EDUCAÇÃO DOS AMANHÃS BRASILEIROS


“A mais pérfida maneira de prejudicar uma causa é defendê-la intencionalmente com más razões.” (Friedrich Nietzsche)

Constatações recentes me estão desafiando ultimamente, depois da saída por telefone de um ministro da Educação de nomeada. A primeira é uma reflexão do professor Ésio Rafael: “Algo terá de ser feito dentro da rede estrutural de educação no País. Não há mais tempo a perder, e antes que o leite derrame temos que mexer nessa teia onde o ‘Homem Aranha’ está por um fio. Os conceitos básicos à evocação de velhos mitos não têm alimentado o hoje, nem as perspectivas do amanhã. As mudanças terão que vir à tona porque a necessidade é o recurso mais importante e imperativo do momento”.

A segunda foi colhida no noticiário sobre o ensino superior nos EEUU. As estatísticas merecem análise: 22% dos graduados 2010 obtiveram empregos que não exigem diploma superior; 57% dos americanos consideram que o seu ensino superior não vale os gastos despendidos; 33% dos que ingressam nas universidades abandonam o curso no primeiro ano; e 50% dos estudantes dos cursos superiores jamais se formarão. Segundo Andrea Murta, de Washington, “cada vez mais gente questiona se vale a pena investir na qualificação acadêmica”.

A terceira constatação advém de Peter Thief, um dos empreendedores do Facebook. Ele lançou, recentemente, bolsas de cem mil dólares para autores de projetos de inovação tecnológica. Com uma condição: os contemplados terão de abandonar os seus cursos superiores por, pelo menos, dois anos!

Uma quarta constatação é datada dos anos setenta do século passado e foi extraída de um livro famoso, Sociedade sem Escolas, Vozes 1988, de Ivan Illich, co-fundador do controvertido CIDOC, Cuernavaca, México: “Não podemos iniciar uma reforma educacional sem antes compreender que nem a aprendizagem individual e nem a igualdade social podem ser incrementadas pelo rito escolar”.

A última é originária de duas famosas instituições, Harvard e MIT. Elas implementaram laboratórios multidisciplinares que apontarão novos horizontes para as universidades do século 21. A missão deles será a de gerar criativos empreendimentos a partir do cruzamento das áreas do conhecimento.

Diante das constatações acima, ousaria externar, para docentes e dirigentes educacionais de todos os níveis brasileiros, especificamente os do ensino profissionalizante e os do ensino superior, algumas “binoculizações” que poderiam ser utilizadas em debates que integrassem “fazejamentos” diversos. Ei-las:

1. A educação técnica e a superior devem fortalecer uma trabalhabilidade circunstancial, cabendo a cada capacitado, obtido seu grau maior de escolaridade, preservar, aperfeiçoar e oferecer suas competências ao mundo do trabalho, sempre buscando atualizações.

2. O ensino técnico e o universitário devem habilitar profissionais capazes de migração de uma equipe para outra, também de uma região para outra ou para outros países, a internet muito propiciando a emersão de sonhos e novos conhecimentos.

3. Os capacitados pelos ensinos técnico e universitário devem estar cientes da necessidade de uma continuada aprendizagem, posto que os atuais ambientes profissionais estarão a exigir a cada ano novos comportamentos estratégicos e habilitações inexistentes nas atuais graduações.

4. Cada grau de ensino deveria alertar seus docentes e graduandos para evitar um viver baseado nos ontens e anteontens que ensejam profissionalidades regressivas e crescentes níveis mentais de obsolescência. Inclusive de gestão. Favorecendo a gradativa melhoria da memória e da criatividade empreendedora, favorecendo perspicácias e binoculizações diferenciadas dos nossos ontens e anteontens nacionais.

5. No sistema educacional, alguns parâmetros devem ser considerados na mais alta conta:
a. Não se pode ter uma administração eficaz quando se gasta muito tempo em discussões estéreis ou retardamentos decisórios;
b. É preciso ter continuado senso de urgência;
c. Nada aniquila mais uma ideia que o seu adiamento;
d. Não vencerá jamais quem não melhor se relacionar com pessoas e instituições, ideias e fatos;
e. Bibliotecas e políticas editoriais ainda são excelentes meios de alavancagens cognitivas docentes, discentes e administrativas;
f. O espírito científico num sistema educacional deve ser entendido como uma continuada retificação de saberes, a ninguém sendo permitido o título de dono da verdade;
g. Ousadias, em toda instituição educacional, devem permanecer distanciadas das burocratizantes posturas acomodatícias;
h. Fortalecer os nexos público-privados e incentivar um estreitamento entre sistemas educacionais públicos e organizações da sociedade civil para, sem imiscuições espúrias, a identificação de políticas públicas para problemas de qualidade, equidade e eficiência dos procedimentos empreendedores.

Os atuais níveis educacionais brasileiros, com as mínimas exceções, estão mais voltados para a reprodução de receitas do que para formulação de estratégias. Para a maioria dos dirigentes educacionais não são por demais preocupantes os amanhãs educacionais do país, desapercebidos que estão da advertência de Ludwig Wittgenstein: “Quando se está atolado na lama, só há uma coisa a fazer: caminhar. É melhor cair morto de exaustão do que morrer se lamentando”.

Deixaria registrado, para os militantes educacionais, os versos de Álvaro de Campos (Fernando Pessoa), magnífico poeta luso. Versos que muito bem balizam o que seria um caminhar docente de missão cumprida, a partir de um digno piso salarial para todos os professores brasileiros:

“Quanto mais eu sinta, quanto mais eu sinta como várias pessoas,
Quanto mais personalidade eu tiver,
Quanto mais intensamente, estridentemente as tiver,
Quanto mais simultaneamente sentir com todas elas,
Quanto mais unificadamente diverso, dispersadamente atento,
Estiver, sentir, viver, for,
Mais possuirei a existência total do universo,
Mais completo serei pelo espaço inteiro fora”.

(Publicado em 26.10.2015, no site do Jornal da Besta Fubana – www.luizberto.com)
Fernando Antônio Gonçalves