LIÇÕES E INTUIÇÕES
Deveria ser leitura compulsória, nos cursos de Administração & Gerência, um dos últimos lançamentos da editora Campus: uma coletânea que busca dar um basta nos idiotismos verborrágicos que atualmente pululam nos setores brasileiros. Outro dia, numa formatura de Administração, o representante da homenageada Empresa do Ano, iniciou assim o seu “pronunciamento”: Ilmo Sr Diretor, Ilma Sra. Coordenadora. E outros ilmos não mais disse porque percebeu os concluintes quase descontrolando o riso, caindo-lhe a ficha de que o “ilmo” e a “ilma” significavam ilustríssimo e ilustríssima. O resto do discurso foi para o brejo, a empresa até hoje sendo motivo de gozação.
Os 100 Maiores Discursos da História, de Simon Maier e Jeremy Kourdi, Campus, 2011, defenestram a ideia corrente, nas apresentações várias, da suficiência de Power Point e anotações pífias nos pronunciamentos que buscam convencer e conquistar. E a orelha primeira do livro já provoca o leitor: “não pergunte o que este livro pode fazer por você. Pergunte o que você pode fazer com a ajuda dos discursos da História”.
No livro encontramos um balizamento: “é dever das nações livres promover a oratória”, posto que aos tiranos interessa tão somente mutilar os tipos de eloquência. Nos Estados Unidos, os políticos atuais começam a dar mais valor na elaboração dos seus pronunciamentos, dignificando ações parlamentares.
Por ocasião da recente discussão sobre o salário mínimo brasileiro, impressionou a incompetência analítica e oratória da maioria que ocupou a tribuna. Os ingredientes principais de um discurso – a capacidade de definir os tempos, de inspirar, de causar impacto, de provocar emoções e de motivar – eram desconhecidos dos parlamentares, alguns dos quais demonstravam integral incapacidade comunicacional. Frustando milhares de telespectadores que esperavam debates mais consistentes e menos idiotizantes. Que favorecessem a boa oratória (escrever e proferir um discurso em público) e a boa retórica (arte de usar a linguagem como meio de persuasão).
Estaremos vivenciando, nos futuros próximos, dias de turbulência bastante significativos, quando assistiremos mediocrizantes atuações parlamentares e empresariais pelos meios de comunicação. Recheadas de insuficiências cognitivas e comportamentais, o fenômeno possui características mais nítidas nos detentores de intensas imaturidades. E a mais densa delas é a imaturidade emocional-cognitiva, matriz de quase todas as outras, posto que é uma das causas primeiras do nosso atual atraso civilizatório.
Radiografar bem a confusão é o primeiro passo para fazer algo para corrigi-la. Precisamos de novos modos de pensar nossos problemas e nosso futuro. A liberdade não deve significar licenciosidade, violência ou guerra. A teoria da perfeição não existe e os paradoxos são inevitáveis, endêmicos e perpétuos. Quanto mais turbulenta a época, mais complexos são o mundo e seus paradoxos, a exigir criatividade e determinação de mudar, através de explanações bem elaboradas.
O livro traz pronunciamentos memoráveis, de ideologias as mais diversas. Com uma biografia do autor, as lições transmitidas, o estilo utilizado e o legado deixado para a posteridade. Dois dos pronunciamentos mereceram minha atenção. Um de Bill Gates, ao paraninfar uma turma de Harvard, em 2007: “Espero que vocês não se julguem somente por suas realizações profissionais, mas também pela maneira como reagiram às maiores injustiças do mundo.” O outro é de Nelson Mandela: “Acalento o ideal de uma sociedade democrática e livre, em que todas as pessoas possam viver juntas, em harmonia e com oportunidades iguais. É o ideal pelo qual eu vivo e que espero alcançar. Mas, se necessário for, é o ideal pelo qual estou preparado para morrer”.
Pronunciamentos que fizeram história, independente de ideologias. Que souberam fazer a hora, não esperando acontecer.
(Publicado no Jornal do Commercio, Recife, Pernambuco, 06.04.2011)
Fernando Antônio Gonçalves