INTELIGENTES IDIOTAS


Na campanha eleitoral recentemente encerrada, o horário eleitoral gratuito mostrou uma série de personagens, organicamente folclóricos uns e matreiramente outro tantos, que pode ser classificada como dotada de um tipo de emocionalidade situado fora dos limites considerados compatíveis com a arte de viver em sociedade. Em todos os recantos brasileiros, candidatos se apresentaram com características histriônicas e/ou histéricas, tiriricais ou suplicyanas, buscando encantar (iludir) os mais próximos dos seus níveis mentais.

Passadas as apurações e as análises sobre os resultados se multiplicarão, cada um que buscasse as explicações que mais se ajustavam ao caráter decisório de nossa gente. Entretanto, quase nada será pesquisado sobre o atual estágio da inteligência emocional do eleitorado brasileiro, ainda dotado de ralas doses de criticidade política, sempre se isentando de culpa diante de alguns dos estapafurdiamente eleitos.

Após um dos debates televisivos, muito bem apelidado de debate-boca por um comentarista, procurei reler um livro já rabiscado há alguns anos, para verificar a atualidade de algumas das suas análises. O livro se chama Inteligência emocional: a teoria revolucionária que define o que é ser inteligente, Daniel Goleman, Objetiva, 2007. O autor, psicólogo graduado pela Universidade de Harvard, escreveu durante 12 anos para o New York Times, tendo sido indicado, por duas vezes, para ganhador do prêmio Pulitzer, hoje tornado cofundador de um grupo de colaboradores que tem como missão ajudar escolas a implementar aulas de inteligência emocional. Além de continuar pesquisando, com outros especialistas sobre as funções da inteligência emocional nos ambientes de trabalho.

O autor mostra, em seu livro, “como a incapacidade de lidar com as próprias emoções pode minar a experiência escolar, acabar com carreiras promissoras e destruir vidas”. Composto de cinco partes – O cérebro emocional, A natureza na inteligência emocional, Inteligência emocional aplicada, Momentos oportunos, e Alfabetização Emocional – o volume ainda agrega seis apêndices: O que é Emoção?, Características da Mente Emocional, O Circuito Neural do Medo, Ingredientes Ativos dos Programas de Prevenção, O Currículo da Ciência do Eu, e Aprendizado Social e Emocional.

Emoção é uma rubrica cujo significado preciso vem sendo discutido há mais de um século, sendo definida pelo Oxford English Dictionary como “qualquer agitação ou perturbação da mente, sentimento, paixão; qualquer estado mental veemente ou excitado”.

A Parte Dois do livro – A Natureza da Inteligência Emocional – para mim é a mais necessária para uma ampla discussão escolar, principalmente o Quando o Inteligente é Idiota. Excelente para quem deseja votar mais conscientemente numa eleição e para pais e mães que imaginam ser o(a) filho(a) a fina flor da magnólia. E uma pergunta provoca leitores dos mais diferenciados rincões: Existe vida inteligente nas emoções? Reproduzindo um colega de pesquisa, Peter Salovey, Goleman explicita os cinco domínios de uma inteligência emocional expandida: conhecer as próprias emoções, lidar com emoções, motivar-se, reconhecer emoções nos outros e lidar com relacionamentos. E ele menciona Jack Block, um psicólogo da Universidade da Califórnia, Berkeley, que fez uma comparação dos dois tipos teóricos puros: pessoas de alto QI versus pessoas de altas aptidões emocionais. E detalha: “O tipo de alto QI puro, onde não é considerada a inteligência emocional, é quase uma caricatura do intelectual, capaz de domínio da mente mas inepto no mundo pessoal, os perfis diferenciando ligeiramente em homens e mulheres. O homem de alto QI é tipificado por uma ampla gama de interesses e capacidades. É ambicioso e produtivo, previsível e obstinado e desprovido de preocupações sobre si mesmo. É também inclinado a ser crítico e condescendente, fastidioso e inibido, pouco à vontade do ponto de vista sexual e sensual, inexpressivo e desligado, e emocionalmente frio”.

Por outro lado, reproduz Goleman, “os homens com um alto grau de inteligência emocional são socialmente equilibrados, comunicativos e animados, não inclinados a receios ou a ruminar preocupações. Têm uma notável capacidade de engajamento com pessoas ou causas, de assumir responsabilidade e de ter uma visão ética; são solidários e atenciosos em seus relacionamentos. Têm uma vida emocional rica, mas correta; sentem-se à vontade consigo mesmos, com os outros e no universo social em que vivem”. E Goleman conclui: “Das duas, é a inteligência emocional que contribui com um número muito maior das qualidades que nos tornam mais plenamente humanos”.

Atualmente, o conceito QE constitui programas de “aprendizado social e emocional” em milhares de escolas do mundo, sendo requisito curricular em vários países. A disseminação da leitura de Goleman nos ambientes escolares brasileiros gradativamente provocaria a substituição da alienação por uma nova consciência planetária, favorecendo a emersão de uma cidadã humanidade, composta de outros valores simbólicos, fazendo resplandecer uma “humanidade comum e não mais dos dominadores”, usando a definição da economista Maria da Conceição Tavares.

No prefácio à edição brasileira, Goleman sugere a inclusão de ensinamentos para uma aptidão pessoal fundamental: a alfabetização funcional. Praticando o desafio de Aristóteles: “Qualquer um pode zangar-se – isso é fácil. Mas zangar-se com a pessoa certa, na medida certa, na hora certa, pelo motivo certo e da maneira certa – não é fácil”. E com os atuais atuais níveis salariais dos professores….

(Publicado em 02.02.2015, no site do Jornal da Besta Fubana – www.luizberto.com)
Fernando Antônio Gonçalves