LIÇÕES DE EDUCADOR


Se me perguntassem sobre algum livro que me proporcionou ensinamentos em 2007, diria sem pestanejar: Qual é a Tua Obra? – Inquietações Propositivas sobre Gestão, Liderança e Ética, Vozes 2007, de Mário Sérgio Cortella. Que foi secretário-adjunto de Educação do município de São Paulo, gestão Paulo Freire, posteriormente assumindo as funções titulares.
O livro do Cortella é do tipo que se lê, rabisca-se, torna-se a ler, sublinha-se mais, ficando com uma vontade danada de quero-mais ao término de suas cento e quarenta páginas. É leitura para um fim de semana, onde uma busca por enxergar torna-se necessária para quem necessita ampliar sua fascinação pelos amanhãs profissionais, espirituais e convivenciais que se instalam velozmente em nosso derredor. Das suas páginas tira-se inúmeros proveitos, a partir das cinco competências essenciais da arte de liderar: abrir a mente, elevar a equipe, recrear o espírito, inovar a obra e empreender futuros.
Não se trata de auto-ajuda, mas Alta-Ajuda não-religiosa para quem precisa ser autor e ator da História, hóspede e hospedeiro. Um excelente presente para os que não perceberam a urgência de se ser “uma metamorfose ambulante”, como proclamava o menestrel Raul Seixas. Um texto tapinha-sutil nos que se encontram safisfeitos com eles mesmos, julgando-se detentor do melhor modo de assim persistir.
Transmito a Fábula da Coletividade, do próprio Mário Sérgio Cortella: “Uma senhora vivia numa pequena chácara e tinha alguns animais: uma vaca, um porco, uma galinha. E lá também guardava milho na tulha. E havia um rato que morava lá. Esse rato vivia sossegado até o dia em que a mulher resolveu colocar uma ratoeira dentro da tulha. O rato saiu desesperado. Correu até a vaca:
– Vaca, nós estamos com um problema sério; a mulher colocou uma ratoeira lá.
A vaca deu risada:
– Como nós? Você já viu ratoeira pegar vaca? Eu não tenho nada com isso. Isso é problema seu.
E saiu ruminando. O rato correu até o porco:
– Porco, nos estamos com uma encrenca danada, a mulher colocou uma ratoeira lá.
– O que é isso? Eu estou aqui bem longe, isso não vai me pegar, não. Ratoeira não pega porco, olha o meu tamanho e olha o seu. O problema é seu.
O rato, atônito, correu para a galinha:
– Galinha, nós estamos com um problema muito sério.
– Pelo amor de Deus, eu já estou de problemas por aqui e você ainda vem me torturar. O máximo que eu posso fazer é rezar por você.
– Mas tem uma ratoeira lá.
– Mas isso não é comigo, é contigo.
O rato foi embora desanimado. À noite todos dormiam e, de repente, splaft. A ratoeira desarmou. Todos correram para olhar, inclusive o rato; era uma cascavel que tinha sido pega na ratoeira. A mulher levantou-se, foi tirar a cascavel da ratoeira e tomou uma picada. Foi levada ao hospital à morte. Ficou vinte dias de recuperação e, na volta, precisava restabelecer a saúde na chácara. Qual a melhor comida para reforçar a saúde? Canja. Lá se foi a galinha. Depois de um mês, resolveu dar um almoço com feijão tropeiro para os parentes que a tinham ajudado e lá se foi o porco. A questão é que o tratamento tinha ficado caro e aí tiveram de vender a vaca para um açogue…
Cuidado: a ratoeira que aparece alí num canto pode não te pegar num primeiro momento, mas os efeitos dela são fortíssimos. A nossa arrogância é tamanha que nos consideramos proprietários do planeta, assim como alguns se consideram proprietários daquela diretoria, daquela área. Nós não somos proprietários, somos usuários compartilhantes.”
No meu cantinho nordestino, assistindo a companheira amada em recuperação, lembrei-me de uma frase que me foi transmitida em Santa Maria, RS, por uma anglicana da Diocese Sul-Oriental, comandada pelo dinâmico bispo Dom Jubal Neves: “Somos todos anjos com uma asa só; e só podemos voar quando abraçados uns aos outros”. Seu autor, Luciano Crescenzo, depois dos cinqüenta anos, deixou a vida empresarial e tornou-se ator de teatro e autor de livros de Filosofia. Para melhor ensinar a viver.