NAPOLEONISMOS 2014


De repente, durante o último período carnavalesco, observando determinados políticos, de norte a sul do país, buscando aparecer mais que Momo, voltei as atenções para um livro que tinha adquirido numa livraria de Brasília, por ocasião de reunião do FNCEE – Forum Nacional dos Conselhos Estaduais de Educação com o CNE – Conselho Nacional de Educação sob temas vinculados ao futuro Plano Nacional de Educação, ainda nos tarturagais caminhos debatedores do Congresso Nacional, Casa possuidora de muito pouco emtusiasmo pelo assunto, dada sua natureza conscientizadora por excelência, adversária figadal da demagogia e do cretinismo eleitoreiro.

A leitura de O Homem que se achava Napoleão – Por um história política da loucura, editora Três Estrelas, SP, 2012, de Laure Murat, historiadora e pesquisadora do departamento de estudos franceses e francófonos da Universidade da Califórnia, busca responder uma reflexão feita por Élisabeth Roudinesco, autora do consagrado A Parte Obscura de Nós Mesmos, editado em 2010 pela Zahar Editora: “Todos os médicos da alma se perguntaram se os distúrbios políticos tinham um papel na eclosão do delírio e na aparição da loucura. Em ensaio muito bem documentado e apoiado em arquivos inéditos, Laura Murat revisita essa problemática de maneira resolutamente novas”.

A partir de documentação inédita extraída de quatro hospitais franceses – Bicêtre, Salpêtrière, Sainte-Anne e Charenton – Laure Murat busca relacionar as relações entre política e loucura, investigando ainda os primórdios da psiquiatria. E a autora indaga: “A história da loucura pode não levar em conta a loucura da história?”

Para quem não for ler o livro acima, dois fatos merecem ser aqui registrados. O primeiro deles prende-se ao retorno dos restos mortais de Napoleão a Paris, em 1840. Catorze pessoas são internadas no hospital de Bicêtre, à época, por imaginarem-se o próprio Bonaparte. E a “monomania orgulhosa”, denominação dada pela medicina daquela época, espalha-se por todos os asilos do país. E nem as duchas, nem as sangrias, tampouco os demais outros procedimentos de purgação, não mais trouxeram os adoecidos de volta à razão.

O segundo fato refere-se ao guilhotinamento de Luís XVI, onde fofocas, injurias e mentiras estapafúrdias proliferaram por todos os poros da sociedade parisiense. Tendo a execução acontecida a 21 de janeiro de 1793, o seu carrasco, Charles-Henri Sanson, em carta enviada ao jornal “Thermomètre du Jour”, datada de 20 de fevereiro de 1793, testemunha o que vivenciou, desmascarando a boataria espelhada pelos “sans-culottes”: Chegado ao pé da guilhotina, Luís XVI considerou um instante os instrumentos de seu suplício e perguntou a Sanson se os tambores cessariam de bater. Ele se aproximou para falar. Foi dito aos carrascos que fizessem seu dever. Enquanto lhe colocavam as cilhas, ele gritou : “Povo, eu morro inocente !”. Em seguida, virando-se para os carrascos, Luís XVI declara : “Senhores, sou inocente de tudo o que me inculpam. Espero que meu sangue possa cimentar a felicidade dos Franceses”. O cutelo caiu. Eram 10 horas e 22 minutos. Um dos assistentes de Sanson apresentou a cabeça de Luís XVI para o povo, enquanto elevava-se um grande grito de: “Viva a Nação ! Viva a República !” e que ressoava uma salva de artilharia que chegou até às orelhas da família real encarcerada.”

Posteriormente, o escritor francês Alexandre Dumas, autor de quatro romances históricos sobre esse período revolucionário da história francesa, entrevistou o filho do carrasco, em 1830. Eis um extrato da entrevista:
“- Então, dissestes que desejáveis alguma coisa, senhor Dumas ?
– Sabeis o quanto os autores dramáticos têm necessidade de informações precisas, senhor Sanson. Acontece que chegou o momento de eu colocar Luís XVI em cena. O que existe de verdade na luta que se travou entre ele e os ajudantes de vosso pai, aos pés do cadafalso ?
– Oh ! Eu posso lhe dizer, senhor. Eu estava lá.
– Eu sei e é por isso que eu me dirijo a vós.
– Então, vamos lá : o rei foi conduzido até ao cadafalso em sua própria carruagem e tinha as mãos livres. Aos pés do cadafalso, pensou-se que seria necessário amarrar-lhe as mãos, menos porque se temia que ele se defendesse que porque, em um movimento involuntário, ele pudesse entravar seu suplício ou torná-lo mais doloroso. Um dos ajudantes esperava então com uma corda, enquanto outro lhe dizia : “É necessário vos prender as mãos. A esta proposta imprevista, à visão inesperada da corda, Luís XVI fez um movimento de repulsa involuntário. “Jamais ! gritou ele, jamais !” E ele empurrou o homem que segurava a corda. Os outros três ajudantes, acreditando ser uma luta, precipitaram-se vivamente. Daí o momento de confusão interpretado a sua maneira pelos historiadores. Então, meu pai aproximou-se e, num tom dos mais respeitosos : “Com um lenço, Sire” disse. A essa palavra, “Sire”, que ele não havia escutado há muito tempo, Luís XVI estremeceu ; e, como no mesmo instante seu confessor lhe dirigia algumas palavras da carruagem : “Pois bem, seja; ainda isso, meu Deus !” disse ele. E estendeu as mãos.”

O livro da pesquisadora Laure Murat pode servir de suporte técnico para a Justiça Eleitoral monitorar as diabruras demagógicas e doidivanos dos candidatos que postulam cargos executivos e legislativos em 2014, ano de futebol e política, onde certamente surgirão elogios e pedradas dos mais tresloucados tamanhos, a clarividêndia dos fatos ficando para amanhãs mais sensatamente analisados.
(Publicada em 25.02.2013, no Jornal da Besta Fubana, Recife, Pernambuco)
Fernando Antônio Gonçalves