DE FILHO PARA PAI ÀS VÉSPERAS DA PAIXÃO
Um recém formado, diplomado quando já quase coroa, pai de dois filhos e administrador condominial, recém tornado trabalhador de um Centro Espírita, terminando a leitura de Paulo de Tarso, o Maior Bandeirante do Evangelho, de Huberto Rohden, SP, Martin Claret, 2013, 484 p., sentiu-se com saudades múltiplas de seu pai, um trabalhador rural alfabetizado, desencarnado há mais de três décadas em Triunfo, Pernambuco, ensejando sua transferência para a casa de uma tia, no Recife, que o ajudou a retemperar o ânimo meio avesso aos estudos. E redigiu, sob forte emoção a carta abaixo, que transcrevo sob sua expressa autorização:
“Eu aprendi, pai… Aprendi que não se pode fazer alguém amar a gente, posto que o que deve ser feito é ser um alguém que possa ser amado, o resto sendo da escolha dos outros.
Aprendi, velho, que se demora anos para se edificar uma confiança, alguns segundos sendo necessários para destruí-la.
Aprendi, meu amigo maior, que o que vale não é “o quê” você tem na sua vida, mas sim “com quem” você está nela, somente isso valendo a pena.
Aprendi, coroa, que eu posso ficar encantado por alguém durante quinze minutos, sendo imprescindível, para ampliar a minha corte, saber um pouco mais do comportamento social e da estatura moral da cortejada.
Aprendi, companheiro de Vida, que melhor do que comparar-se ao muito bom que os outros fazem, vale a pena procurar fazer o melhor que se pode.
Aprendi ainda, amigão, que o que importa não é o que acontece com as outras pessoas, mas sim o que elas fazem para que isso possa acontecer, pouco importando quão fino seja o pedaço que lhe cabe, pois sempre haverá dois lados.
Aprendi, pai, que sempre se deve despedir de pessoas amadas com palavras amáveis e carinhosas, posto que pode ser a última despedida.
Aprendi, velho amigo, que se deve continuar andando até achar que não dá mais, definindo por heróis aquelas pessoas que fazem o que deve ser feito no momento oportuno, sem levar em conta as consequências nem as ameaças, tampouco os abandonos e menosprezos.
Aprendi, querido pai, que há pessoas que amam demais, não sabendo demonstrar seus sentimentos através de gestos concretos. E também aprendi que quando estou com raiva tenho o direito de estar aborrecido, embora isso não me dê o direito de ser estúpido em momento algum.
Aprendi na própria carne que uma amizade verdadeira continua a crescer mesmo na mais longa distância, o mesmo acontecendo com um amor eivado de muita sinceridade.
Aprendi, pai, que não importam as consequências, desde que os princípios sejam preservados nos caminhos do existir. E também aprendi que duas pessoas podem olhar para a mesma coisa e verem algo totalmente diferente.
Aprendi, meu velho, que mais importante que ser esquecido pelos outros é saber aprender a esquecer de si mesmo, na luta por um mundo menos desigual.
E aprendi que mesmo quando se pensa que não se tem nada a dar, quando um amigo chora precisando de seu apoio, tem-se ainda muito fôlego para ajudar. Como aprendi que escrever, assim como falar, pode amenizar inúmeras dores e sofrimentos. Com todo amor de sempre, muitas vezes erradamente explicitado, me despeo, na felicidade de um breve reencontro.”
PS. Para todos os leitores amados, uma Semana Santa de muita paz e reconciliação, meditação e bons propósitos, sempre recordada a figura ímpar daquele Nazareno que foi o mais revolucionário personagem da História da Humanidade, a produzir extraordinárias alterações nas áreas religiosas, filosóficas, politicas e sociais nos quatro quadrantes do nosso planeta, uma de suas Casas.
(Publicado em 26.03.2018 no site do Jornal da Besta Fubana (www.luizberto.com) e em nosso site www.fernandogoncalves.pro.br)
Fernando Antônio Gonçalves