ÉTICA E COMPROMISSO


Outro dia, não faz muito tempo, deparei-me com uma observação pra lá de oportuna: “o futuro, agora, pertence às sociedades que conseguirem se organizar para aprender.” Um excelente mote para gestores públicos e empresariais que ainda estão convergindo para dois pontos considerados indissociáveis, catapultadores de um desenvolvimento econômico integrado e integrador. O primeiro: a importância estratégica da educação fundamental, como pilastra do desenvolvimento nacional. O outro: a revalorização do processo de aprendizagem, abandonando-se o apenas chilicoso e embromatório, possuidor de apenas quinze minutos de fama, para concentrar-se num soro caseiro lê-escreve-conta-e-pensa eficaz, único fomentador do fortalecimento do binômio cidadania-profissionalidade, uma via de mão dupla, interdependente por derradeiro.

O cidadão do século XXI, consciente das profundas alterações tecnológicas, sociais e econômicas acontecidas nos últimos vinte anos, percebe que um aprender-desaprender-reaprender permanente é indispensável estratégia para um consistente desenvolvimento profissional. Que muito o auxilia a enxergar melhor o seu derredor, tornando-o menos perplexo num mundo cada vez mais admiravelmente novo, aparentemente louco e destrambelhado, seguramente a necessitar de uma mais efetiva justiça social, sem protelações descabidas e julgamentos tartarugais.

Segundo consagrados especialistas em desenvolvimento profissional, no final desta década só existirão dois tipos de profissionais: os rápidos e os mortos. Quem deseja manter sua trabalhabilidade afiada, reconhece que a permanência e a mutação são contrários, como já apregoava Confúcio, nascido 551 anos antes do Homão da Galileia. O sábio apontava cinco qualidades para quem desejasse ser bom profissional: 1. Gentil sem aceitar subornos; 2. Trabalhar ao lado do povo sem dar motivos para ressentimentos; 3. Possuir ambições sem ser avarento; 4. Ter dignidade sem orgulho indevido; 5. Inspirar respeito sem exercitar a crueldade. Com tais predicados, todo ser humano deveria, segundo ainda Confúcio, “estudar como se jamais fosse aprender, como se tivesse medo de perder o que deseja aprender”.

No mais, é perceber com maior nitidez a sabedoria explicitada por Miguel Falabella, talentoso ator e dramaturgo: “De uns tempos para cá, comecei a perceber que há uma geografia fascinante no outro. Sempre. A gente não dá muita atenção, porque não temos tempo, não abrimos mão de certas prioridades, não paramos para olhar no espelho, que dirá o olho do próximo! Mas é, igualmente, um jogo fascinante, esse de descobrir gente e seus universos. Amar as pessoas e suas diferenças – esse é o jogo que venho jogando de uns tempos para cá e, acreditem, tenho gostado cada vez mais das descobertas, porque há gentes que são continentes e uma promessa de terra para o navegador solitário”.

Assino embaixo, sem pestanejar, aplaudindo o alerta contido numa revista especializada: “A mudança pode chegar com uma velocidade espantoso, deixando a empresa, os empresários e os profissionais na defensiva e com inúmeros problemas, obrigados a aderir às atualizações indispensáveis”. Sempre balizando todos pela reflexão de Martin Luther King: “Se um homem é contratado para ser um gari, deve varrer as ruas do mesmo modo como Michelangelo pintava ou Beethoven compunha”.

Recomendaria aos leitores de todos os naipes pensantes, o livro A Civilização do Espetáculo, do Mario Vargas Llosa, Objetiva, 2013, onde o autor adverte com muita propriedade, principalmente depois da passagem do papa Francisco entre nós: “A civilização pós-moderna desarmou moral e politicamente a cultura do nosso tempo, e isso explica em boa parte por que alguns dos ‘monstros’ que acreditávamos extintos para sempre, depois da Segunda Guerra Mundial, como o nacionalismo mais extremistas e o racismo, ressuscitaram e estão de novo rondando no próprio coração do Ocidente, ameaçando mais uma vez seus valores e princípios democráticos”. E o autor ainda chama a atenção para um fato que está ocorrendo nos dias atuais no Brasil: “Nada desmoraliza tanto uma sociedade nem desacredita tanto as instituições como o fato de seus governantes, eleitos em eleições mais ou menos limpas, aproveitarem o poder para enriquecer burlando a confiança pública neles depositadas”.

Atentemos todos: se uns poucos vivem em casulos de riqueza e outros habitam guetos de miséria absoluta, não é salutar prognosticar o futuro desta situação como pacífica. A tarefa de reconstrução é coletiva, fruto de alianças que conduzam a patamares sociais mais elevados, com novos modos de pensar nosso futuro. Além disso, a liberdade não deve significar licenciosidade, violência ou guerra. A teoria da perfeição não existe. Quanto mais turbulenta a época, mais consciente deverá ser a determinação de mudar. Nem a história bíblica de Davi e Golias deve ser menosprezada. Tampouco o velho barbudo, quando escreveu, n’O Dezoito Brumário de Luís Bonaparte, que “a história sempre acontece como tragédia e se repete como farsa.”

PS. Para quem deseja melhor assimilar as reflexões de Vargas Llosa, recomendo as seguintes leituras: Notas para a definição de cultura, T.S.Eliot, É Realizações, 2011; No castelo do barba azul – algumas notas para a redefinição da cultura, George Steiner, Relógio D’Água, 1992; e A sociedade do espetáculo, Gut Debord, Contraponto, 1997.

(Publicada em 02.09.2013, no Jornal da Besta Fubana, Recife, Pernambuco)
Fernando Antônio Gonçalves