DÉFICIT MUNDIAL DE LIDERANÇA


Claramente se observa que o mundo contemporâneo se encontra vitimado por um brutal déficit de liderança. Recentemente, o jornalista Mino Carta, num dos seus editoriais da revista Carta Capital, assim se expressou: “A maioria dos brasileiros não possui a consciência da cidadania e até hoje 1% da população é dona das terras férteis. Temos um povo resignado e uma elite, salvo raras exceções, exibicionista, ignorante, mal-educada e terrivelmente provinciana. … Não é por acaso que quaisquer estudos, pesquisas e estatísticas sobre ensino exibem a precariedade do próprio”.

Recentemente, um consultor internacional, James A. Autry, autor do livro O Líder Servidor, Verus editora, que estabelece diretrizes de como construir um time criativo, desenvolver a motivação e melhorar desempenho das equipes, listou seis balizamentos a respeito da liderança. Reproduzo-os aqui: 1. Liderança não tem nada a ver com controle de pessoas; tem a ver com se importar com as pessoas e ser um recurso útil para elas; 2. Liderança não tem nada a ver com ser chefe; tem a ver com estar presente para as pessoas e envolvido com a criação de uma comunidade de trabalho; 3. Liderança não tem nada a ver com agarrar-se a um território; tem a ver com desprender-se do ego e trazer seu espírito para o trabalho, mostrando seu melhor e sendo o mais autêntico possível; 4. A liderança é menos preocupada com exortações e mais preocupada com a criação de um ambiente onde as pessoas possam desempenhar um bom trabalho, encontrar um significado em sua função e possam trazer seu espírito para o trabalho; 5. A lideraança, como a vida, é em grande medida um questão de prestar atenção; 6. Liderança requer amor.

O professor Ladislau Dowbor, titular do Departamento de Pós-Graduação de Economia e Administração da PUC-SP, vez por outra afirma que estamos vivendo um estranho paradoxo. Temos cada vez mais tecnologias e estamos nos sentindo cada vez mais ameaçados. Com um agravante: a cada anos, dez milhões de crianças morrem pelo simples fato de não terem tido acesso a coisas simples, como água potável e alimentação mínima todos os dias. E ele declara que não é o espectro do comunismo que ronda o planeta, mas o imenso saco-cheio de uma população cansada de ver milhões de crianças bombardeadas por gigantescas mensagens publicitárias, onde até uma cantora, para ampliar seus cinco minutos de mínima fama, declara que já praticou sexo anal e até atingiu orgasmo convincente.

O endeusamento da tecnologia de ponta faz com que se olvide do bom feijão-com-arroz educacional, como se cada aluno tivesse em mãos um tablet, mesmo que o forro do principal salão da escola tenha arriado há mais de um ano, até agora apenas subsistindo os carimbos e as incompetências gerenciais de praxe, proscratinando-se o inadiável, brincando-se com a vida de profissionais dedicados. E Dowbor não contempla: “A força do capital/dinheiro geralmente leva os avanços da física a se transformarem em armas, os avanços na informática a se converterem em mecanismos planetários de especulação financeira, os avanços na química fina a se transformarem em agrotóxicos, os avanços na biologia a levarem à monopolização de sementes, e assim por diante.” Para não falar, aqui de uma idiótica candidata à presidência da república dos Estados Unidos que proclamou, recentemente, que o furacão Irene tinha sido castigo de Deus!!!

A Rose Marie Muraro, uma admiração de muitos anos, diz que “a democracia política que vivemos foi um grande avanço, mas o controle da política através da concentração de poder econômico está simplesmente ameaçando a própria democracia”.

Em 1943, ano de minha chegada ao mundo, numa Natal sob intenso blackout, Karl Manheim vaticinava: “Todos nós agora sabemos que depois desta guerra não há como voltar a uma sociedade do laissez-faire, pois a guerra é responsável por uma revolução silenciosa, ao preparar o caminho para um novo tipo de ordem planificada”.

As lideranças mundiais estão a necessitar de uma dose maciça de contemporaneidade gerencial, para repensar o Estado. A esquerda necessita aprimorar pela cativação o seu discurso, abandonando as irresponsabilidades cometidas nos passados recentes, buscando comportar-se eticamente nos diversos poderes da república, renegando bandidos travestidos de parlamentares ou executivos estaduais e municipais. Nunca pondo de lado, a reflexão de Tony Judt, esse talentoso inglês que partiu há pouco mais de um ano: “Há muitas áreas áreas na vida em que o interesse coletivo não é atendido quando fazemos apenas o que é melhor para cada um de nós. Quando o mercado e a livre iniciativa não atendem os anseios coletivos, precisamos saber quando intervir”.

Todo conformismo é tentador, principalmente para as classes médias e altas, que sempre se estupidificam mais quando as taxas inflacionárias são diminutas, somente descobrindo potencialidades nas classes menos favorecidas quando a mais-valia se comprime, não gerando os dividendos necessários para a manutenção das alienações.

(Publicada em 03/10/2011, no Portal da Revista ALGOMAIS, Recife – PE)
Fernando Antônio Gonçalves