FRASES FAMOSAS
Andando com o João Silvino da Conceição, companheiro inseparável de caminhada matinal na Jaqueira, dele sempre ouço comentários favoráveis ao Shopping Tacaruna, em face da gentileza demonstrada pelo pessoal de recepção, logo na entrada. Um “bem-vindo ao nosso shopping” que agrada de montão.
Sabedor das inúmeras leituras do Silvino, um semi-alfabetizado e de recursos financeiros quase incompatíveis com sua voracidade por leituras bem calibradas, faço-lhe uma proposta engasgatória, dessas que identificam o QD (Quociente de Desbabaquização) de qualquer um: – Cite quatro notas significativas desse seu caderninho de frases.
Valendo-se de um Valei-me Toinho Braule!, suplicação vez por outra por ele declamada, o João não se faz de rogado e logo chama outro amigo seu de jaqueirismo (exercitar-se no Parque da Jaqueira), o Faguinho Silva, para testemunhar sua resposta. E sapeca as quatro observações, que muito sensibilizaram. O extraído abaixo é fruto de um gravador safadoso de bolso e pilha, a concordância sendo devidamente adequada, para bem distanciar-se das redações dos vestibulares das arapucas do ensino superior:
“A frase do Mahatma Gandhi ‘Acreditar em algo e não vivê-lo é desonesto’, para mim, é considerada meu carro chefe. Acredito que a hipocrisia é o maior pecado do mundo contemporâneo. No Brasil de hoje, a hipocrisia dos candidatos a cargos eletivos está na razão direta da ausência de uma cidadania consistente, que impossibilitasse a ascensão de debilóides, fingidos e sacripantas de patriotismo zero.
Tenho um profundo respeito pelo pensamento de Anne Frank, jovem judia de diário notável, vítima da sanha de um extremismo de direita que teima em ressurgir, graças às fragilidades de uma parte da esquerda, contempladora do próprio umbigo, autofágica por excelência. Eis o que ela escreveu: ‘Para nós, jovens, é duas vezes mais difícil manter nossas opiniões numa época em que os ideais são estilhaçados e destruídos, quando o pior da natureza humana predomina, quando todo mundo duvida da verdade, da justiça e de Deus’. Que a juventude, sem moralismos nem puritanismos vexaminosos, saiba separar o joio do trigo, menosprezando o chulo, rejeitando a mediocridade travestida de evento cultural, percebendo-se construtora legítima dos amanhãs nacionais soberanamente edificados.
Quando li Hamlet, de William Shakespeare, gravei uma frase da Cena 2, no Ato II, que considero excelente biruta para aqueles que enxergam partes ruins em tudo, mentalidades fofoquistas que descobrem arqueiros em olho de chinês a metros de distância, pouco se lixando para a trave que traspassa olhos, ouvidos e gargantas: ‘As coisas em si mesmas não são nem boas nem más, é o pensamento que as torna desse ou daquele jeito’. O querido Dom Hélder Câmara dizia que tem gente que faz de lagartixa jacaré, se ferrando todo quando se depara com um jacaré de mesmo pela frente.
Um latinoamericano me faz cada vez mais ser uma pessoa que busca saber bem o significado do que seja ser Filho de Deus. O Jorge Luís Borges, numa frase só, nos desafia para enfrentar os amanhãs que exigirão criticidade, competência, criatividade e compromisso social: ‘O tempo é um rio que me assola, mas eu sou o rio; é um tigre que me destrói, mas eu sou o tigre; é um fogo que me consome, mas eu sou o fogo’.
Com a andada matinal se findando, o convite do João Silvino para uma cervejinha foi aceito de bate-pronto, sem pestanejos, o colasterol que se danasse pelo menos até a próxima reunião, arretada como de costume, sem academicismos, porque integralmente isenta dos auto-elogios bundões que nunca sabem estabelecer a diferença entre seriedade e ridículo, sabedoria e vomitação, Mário Covas e Fernando Henrique Cardoso.