MARINA E AS OLIMPÍADAS


Para muitos, inclusive eu, causou baita surpresa a presença da ex-senadora Marina Silva à frente do desfile inicial dos Jogos Olímpicos 2012, em Londres. Até o ministro dos Esportes, Aldo Rebello, revelou gigantesca dor de cotovelo, tentando menosprezar o significado daquela presença tão honrosa para todos os brasileiros.

Entretanto, como toda verdade emerge no final dos tempos, um livro recentemente editado no país deve ter inspirado os organizadores do desfile inicial. Uma pesquisa de fôlego do jornalista Alceu Luís Castilho, detentor de várias consagrações – Prêmio Fiat Allis de Jornalismo Econômico, Prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos, Prêmio de Direitos Humanos de Jornalismo e o Prêmio Andifes -, intitulado Partido da Terra – Como os Políticos Conquistam o Território Brasileiro, editora Contexto, 2012, revela como os proprietários de terra no Brasil ocupam o Legislativo, invadem o Executivo e cultivam o Judiciário.

Utilizando as declarações de bens entregues pelos candidatos ao Tribunal Superior Eleitoral – quase 13 mil, anos-base 2008 e 2010 -, Castilho subdividiu sua inédita análise em cinco partes. A primeira delas, O Território, traz uma radiografia da posse da terra por políticos, ressaltando o denominado pelo autor de “arco do desmatamento”, também nítido reflexo da matança de camponeses e do trabalho escravo, numa reprodução do velho oeste americano em pleno século XXI, as regiões mais vitimadas sendo a Amazônia e o Cerrado.

Na segunda parte, O Dinheiro, Castilho esmiúça com ampla acuidade as relações entre políticos e terra, segundo ele “nem sempre uma história republicana”. E questiona sobre o que existe de comum entre Renan Calheiros, Newton Cardoso, Moisés Lupion, Jáder Barbalho e José Sarney, entre vários outros, comprovando que o atual sistema partidário brasileiro é ocupado pelos donos de terras.

Detalhes nunca dantes revelados estão na terceira parte do livro, A Política, onde o autor aponta o PMDB, o PSDB e o PR como agremiações onde os políticos possuem mais hectares, com o surgimento recente de uma “esquerda latifundiária”, setor que também ilude, anestesia e procrastina.

Na penúltima parte, O Ambiente, Castilho analisa a devastação de nossos biomas pela expansão pecuária. Nessa parte estão listadas 69 madeireiras e serrarias de propriedade de 60 políticos, algumas delas integrando investigações do Ibama e da Polícia Federal sobre crimes ambientais.

Na parte última da sua pesquias, Castilho retrata o que ele classifica como “o último degrau na escala da barbárie”, um relato sobre camponeses ameçados, expulsos e mortos, onde despontam alguns macabros episódios: políticos presos por extração ilegal de madeira, prefeito detido por roubar carga de caminhões e um deputado arrozeiro que já foi preso sob acusação de ter atirado em indígenas em Roraima.

Como nem tudo é podridão, Castilho ressalta que há políticos proprietários com ficha limpa. E que também existem até reis, um conhecido como “rei da soja” e outro apelidado de “rei do feijão”, em Minas Gerais, com seu irmão acusados de mandar assassinar fiscais do Ministério do Trabalho.

No final do seu livro, ironia do destino, o autor revela que aquele ministro que tentou zombar da presença da ex-ministra Marina Silva no desfile de abertura dos Jogos Olímpicos de 2012, em Londres, foi o mesmo quem mandou prender centenas de pessoas que estavam na Esplanada do Ministério, em junho de 2006, quando parte ínfima dos sem-terra irresponsavelmente depredou bens públicos, quebrando janelas, portas e mesas do interior da Câmara dos Deputados. Na ocasião, por ordem daquele deputado, hoje ministro dos Esportes, presos foram até ambulantes e integrantes que chegaram em ônibus depois do ocorrido. O critério era apenas estar no gramado. Cenas testemunhadas pelo próprio Alceu Luís Castilho, autor do livro, uma leitura eminentemente cidadanizadora.

Para os desabiscoitados, ainda uma minoria abraâmica que pode dar novos rumos à existencialidade humana, recomendo o livro do Alceu Luís Castiljo, especialista em assuntar dados quantitativos e históricos que estão afetando a vida brasileira, que atualmente se encontra às vésperas das eleições municipais de outubro que vem.

E para quem desdenhou a presença da Marina Silva no desfile inicial das Olimpíadas de Londres, o desabafo de um docente nunca bajulador de uma Universidade Federal: “A sua embriaguez é a pior que existe. Você se embriaga com a sua mediocridade. A mediocridade causa náuseas. Se eu vomitar é porque caras como a sua, de meio-inteligente, de repetidor de lugares-comuns, de medalhão cheio de empáfia, revolvem minhas entranhas e eu tenho que segurar meus bofes para eles não se despejarem em cima de você”.

(Publicada em 06.08.2012 no Jornal da Besta Fubana, Recife, Pernambuco
Fernando Antônio Gonçalves