DOM AMADO
Nas comemorações de mais uma Semana Santa, quando milhões de cristãos relembram o sofrimento do subversivo Homão da Galileia, reverencio um irmão já eternizado, Dom Hélder Câmara, ex-arcebispo de Olinda e Recife. Um exemplo de inteligência a serviço da Missão, de uma enxergância ímpar, binoculizadora por derradeiro, antecipadora de atos e fatos ainda desconhecidos de muitos.
Seu livro Mil Razões Para Viver – Meditações do Padre José, Civilização Brasileira, 1978, lido, relido e rabiscado, permanece ao alcance dos meus olhos, quando prenúncios nada relevantes tentam desatapetar meus sonhos de cidadania comunitária, que anseiam por mais justiça e renda para nossa gente, sem assistencialismos cavilosamente enganadores.
Algumas de suas recomendações são orações minhas diárias. Três delas obrigatórias: “Faze com alma o que na vida te for dado fazer. Mas não te esqueças nunca de integrar-te nos grandes planos de Deus”; “Dar o máximo. Trabalhar sempre com alma e com toda a alma, quer se trate de conduzir às estrelas uma nave espacial ou de fazer uma simples ponta de lápis”; “Quando houver contraste entre a tua alegria e um céu cinzento, entre a tua tristeza e um céu sem núvens, bendiz o desencontro: é aviso divino de que o mundo não começa nem acaba em ti.”
Quando do desfile televisivo último das escolas de samba do Rio de Janeiro, assisti entrevistas de personalidades descriativas, sem um mínimo de humor contagiante, descontemporâneas por derradeiro. E recordei duas advertências do Dom, sutilmente cáusticas: “Não é fácil em corpo de Cadillac conservar alma de jipe”; “Das barreiras a romper a que mais custa e a que mais importa é, sem dúvida, é a da mediocridade”.
Em tempos de disputas eleitorais, onde muitos buscam eleitores indecisos, relembro uma solicitação do Dom feita ao Pai Eterno: “Empresta-me tua flauta mágica. Andam todos agressivos. Dão a impressão de insones, esgotados, nervos tensos. Não falam, agridem. Estão quase incapazes de julgar bem; de crer na palavra alheia, de amar. Seria bom demais, Senhor, serená-los, desarmá-los, fazê-los dormir.”
Para algumas personalidades brasileiras, inclusive do Poder Judiciário, eu recomendaria uma outra reflexão do Dom, oportuna para os tempos de agora: “Se desejas dialogar não te imponhas como inevitável total. Vai como parcela…”. Pois “feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo.”
Um livro acima citado destina-se aos que buscam ser simples e puros de coração, aos que “agora que a velhice começa preciso aprender com o vinho a melhorar, envelhecendo e sobretudo a escapar do perigo terrível de, envelhecendo, virar vinagre…”
PS. Uma Feliz Páscoa para pernambucanos e pernambucanizados que nem eu!!
(Publicado no Jornal do Commercio, Recife, Pernambuco, 04.04.2014