PLANO SECRETO
Uma conversa foi captada por um RDF – Rastreador de Diálogos Futuros, instalado no Vale do Silício, Califórnia, área criada para gerar inovações tecnológicas e científicas. Transcrevo-a com a certeza de que não mais estarei por estas bandas, em 2040:
– Vovô, por que o mundo está acabando em tanta violência?, pergunta o neto de oito anos, revelando a pura inocência de uma alma inquieta.
– Porque não existe mais professores, neto amado.
– Professor, o que é isso?
– Professores eram homens e mulheres bem trajados e dedicados, que se expressavam de maneira culta e que, há muitos anos, ensinavam as pessoas a falar, ler, escrever, se comportar, localizar-se no mundo e na História, entre muitas outras atividades, inclusive pensar e ser bons profissionais.
– Eles eram sábios, vovô?
– Ensinavam, mas não eram todos sábios. Apenas alguns, os grandes professores que ensinavam outros professores e que eram amados pelos seus alunos.
– E por que foi que eles desapareceram?
– Ah, foi tudo parte de um plano secreto, que foi sendo executado aos poucos por alguns vilões da sociedade. O vovô não se lembra direito o primeiro deles, mas sem dúvida, os políticos ajudaram muito. Eles acabaram com a avaliação dos alunos, apenas para mostrar estatísticas de aprovação. Assim, sabendo ou não sabendo, os alunos eram aprovados. Isso liquidou o estímulo para estudar. Depois, muitas famílias estimularam a falta de respeito pelos professores, que passaram a ser vistos como empregados de seus filhotes. Estes eram ensinados a dizer “eu estou pagando e você tem que me ensinar”, ou “para que estudar se meu pai não estudou e ganha muito mais do que você?”, ou ainda “meu pai me dá mais de mesada do que você ganha”. Para isso também ajudou a multiplicação de escolas mais interessadas nas mensalidades do que na qualidade do ensino, e que, quando recebiam reclamações dos pais, pressionavam os professores, dizendo que eles estavam contratados para simplesmente aprovar. Os professores eram vítimas de violências físicas, verbais, morais e salariais, virando saco de pancada de todo mundo. Além disso, qualquer proposta de ensino sério sempre esbarrava na obsessão dos pais com a aprovação do filho no vestibular, para qualquer faculdade que fosse. “Ah, eu quero saber se isso que vocês estão ensinando vai fazer meu filho passar no vestibular”, diziam os pais nas reuniões com as escolas. E assim, praticamente todo o ensino foi orientado apenas para os alunos passarem no vestibular.
– E o que aconteceu depois?
– Os salários dos docentes foram gradativamente sendo mais aviltados, ninguém mais querendo se dedicar à profissão. Quando alguém criticava a qualidade do ensino, sempre se dizia que a culpa era dos professores. As famílias se tornaram descrentes da educação, pois viam que os “bem sucedidos” eram políticos, modelos, jogadores de futebol, artistas de televisão, piniquetes, rosimeres e outras , pessoas sem contribuição real para a sociedade.
– Pobre país, vovô!!!
– Lamento por você, meu neto muito amado.
ATENÇÃO: Qualquer semelhança com um país ultrajado e saqueado por mensaleiros e mafiosos não é mera coincidência. Apenas muita desilusão.
(Publicado no Jornal do Commercio, Recife, Pernambuco, 22.02.2013)
Fernando Antônio Gonçalves