HUMOR JUDAICO
Um dos meus passatempos preferidos é jogar conversa fora com pessoas de inteligência acima da minha. Gosto que me enrosco de conversar com gente que entende o lado lúdico da vida, afastada quilômetros das “cientificidades” dos que se imaginam pra lá de arretados nos assuntos densamente sisudos. E o casal Gorenstein, Rosanna e Saulo, padrinhos de casamento, além de amigos fraternos e também descendentes de Abraão, Isaac e Jacó, nos tem proporcionado momentos inesquecíveis, a cada trinta dias, quando um restaurante recifense é escolhido para um almoço nada sério, onde corre sem amarras um papo não-fuxicoso, pois aos dois casais não interessa o que com os outros acontece, seja chifre, falência ou burrice gramatical, grossura ou imaturidade, fingimento social ou vontade de aparecer nas páginas noticiosas.
No último almoço, às vésperas da partida do casal para os pampas, onde iria comemorar os oitenta anos da sogra amadíssima do Saulo, o assunto principal foi o humor judaico. E a fantástica Enciclopédia do Humor Judaico, de Henry Spalding, Editora Sêfer, tornou-se fonte de consultas. Uma excelente encadernação que contém “estórias” dos tempos bíblicos à era moderna, todas elas reveladoras de muitos neurônios, capazes de fazer rebolar de rir os mais impolutos, que acreditam naquele ditado idiótico que perambulava há algumas décadas entre nós: “muito riso é sinal de pouco sizo”. Diagnóstico amplamente desmoralizado pelos tempos de agora, quando a ciência comprova que as vitaminas A e H são as que mais fortalecem criativamente o ser humano do século 21: o Amor e o Humor.
Antes da sobremesa foram escolhidas algumas “estórias”, repassadas abaixo para aqueles que buscam um viver mais compatível com uma sadia convivialidade entre gregos e troianos. Ei-las:
1. Velhinho se aproximou timidamente do patrão e perguntou: – Senhor Shleper, posso folgar amanhã? É meu aniversário de bodas de ouro. – Por Deus, rosnou Shleper, vou ter de suportar esta chutspá (cara de pau) a cada cinquenta anos?
2. Sra. Klein: – Você consegue adivinhar quando o seu marido está mentindo ou não, só de olhar para a cara dele? Sra. Gross: – Isto é fácil, Sra. Klein. Se os lábios dele estiverem se mexendo, ele está mentindo.
3. Rabi Goldman ficou observando sua nova classe de Torá com um olhar arguto. Como todo semestre fazia questão de se familiarizar com os novos alunos, foi logo perguntando: – Na minha primeira aula deste período, falarei de mentirosos. Agora peço àqueles que leram o capítulo vinte e cinco do nosso livro-texto que levantem as mãos. Todos, exceto dois, levantaram as mãos. – Muito bem!, disse o Rabi. Posso ver que meu tema de abertura foi bem compreendido. Não existe o capítulo vinte e cinco em nosso livro-texto!
4. – Por que um homem com uma aparência tão boa como a sua ainda não se casou? A resposta foi de primeira: – Porque toda vez que encontro uma moça que cozinha como a mamãe, ela se parece com o papai.
5. Tia explicando porque nunca tinha se casado: – Tenho um cão que rosna, uma lareira que solta fumaça, um papagaio que amaldiçoa e um gato que passa as noites fora de casa. Para que preciso de marido?
6. Judeu conversando numa roda: – O que mais me agradaria é que Hitler virasse um lustre com velas. E a explicação veio logo em seguida: – Deste modo, eu o veria pendurado por um fio durante o dia, queimando à noite e sendo extinto de manhã.
A saideira foi repleta de muitos abraços carinhosos e parabéns mil para a mamãe da Rosanna, octogenária de muita energia. Findada com duas reflexões para o próximo encontro almoçal: Primeira: Devemos produzir pessoas doentes a fim de termos uma economia sadia, ou podemos usar nossos recursos materiais, nossas invenções, nossos computadores para servir aos problemas do homem? Segunda: Devem os indivíduos ser passivos e dependentes para que tenhamos organizações fortes e em bom funcionamento?
Voltamos para a casa, Melba e eu, com uma vontade danada de quero-mais.
Jornal do Commercio, 06.10.2010
Fernando Antônio Gonçalves