PARA NUNCA ESQUECER
Em janeiro do próximo ano, 2011, deverão ser mais uma vez relembrados os passos decisórios de um dos procedimentos mais terríveis da História da Humanidade. Em 20 de janeiro de 1942 acontecia a Conferência de Wannsee, em Berlim, presidida por Reinhard Heydrich, chefe dos serviços de segurança do Terceiro Reich. Que em apenas 90 minutos aprovou a evacuação e o extermínio dos judeus das regiões conquistadas do Leste Europeu e da URSS.
A exposição feita por Heydrich para a SS, o Ministério da Relações Exteriores e autoridades outras regionais, constou da recapitulação das medidas de endurecimento antissemitas e o anúncio fatídico da eliminação, pela escassez de recursos, de onze milhões de judeus que na Europa ainda permaneciam, os quais deveriam ser deportados para o leste, para trabalharem até a morte ou “serem tratados apropriadamente”. Concluída a aprovação e assinatura da ata, foram servidas doses fartas de conhaque, após o que discutiram-se os métodos de extermínio que seriam utilizados. A conferência de Wannsee marca a adoção do assassinato em massa como “solução final para o problema judeu”.
Os fatos que antecedem a Conferência de Wannsee deverão se amplamente divulgados para uma população jovem que ainda se encontra mentalmente distanciada dos horrores provocados pelos totalitarismos dos variados naipes, sendo o nazista considerado um dos mais cruéis, senão o mais ignominioso da história terrestre. Um deles acontecido em 1543, quando o alemão Martinho Lutero emitiu conselho sobre como os judeus deveriam ser tratados: “suas sinagogas deveriam ser queimadas e tudo aquilo que não queimasse deveria ser coberto ou espalhado com o lixo, para que ninguém, nunca mais, pudesse ver uma brasa ou pedra qualquer … os judeus devendo ser colocados sob um único teto, ou em um estábulo, como ciganos.”
Com a ascensão de Adolf Hitler, um fanático carismático que escreveu na cadeia um livro chamado Mein Kampf, que trazia a doutrina da raça ariana, posto que as demais raças, segundo ele, eram fator de perturbação na sociedade, o chefe da SS, Himmler, solicitava aos alemães que adotassem as teorias genéticas nazistas, favorecendo a perpetuação de uma única raça, a ariana. Com isso, os judeus foram obrigados a usar uma ligadura identificatória, estampada com a estrela de Davi, nas ruas surgindo as primeiras frases depreciativas contra os hebreus: “interdito a judeus” ou “porcos judeus”. Tudo isso em pleno século XX !!
Em 1933/35 são editadas as primeiras leis raciais, sendo proibidas lojas e negócios judaicos, os médicos hebreus sendo excluídos do exercício da profissão, também retirados dos hebreus a cidadania alemã e o direito de ser funcionário público. Em 1938 aconteceu a “Kristallnacht” (Noite de Cristal), onde mais de 200 sinagogas são destruídas, 7.500 lojas são fechadas e 30.000 judeus do sexo masculino são enviados para os campos de concentração. Naquele ano, 1938, são instituídos os primeiros ghettos na Alemanha, onde mais de 600.000 judeus morreram de fome e doenças.
Em 1941 foi estabelecida a Solução Final, onde judeus – homens, mulheres e crianças – eram capturados e levados em comboio para campos de concentração, onde o mais conhecido foi o de Auschwitz. Eles eram levados para as câmaras de gás, sendo posteriormente cremados, alguns corpos escolhidos para macabras experiências médicas.
Segundo fontes históricas respeitáveis, “no dia 17 de julho de 1941, quatro semanas após a invasão da União Soviética, Hitler delegou ao Comandante das SS, Heinrich Himmler, a responsabilidade para cuidar dos assuntos de segurança na URSS ocupada. Hitler conferiu a Himmler autoridade para eliminar fisicamente quaisquer ameaças ao domínio alemão. uas semanas depois, em 31 de julho de 1941, o líder nazista Hermann Goering autorizou ao General das SS Reinhard Heydrich, o início das preparações necessárias para a implementação da “solução final para a questão judaica” … “O objetivo da ‘Solução Final’ era exclusivamente o de exterminar todos os judeus europeus. Assim, nos campos de extermínio, as SS e a polícia alemã assassinaram cerca de 2.700.000 judeus utilizando mecanismos de asfixia por gás venenoso ou por fuzilamento, e 3.300.000 outros israelitas morreram devido às atrocidades cometidas contra eles pelos alemães e seus colaboradores, por fome, maus-tratos, espancamento, frio, doenças, experiências “médicas”, e outras formas de crueldade inimagináveis. No total, seis milhões de judeus – homens, mulheres e crianças -foram mortos pelos nazistas durante o Holocausto, aproximadamente 2/3 dos judeus que viviam na Europa antes da Segunda Guerra Mundial”.
O texto de Martin Gilbert O Holocausto – História dos Judeus da Europa na Segunda Guerra Myundial, editora Hucitec, 2010, 1022 p., é leitura imperdível para todos aqueles que desejam ampliar sua cidadania planetária. Leitura para se guardar bem dentro da memória e do coração. Como também o testemunho de Eva Schloss, sobrevivente do campo de concentração nazista de Aushwitz, que esteve recentemente na pernambucaníssima e já consagrada Fliporto: “Eu nunca pensei em morrer. Eu nunca desisti. Eu tinha vivido dias muito felizes em Viena. Queria ainda namorar, casar, ter filhos, netos. Isso me manteve viva”. Uma lição de vida e resistência explicitada no seu livro A História de Eva, editora Record, já traduzido em oito idiomas.
PS1. Para meu amigo médico e escritor Gentil Porto, que me emprestou, um dia, o filme-documentário Arquitetura da Destruição, de Peter Cohen, 1992. Que muito ampliou minha enxergância democrática. Quem nunca viu o filme, é bom assisti-lo, se precavendo para tempos futuros, já caracteristicamente sombrios.
PS2. Boa estadia no Recife, amado rabino Nilton Bonder, meu irmão em Abraão, Isaac e Jacob!
(Publicada em 22/11/2010, no Portal da Revista ALGOMAIS, Recife – PE)
Fernando Antônio Gonçalves