PEDRO I, UM MAU NECESSÁRIO
Para quem não conhece ainda os pormenores biográficos de uma das figuras mais importantes da História do Brasil, Pedro I, um texto esclarecedor e muito bem escrito poderá ampliar a compreensão sobre a formação da nossa nacionalidade, a partir da chegada da Família Real ao Brasil, em 1808, fugida das tropas napoleônicas. De autoria da historiadora cearense Isabel Lustosa, PhD em Ciência Política e pesquisadora da Fundação Casa de Rui Barbosa, o livro D. Pedro I – um herói sem nenhum caráter, Companhia das Letras, 2006, traz um perfil bastante lúcido do primeiro “Macunaíma da história nacional”, Pedro I, de nome completo Pedro de Alcântara Francisco Antônio João Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Serafim de Bragança e Bourbon, quarto filho de d. João e d. Carlota Joaquina e segundo varão.
O pai foi definido pela autora do livro, como “baixo, gordo e moreno, possuindo a cabeça grande demais para o corpo, os cabelos quase encarapinhados, o lábio inferior grosso e caído, um ar abobalhado, de mãos e pés muito pequenos, possuindo ainda uma articulação defeituosa devido à falta de dentes, não sendo a higiene seu ponto forte, não tendo o mais leve pendor para novidades, sempre a carregar pedaços de frango nos bolsos das suas vestimentas quase apodrecidas, sendo medroso até o pânico”. E a mãe, casada com d. João quando tinha apenas 10 anos de idade, embora de casamento somente consumado cinco anos depois, tão ou mais feia que ele, era filha de Maria Luísa, considerada uma das mais imorais rainhas da Espanha. De personalidade prepotente, intrigante, ambiciosa, era conhecida pelos seus atos de crueldade, logo cedo detestando seu marido, pacatão, indolente e desajeitado. Era, segundo historiador da época, “baixa, quase anã, manca, com uma espádua mais alta que a outra, tinha pele do rosto grossa e marcada pela bexiga, nariz vermelho, olhos miúdos e injetados, queixo de quebra-nozes e lábios finos e arroxeados, adornados por buço espesso que, quando se abriam, deixavam à mostra dentes enormes”. Também não era muito limpa, na velhice vestindo-se como uma bruxa, “usando sobre a saia duas bolsas de couro compridas que iam até os joelhos e estavam sempre cheias de rapé e de relíquias, ossos, cabelos e outras coisas do gênero que de vez em quando beijava”. Apesar de toda essa aparência e comportamento, d. Carlota era chegada à pratica de incontáveis malabarismos sexuais fora do casamento, sempre se banhando nua na praia de Botafogo. Colecionava amantes e fumava diamba (hoje chamada maconha), sempre com inescrupulosos alvoroços sexuais. Madame Junot, mulher do general francês Philipe Junot, reconhecia que ela, aparentemente um ser estranho, “era mulher, pois sabia de fatos à época que provavam fartamente seus inúmeros casos amorosos”. No Rio de Janeiro, os casos da Carlota ficaram famosos, tendo a impecável Leopoldina, mulher de Pedro I, escrito à irmã Maria Luisa sobre a sogra: “sua conduta é vergonhosa, e desgraçadamente já se percebem as consequências tristes nas suas filhas mais novas, que têm uma educação péssima e sabem aos dez anos tanto quanto as outras que são casadas”.
Entretanto, Pedro I, filho de um casal de tamanha mediocridade comportamental, foi um mau necessário para o Brasil. Sua impetuosidade amorosa para com o país, tornou-o herói maior da nossa independência, também se entronizando em Portugal posteriormente como Pedro IV, fazendo regente sua filha Maria da Glória, após a derrota do mano Miguel.
Os fatos históricos da vida de Pedro I, suas peraltices amorosas e suas descaradas amizades para com acanalhados diversos são narrados de forma sedutora pela historiadora Isabel Lustosa, desde seu nascimento até sua entrada vitoriosa em Lisboa, derrotando o irmão e um formidável exército de 80 mil soldados. Uma guerra que lhe custou a vida aos 36 anos de idade, em 24 de setembro de 1834, ele que foi rei, filho e neto de reis, “defensor das instituições livres na América e na Europa, que dera constituições às suas duas pátrias e que deixou a filha reinando em Portugal e o filho no Brasil”.
Conhecer Pedro I, suas bravuras e ignomínias, é dever de quem deseja conhecer melhor um dos nossos heróis do passado. Dom Pedro I foi herói no Brasil e em Portugal, embora, reconhecidamente, um herói sem nenhum caráter.
PS1. As recentes eleições para as presidências do Senado e da Câmara dos Deputados é clara evidência da existência de uma patifaria de longo percurso, que somente será extirpada do cenário político nacional através da ampliação da Cidadania Brasileira, promovida por uma Sociedade Civil que há muito já deveria ter se indignado, consciente de seu papel histórico libertador.
PS2. Um eleitor idiota que queima seu título de eleitor perante repórteres fotográficos, só para ser notícia de jornal por um dia, é a explicitação mais cabal da continuidade de políticos desqualificados no cenário político nacional.
(Publicada em 04.02.2013, no Jornal da Besta Fubana, Recife, Pernambuco)
Fernando Antônio Gonçalves