrantes, que se imaginam eternas vítimas, cordeirinhos imolados de um mundo que não os compreende devidamente. Sem falar aqui dos azedos – homens e mulheres – que imaginam sempre estar em ambientes europeus, reinos se possível, os daqui nada mais sendo que peças fétidas de um contexto de ofuscados pelas suas “luminosidades.”

Através do livro do Fábio, saberemos, sem dogmatismos nem fundamentalismos, buscar saídas concretas para as “pedras do caminho” do cotidiano existencial. Para desmascarar, inclusive, os de ideologias obsoletas, das mais diferentes classificações, que proliferam sob múltiplas incoerências, inclusive religiosas, réplicas monstruosas ou caricaturais das respectivas matrizes.

A solidariedade humana deve ser entendida como uma maneira de se ensinar a pescar, sendo necessário, sempre que houver ocasião, proclamar que a educação para todos, mormente a educação básica de eficaz conteúdo, amplia a cidadania e fortalece os direitos e deveres da sociedade. E o livro do Fábio Vasconcelos recomenda diretrizes para se travar o bom combate dos quatro sustos da presente conjuntura: o susto técnico, que a partir das maravilhas de uma evolução científica não conseguiu integrar a sociedade humana, muito pelo contrário; o susto utópico, que somente a partir dos anos 60 principiou a despertar consciências acerca da decantada, em prosa e verso, eficiência civilizatória; o susto lógico, que imaginou, neste início de século, que o fracasso na construção da utopia é uma decorrência direta do êxito na construção técnica; e o susto ético, que está alertando os mais conscientes acerca da evolução da desigualdade social na direção de uma constrangedora diferença de civilizações.

O texto do Fábio Vasconcelos em muito favorece uma utopia nunca cavilosa acerca do derredor e das maneiras de superá-lo. Um caminhar pessoal que não é instantâneo, exige diálogo e diálogo sem subterfúgios nem embromações. E liderança com muita humildade, revestida sempre de uma maciça dose de esperança, edificada através de comprometimentos sociais, alicerces maiores de toda Fé.

(*) Prefácio do livro EU TÔ AQUI PRA TE AJUDAR – PROVOCAÇÕES SOBRE LIDERANÇA, PLANEJAMENTO PESSOAL, ESPIRITUALIDADE, Fábio de Souza Vasconcelos, editora Papelote, Santa Maria, RS.
(Publicada em 26.05.2014, no Jornal da Besta Fubana, Recife, Pernambuco)
Fernando Antônio Gonçalves