DÉCADA DE MUITOS RISCOS
Diante dos últimos acontecimentos planetários, quando a chegaa ao planeta Marte pode se transformar num divisor de etapas civilizatórias, urge sem mais tardar conceber uma mais digna concepção de vida terrestre, favorecendo uma convivialidade menos hedonista e egolátrica, onde “a perda mais lastimável é a que se dá pela negligência”, segundo advertência proclamada pelo filósofo Lúcio Sêneca (-4 a.C. – 65 d.C.), um contemporâneo do Profeta da Galileia.
Lamentavelmente, ampliou-se a negligência do ensino de Filosofia nos mais diferenciados níveis de escolaridade, sendo sua morte anunciada até por gente tida e havida como de muita intuição, como Stephen Hawking no livro O Grande Projeto – Novas Respostas para Questões Definitivas da Vida, editado este ano pela Nova Fronteira, RJ. Um anúncio que apenas faz ressaltar a necessidade de erigir a Filosofia como fonte inesgotável de prazer e alegria, tal qual aquela explicitada por Nietzsche, um autor que ainda é visto de soslaio por alguns filósofos profissionais que lastimam sua falta de rigor, nunca percebendo que ele apenas desejava “provocar e gozar o desespero e a confusão dos outros”. Coube a Michel Foucault, um nietzschiano, o esclarecimento sobre o assunto: “Eu procuro dizer aquilo que nós somos hoje, e o que é que agora significa dizer aquilo que nós dizemos. Este escavar sobre os próprios pés caracteriza, desde Nietzsche, o moderno pensar e nesse sentido eu posso me designar como filósofo”.
Os diferenciados ambientes de ensino carecem, hoje, de amplíssima restauração. Sente-se como foi predatória para a Cultura Brasileira a eliminação, pelo mando ditatorial, das disciplinas Filosofia e Sociologia do pós Ensino Fundamental. Um sentimento de perda já sentido, muitos anos antes, pelo inesquecível Noel Rosa, no seu Filosofia: “Quanto a você / Da aristocracia / Que tem dinheiro / Mas não compra alegria / Há de viver eternamente / Sendo escrava desta gente / Que cultiva hipocrisia.”
As chances de mobilização por um futuro sustentável só acontecerá quando um movimento de conscientização planetária acontecer, alertados todos sobre as práticas predatórias que se acumulam. Em 1972, há quarenta anos, U Than, secretário-geral das Nações Unidas, alertava as autoridades mundiais: “Os membros das Nações Unidas têm talvez apenas dez anos para deixar de lado suas antigas rixas, melhorar o meio ambiente humano, reduzir a explosão populacional e imprimir o necessário impulso aos esforços desenvolvimentistas. Não acontecendo nada disso, receio imensamente que os problemas que mencionei atingirão proporções tão atordoantes que estarão além da nossa capacidade de controle”. Vinte anos depois, em 1992, mil e seiscentos cientistas de 70 países lançavam o documento “Alerta dos cientistas do mundo à humanidade”. Um trecho: “Os seres humanos e o mundo natural estão em rota de colisão. As atividades humanas infligem danos graves e frequentemente irreversíveis ao meio ambiente e às reservas críticas. Se não controladas, muitas de nossas atuais práticas colocarão em risco o futuro que desejamos para a sociedade humana e os reinos animal e vegetal, e poderão alterar de tal forma o mundo vivo que ele ficará incapaz de sustentar a vida da maneira que conhecemos. Mudanças fundamentais são urgentes se quisermos evitar a colisão que o nosso curso atual provocará”.
Uma indagação persiste em aparecer nos últimos eventos técnico-científicos mundiais: “Há uma maneira de pensar sobre o que pode nos acontecer durante as próximas várias centenas de milhares de anos, o futuro a médio prazo?” E as indagações da professora de educação Cynthia Stokes Brown, ganhadora do American Book Award e que morou dois anos em Fortaleza, Ceará, onde ampliou seu horizonte cultural lendo os textos do educador Paulo Freire, são por demais pertinentes: 1. As políticas mundiais atuais estão conduzindo a um futuro sustentável ou a algum tipo de colapso?; 2. Novas tecnologias podem alterar a tendência a longo prazo dos sistemas mundiais crescerem e ruírem?; 3. Pode o sistema de mercado alocar recursos de uma maneira sustentável?; 4. Podem os habitantes de países industrializados aprender a viver em harmonia com a natureza, podendo também compartilhar com pessoas de países menos industrializados?.
Às perguntas da professora Stokes Brown poderiam ser adicionadas outras: 1. De que maneiras, com o fortalecimento do ensino da Filosofia, se poderia ampliar a Cidadania das nossas crianças e adolescentes?; 2. Como não descurar, no Ensino Profissionalizante, dos conteúdos que impossibilitem a autodestruição da razão?; 3. Como promover a superação da mais-conciência sobre a mais-valia?; 4. Como proporcionar emulação aos governantes sobre a irreversível biunivocidade entre ampliação do consumo cultural e processo educacional crítico?; 5. Como reglobalizar o planeta, desglobalizando o atual estado de coisas, quando o atual estágio dos impérios capitalistas não pode prescindir de uma manutenção constantemente ampliada das suas indústrias bélicas?
Somente serão obtidas respostas e estratégias humanísticamente exequíveis quando a defesa do ser sobressair-se sobre um ter individualista, egoísta e predador. Para que não sejamos apontados como Nação Mais-Valia, porque os 10% mais ricos concentram 75% da riqueza e da renda nacional. Uma nação que nega aos mais necessitados um existir com dignidade.
(Publicada em 12.08.2012 no Jornal da Besta Fubana, Recife, Pernambuco
Fernando Antônio Gonçalves