PARA AMANHÃS LIBERTADORES


Uma advertência do teólogo Andrés Torres Queiruga deveria ser leitura obrigatória para as lideranças religiosas, leigas principalmente: “Uma já não curta experiência ensina que, com toda sua boa intenção, muitas concepções, sob imediata aparência piedosa, acabam sendo gravissimamente danosas, para nós e claramente lesivas para a honra de Deus. Uma piedade ‘atrasada’ ou um falso respeito pela letra da ‘tradição’ são demasiadas vezes o mais eficaz caldo de cultivo para o ateísmo”. Os futuros que emergem não serão fáceis para medíocres, nem para os desatentos que ainda não perceberam que a informação universalizou-se, devendo ser bem acessada, eficazmente organizada e holisticamente interpretada, sem cavilação alguma.
Num contexto “mundializado”, urge ampliar a consciência do ético, cultivando o senso crítico através de um pensar autônomo, capaz de compreender as incógnitas e os paradoxos de uma hoje de múltiplos ontens.
As lideranças leigas devem melhor administrar seus objetivos sob visão mobilizadora, percebendo que errar nunca foi crime, muito embora seja abominável permanecer no mesmo engano para sempre.
Liderança leiga é generosa com seus tropeços, corajosa nas suas convicções e princípios sempre inconclusos. Desconfia das imperiais certezas e jamais embarca na canoa dos que afirmam que se deve fazer apenas o que o coração manda. E nunca se olvida do que disse o Marquês de Maricá: “A mediocridade em tudo é uma garantia e penhor de segurança e tranquilidade, sendo a passividade sua filha predileta”.
Na construção das suas utopias, a liderança leiga evita cometer três falhas: a de desejar possuir uma visão que forneça um quadro perfeito do futuro; a pressuposição de que o hoje lhe presenteará com um mapa abrangente do amanhã; e a de que é dispensável garra incomum e férrea vontade para compreender os paradoxos dos tempos futuros.
Um trecho de 1935 parece destinado às lideranças leigas, quando a essência religiosa é, inúmeras vezes, subjugada a interesses pouco nobilitantes: “Nada de menos rígido, de menos sólido, de menos estável, do que o momento social em que vivemos. E daí o grande triunfo do oportunismo, o medo que os homens têm de tomar atitude, de optar por uma solução, de submeter-se a princípios, que o mundo de amanhã poderá deitar por terra.” Um profeta? Não, apenas Alceu Amoroso Lima, um intelectual cristão de muita credibilidade.
Em publicação não recente, Tipologia Comportamental do Chinfrinzé Brasileiro, os analistas Bill Kapp Barib e Reynald O’Liveira definiram um chinfrinzé como “um animal quase racional, extremamente similar fisicamente ao homo sapiens, que se comporta em áreas civilizadas com uma mente mixada, coexistindo nela hábitos aparentemente modernos e uma nulificada postura comportamental”. Daí, ser preocupante a alienação religiosa que anestesia incautos e desconectados, que valoriza os esmolismos, os dolorismos, os vitimismos, os fundamentalismos e os outros ismos que conquistam cada vez mais fanáticos, olvidada a advertência do Homão da Galiléia: ”Tomem cuidado com o fermento dos fariseus, que é a hipocrisia. Não há nada de escondido que não venha a ser revelado, e não há nada de oculto que não venha a ser conhecido”.
Algumas recomendações para as lideranças leigas não contaminadas pelo virus descivilizatório que amesquinha a fé: “O mais importante é bloquear as ações úteis do inimigo, permitindo que ele execute à vontade as ações inúteis”; “Sempre com o olhar muito atento, conhecer bem a espada do inimigo, nunca se deixando distrair com os movimentos insignificantes dele”; “A estratégia imatura é causa de dor”.
Alegra-me a sabedoria de Bertolt Brecht: “Diante dos acontecimentos de cada dia. / Numa época em que reina a confusão. / Em que corre sangue, / Em que se ordena a desordem, / Em que o arbitrário tem força de lei, / Em que a humanidade se desumaniza. / Não digam nunca: isso é natural!!”