PARA SE TORNAR GENTE


Se eu ganhasse uma bolada na loteria, reservaria uns bons trocados para enviar um livro muito precioso para um montão de políticos e homens públicos brasileiros. Para que aprimorassem seus caráteres, ampliando suas capacidades de bem servir, antes das trovoadas que podem interromper suas insípidas trajetórias, merecedoras de extensas temporárias carcerárias.

O livro que compraria seria o do rabino Y. David Weitman, chamado A Arte de Ser Mais Gente, editado pela Maayanot. Textos bem estruturados contendo os traços nobres de um viver decente, onde muitos dos princípios da psicologia moderna estão encravados, há mais de dois mil anos, nos ensinamentos transmitidos pelas fontes judaicas mais significativas. Num mundo que então vivia em situações bem mais precárias que as contemporâneas.

O balizamento dos textos do rabino Weitman reflete receita muito antiga, contida no livro das Lamentações 5,21: “Renove nossos dias como outrora”. Uma renovação que implica necessariamente na ampliação da “enxergância” cotiana, na compreensão mais luzidia sobre a virtude da generosidade, virtude que se encontra radicalmente equidistante da avareza e do esbajamento. E a explicação, segundo os ensinamentos judaicos, é a de que “sempre haverá dois extremos para cada virtude”.

As dezesseis partes do livro A Arte de Ser Mais Gente, seguramente proporcionariam aclaramentos alicerçais nos nossos políticos e dirigentes públicos, hoje, no conjunto, um bloco que se encontra situado muito abaixo de um nível mínimo de decência. Os ensinamentos contidos em cinco daquelas partes – Contentamento x Ganância, Discrição x Ostentação, Retidão x Desonestidade, Sabedoria x Ignorância e Verdade x Mentira -, certamente proporcionariam um direcionamento mais higienizado naqueles necessitados de altas doses de hombridade.

Para o primeiro dos binômios acima, o rabino Weitman conta a seguinte história: Um homem era especializado em escavar pedreiras em busca de minerais. Num dia muito calorento, ele pediu a Deus que o transformasse em sol. Deus o atendeu. Mas uma núvem o encobriu e ele pediu a Deus para ser núvem, pois acreditava ser ela mais poderosa que o sol. Mas chegou o vento e arrastou a núvem. E ele, imaginando o vento mais forte que a núvem, pediu ao Todo Poderoso para ser vento. Mas como o vento não ultrapassava as montanhas, ele desejou ser montanha, pois percebia ser ela mais poderosa que o vento. Uma vez montanha, sentiu instrumento batendo contra seu corpo, admitindo ser alguém mais forte que a montanha. E então percebeu que era um mineiro que fazia o trabalho igual ao dele, antes dos seus pedidos. E aí compreendeu que devia abdicar de valores passageiros e prazeres efêmeros, posto que era autor e ator no planeta. E assimilou o ensinamento grandioso: “Não procureis a mesa dos reis, as honrarias e glórias dos monarcas, pois a tua mesa é maior que a deles e a tua glória é maior que a deles”.

No livro do rabino Weitman, ele aponta os males provocados pela preguiça, como ampliar a agilidade, como as dificuldades são oportunidades disfarçadas, como gerar energia em meio a tristezas, e como a alegria é o remédio ideal para depressão. Em relação à alegria, o rabino dá uma boa vergastada naqueles que se imaginam continuamente sérios, travestidos de sizudos, quase sempre sepulcros caiados, fingidos e amacacados: “A alegria não deve ser perseguida apenas para nos afastar da amargura, mas por ser em si algo extremamente benéfico. Entre os chassidin (piedosos) em especial, a alegria é um elemento essencial de seu modus vivendi”.

Para anos eleitorais, como 2010, todo cuidado é pouco com os mentirosos que engabelam os abiscoitados do pedaço. Além dos que agem com más intenções, vendendo gato por lebre.

Para consolidar a ideia de ganância, o rabino, que reside em São Paulo, relata pesquisa que fez numa instituição de ensino superior perto da sua residência, frequentada por alunos de classe alta. Uma pergunta só foi feita: o que gostariam de ter para se sentirem felizes nos próximos seis meses. Nenhum questionário foi devolvido em branco. E todos só continham bens de consumo.

O rabino também pesquisou o outro lado da vida. Numa escola de comunidade, a mesma pergunta foi feita a um grupo de alunos concluintes do segundo grau grau, de famílias que sempre viviam em sufoco financeiro. Nove dos quarenta e cinco alunos responderam que desejariam ver um meio ambiente mais respeitado no mundo inteiro, sem poluição nem buracos negros.

Sobre a pesquisa acima, o rabino Weitman, em seu livro A Arte de Ser Mais Gente, repassa sábio ensinamento: “Quem cobiça poder e riqueza arrisca-se a perder de vista a moral, a ética, a sanidade, a saúde e as amizades na tentativa cega de atingir sua meta. O homem ganancioso é capaz de passar por cima do outro para obter o sucesso desejado, não sossegando enquanto não tiver tudo, sempre desejando ter mais”.

Neste 2010, inúmeros vigaristas desejarão entrar no Congresso Nacional e nas Assembleias Legislativas. Aos eleitores brasileiros, a missão de guilhotiná-los nas urnas. Juntamente com os que lá já estão a merecer a degola. Favor usar o Ficha Fora!!!!

(Publicada em 12.08.2010, Portal da Globo Nordeste, blog BATE & REBATE)
Fernando Antônio Gonçalves