LEITURAS MEMORÁVEIS


Uma amiga muito querida, a Káthya, tem no marido e no neto dois admiradores ferrenhos de histórias de guerra, principalmente da Segunda Guerra Mundial. E certamente dois livros, um editado no Brasil em 2015 e o outro divulgado ano passao, provocarão neles horas de leitura prazerosa, favorecendo a ampliação do conhecimento sobre as atividades desenvolvidas pelas principais lideranças envolvidas no conflito que derrotou o regime assassino de Adolf Hitler, dando início a uma nova etapa de redefinição dos rumos do mundo, numa corrida gigantesca iniciada pela Guerra Fria.

O primeiro livro intitula-se Seis Meses em 1945 – Roosevelt, Stálin, Churchill e Truman: da Segunda Guerra à Guerra Fria, Michael Dobbs, São Paulo, Companhia das Letras, 2015, 494 p. Um relato que ratificaria uma previsão feita por Alexis de Tocqueville, mais de um século antes: “Seus pontos de partida são diferentes, assim como seus percursos não são os mesmos; contudo, cada um deles parece destinado pela vontade dos céus a conduzir o destino de metade do globo.”

O livro do Dobbs se desenrola na seguinte cronologia, tudo acontecendo de fevereiro a agosto de 1945: 4/02 – Início da Conferência de Yalta, que vai até 11 de fevereiro; 13 a 15/2 – Bombardeio de Dresden; 27/2 – Vyshinsky organiza golpe comunista na Romênia; 7/3 – Exército americano cruza o Reno em Remagen; 12/4 – Roosevelt morre, sendo sucedido por Truman; 23/4 – Truman adverte Molotov para cumprir promessas sobre a Polônia; 25/4 – Conferência de fundaão das Nações Unidas, americanos e russos encontram-se no Elba; 10/4 – Suicídio de Hitler; 2/05 – Berlim cai diante do Exército Vermelho; 8/5 – Rendição da Alemanha; 26/5 – Emissários de Truman reúnem-se com Churchill e Stálin; 1º/6 – Truman decide usar a bomba atômica contra o Japão; 18/6 – Líderes da oposição polonesa vão a julgamento em Moscou; 24/6 – Parada da vitória em Moscou; 4/7 – Tropas americanas ocupam Berlim Ocidental; 16/7 – Abertura da Conferência de Postdam, que se estende até 2/8; primeiro teste atômico; 26/6 – Renúncia de Churchill; 6/8 – Lançamento da bomba atômica em Hiroshima.

Depois da bomba atômica lançada contra Hiroshima, os primeiros sinais da Guerra Fria surgiram, cujo término aconteceu com a queda do Muro de Berlim, em 9 de novembro de 1989. As versões existentes sobre a Guerra Fria apontam sempre para a ação de um líder responsável, muito embora seus primeiros sinais tenham surgido nos seis meses entre fevereiro e agosto de 1945. Aguarda-se uma nova etapa com o alucinado Donald Trump.

O segundo livro foi editado no Brasil em outubro do ano passado. Relata o período histórico que teve inicio em 1914 e que se estende até 1949, considerado um tempo sem precedente na história da humanidade. Envolvendo pesquisa original e prosa muito envolvente, o livro se intitula De volta do inferno: Europa, 1914-1949, Companhia das Letras, 2016, 574 p., sendo seu autor Ian Kershaw, também responsável pela monumental biografia de Adolf Hitler, editado pela mesma editora, em 2010. No prefácio, Kershaw assim define o seu último trabalho: “Este é o primeiro de dois volumes sobre a história da Europa, de 1914 aos nossos dias. De certa forma, é a obra mais difícil que já escrevi. Cada um de meus livros foi, em certo sentido, uma tentativa de chegar a uma melhor compreensão de um problema do passado. … Pensei em encerrar este primeiro volume em 1945, com o fim da Segunda Guerra Mundial. Todavia, apesar de as hostilidades formais na Europa terem acabado em maio daquele ano (prosseguindo até agosto contra o Japão), o rumo funesto dos anos 1945-9 foi determinado de forma tão clara pela guerra e pelas reações a ela que considerei justificado me estender para além do momento em que a paz voltou oficialmente ao continente. … Este volume trata apenas da primeira metade de um século extraordinário e dramático. Uma era em que a Europa travou duas guerras mundiais, ameaçou os alicerces da própria civilização e parecia temerariamente se autodestruir.”

O autor retrata seu texto em quatro grandes eixos: 1. A ascensão do nacionalismo étnico, que favoreceu o fim dos impérios Austro-Húngaro, Otomano e russo; 2. As demanda por revisão das fronteiras territoriais entre França e Alemanha, no Leste Europeu, na Europa Central e em todos os Balcãs; 3. O conflito de classes, à medida que os trabalhadores e o incipiente movimento socialista se insurgiam contra os patrões e a aristocracia, sobretudo a partir da Revolução Bolchevique de 1917; 4. A crise do capitalismo, que atingiu a Europa em cheio no início dos anos 1930 e ajudou a preparar o terreno para o nazismo.

O britânico Ian Kershaw, um nascido em 1943, hoje professor aposentado da Universidade de Sheffield, traça um panorâmico retrato desse período histórico com humanidade, estilo e originalidade, aqui e ali acrescidos de uma pitada de bom humor inglês.

Dois textos que muito encantarão os que buscam inteirar-se melhor de um passado histórico que ainda hoje respinga fortemente no desenvolvimento dos quatro recantos do planeta.

(Publicado em 06.02.2017 no site do Jornal da Besta Fubana e no site www.fernandogoncalves.pro.br)
Fernando Antônio Gonçalves