LIVROS, E-BOOKS E LIVRE ACESSO
Parabenizo o Raimundo Carrero pela conquista prá lá de arretada do Prêmio São Paulo de Literatura 2010, categoria Melhor Livro do Ano, concorrendo com os monstros sagrados João Ubaldo Ribeiro e Chico Buarque. Uma vitória também de um Pernambuco pensamento-ação por excelência. E aproveito o embalo das congratulações para encarecer aos senhores pais e educadores atenção especial para uma necessidade imperiosa: a de estimular mais a leitura de livros, para clarear mentes e corações, empreendimentos e futuros. Sem qualquer receio dos desafios tecnológicos digitais que apenas chegaram para facilitar as coisas, jamais substituindo as ações e reflexões do ser humano neste velocíssimo terceiro milênio.
Recomendo com entusiasmo, além da leitura de Minha Alma é Irmã de Deus, o livro premiado do Raimundo Carrero, os seus comentários sobre literatura, nas tardes de segunda a sexta na rádio JC/CBN, sob o comando do Aldo Vilela, quando ele dá orientações oportuníssimas para todos aqueles que buscam iniciar-se nas “escrituras”, seja em que gênero desejarem.
Para os menos apetrechados mentalmente, que imaginam que a tecnologia digital e a internet vão destruir os livros, encareço a leitura de dois textos intensamente desabestalhantes, ambos recentemente entregues aos leitores brasileiros. O primeiro chama-se Não Contem com o Fim do Livro, Record, do semiólogo e escritor italiano Umberto Eco e do roteirista de cinema e escritor francês Jean-Claude Carrière. Eles percorrem, com inteligência, erudição e muito bom humor, mais de cinco mil anos de existência dos impressos, defendendo a continuidade deles, apesar dos e-readers e das invenções mais modernas. A mediação foi efetivada pelo jornalista e ensaísa francês Jean-Philippe de Tonnac.
A segunda indicação que faço, peço licença aos especialistas pela afoiteza deste “apreciólogo”, aqui recordando neologismo criado pelo Saturnino Gonçalves dos Santos, um já eternizado motorista da para mim sempre querida Fundação Joaquim Nabuco, antigamente Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais. Trata-se de A Questão dos Livros – Passado, Presente e Futuro, de Robert Darnton, professor universitário e pesquisador, atualmente diretor da Biblioteca da Universidade de Harvard, edição Companhia das Letras. Que não faz por menos logo na Introdução: “Este é um livro sobre livros, uma apologia descarada em favor da palavra impressa e seu passado, presente e futuro. É também uma discussão sobre o lugar dos livros no ambiente digital que se tornou uma realidade essencial da vida para milhões de seres humanos”.
No texto, Darnton não deplora os avanços tecnológicos, muito pelo contrário. Busca explorar as potencialidades do processo iniciado por Johannes Gutemberg há mais de quinhentos anos, quando as ideias e informações ganharam o mundo, favorecendo a inserção de milhões numa leitura até então apenas usufruída dos copistas especializados.
A importância do livro foi recentemente ratificada pelo presidente Lula através de lei que obriga a existência de uma biblioteca em cada unidade escolar, inclusive nas que ministram o ensino fundamental. Caberá a sociedade exigir dos seus governantes o cumprimento da determinação presidencial, favorecendo uma educabilidade até o momento quase unicamente presente naqueles núcleos familiares que possuem estante, leem jornal, assistem televisão, integrados à vida comunicacional. A 20ª. Convenção Nacional de Livrarias, que acontecerá de 9 a 11 de agosto próximo no Hotel Holiday Inn, São Paulo, patrocinada pelo SENAC e pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, se efetivará sob o lema A Livraria e sua importância em mundo em transformação. Que servirá também de alerta oportuno para a sociedade brasileira.
Brevemente, acontecerá entre nós a Festa Literária Internacional de Pernambuco, a FLIPORTO, promovendo intercâmbio literário, cultural, artístico e humanístico, com especial destaque para a difusão do livro, a ampliação do mercado editorial e o incentivo ao hábito da leitura. Este ano o tema da FLIPORTO será Literatura e Presença Judaica no Mundo Íbero-americano, sendo Clarice Lispector a principal homenageada. Um sucesso que se repete a cada ano.
De uma coisa podemos estar certos: a informação está explodindo nos quatro cantos do planeta, a uma velocidade espantosa. A exigir orientações fundamentadas, muito diferenciadas das feitas por volta de 4000 a.C., quando dos primeiros instantes da grafia. Para se ter uma simples noção: da escrita ao códice foram 4300 anos; do códice aos tipos móveis, 1150 anos; dos tipos móveis à internet, 524 anos; da internet aos buscadores, 17 anos; dos buscadores ao algoritmo de relevância do Google, 7 anos.
Qual será a próxima etapa? Digitalizar para democratizar, eis o desafio macro para todos os rincões do planeta. Sem monopólios de nenhum tipo. Para que todos, sabendo fazer a hora, não fiquem esperando Godot.
(Publicada em 05.08.2010, Portal da Globo Nordeste, blog BATE & REBATE)
Fernando Antônio Gonçalves