O JOIO E O TRIGO
O arcebispo emérito Desmond Tutu, um dos mais notáveis anglicanos de todos os tempos, também Prêmio Nobel, não se cansa de encarecer o aprofundamento dos estudos do Novo Testamento e da Teologia, para melhor identificar as estupendas semelhanças existentes entre as políticas do Antigo Império Romano e as desenvolvidas pelas atuais potências mundiais.
Quantos cristãos desconhecem que, no século I d.C., existiram dois profetas chamados Jesus? Um deles, Jesus ben Ananias (ben significa filho de), perambulava pelas ruas, sem grupo, considerado insano pelas autoridades constituídas. O outro, Jesus ben José, também judeu, era líder de um grupo que pregava a renovação de Israel, uma forma de viver mais libertária, sendo por isso condenado à morte de cruz, forma humilhante do poder romano arrefecer os ânimos de possíveis seguidores. Daí a ironia da inscrição sobre a cruz, rei dos judeus, um modo cruel de humilhar ainda mais o povo de Jesus que estava sob dominação de Roma.
Quantos ainda não perceberam que a mensagem do Jesus bem José possui um conteúdo desindividualizante, essencialmente comunitário, a convencer os ouvintes de que comunidade unida jamais será vencida? Tal e qual hoje em dia, quando maquinações financeiras mundializantes buscam destruir identidades nacionais, também regionais, para impor um pensamento único, submisso e passivo, incapaz de enxergar além do mínimo permitido.
Podemos ser mais comprometido com a mensagem do Jesus ben José, profissão carpinteiro, possivelmente nascido em Nazaré, centro da Galiléia, à época pertencente à província romana da Síria, o hoje Jesus Cristo que tanto amamos? E como devemos nos comportar como obreiros de uma nova ordem mundial, de desníveis cada vez menos constrangedores? E como ser ovelhas do Senhor sem se deixar tosquiar por sabidos e enganadores, sejam leigos ou sagrados?
Sempre dizendo sim à primeira das indagações acima, devemos entender cada vez mais missão que nos foi pedida pelo Nazareno! E para isso, necessitamos analisar melhor nossa inserção no mundo, a partir de um primeiro questionamento: será que ainda estamos, em matéria de religião, falando (rezando) como criança, raciocinando como criança e pensando como criança, como percebeu o apóstolo Paulo numa das suas cartas (1Co 13,11)?
O segundo questionamento é resultado imediato do primeiro: como se encontra a nossa criticidade, nossa capacidade de discernir cada vez mais entre fatos acontecidos, vivenciados e narrados miticamente? Pois não foi o próprio Jesus que nos encareceu separar o joio do trigo, jogando fora o que não prestasse (Mt 13,24-30)? Sem tocar fogo em tudo de uma só vez, pois assim se perderia a parte boa construída?
Como ponto final, a lição que ELE nos deixou para a caminhada: a da não discriminação com quem quer que seja. O mal devendo ser combatido, o pecador acolhido como um dos nossos, posto que ninguém será melhor que ninguém na Casa do Pai.