CONTRA FANATISMOS
Confesso sem qualquer arrependimento: não nutro simpatia alguma pelos fanáticos, sejam eles fundamentalistas religiosos, esportivos, políticos e ideológicos. E também defino como um tipo camuflado de fanático os moralistas.
A minha antipatia se manifesta primeiramente diante dos fanatismos jumentálicos, aqueles que se manifestam despidos dos argumentos mínimos, sem os quais não se principia um diálogo conseqüente, ainda que jamais convergente.
Ratifico o pensar da vovó Neuza, 78 primaveras tinindo de muita pensação: “perdi completamente o pouco preconceito que por ventura tinha. Preto, branco, amarelo, rico, pobre, famoso, desconhecido, gay….só não tolero muito burrice e ignorância. Perco um pouco a paciência”.
Há, no campo religioso, um transtorno mental denominado “síndrome de Jerusalém”: pessoas que, visitando Jerusalém, de repente inflamam-se, pondo fogo em mesquitas, igrejas e sinagogas. Ou, se comportando de uma outra maneira, tiram as roupas, sobem num elevado qualquer e começam a profetizar para uma platéria de três ou quatro apenas curiosos. E os pronunciamentos são os mais diferenciados, indo de política, poluição, fim próximo do mundo, nudismo, bem e mal, sexo, homoafetividade, meio ambiente e excesso de silicone nos peitos.
Acredito que somente os moderados de cada tipo de sociedade poderão estancar as fúrias fanáticas, desde que o combate seja explicitado efetivamente através de manifestações racionalmente constituídas de esperança na efetivação das soluções para os principais problemas apresentados. Restaurando alegrias, fascinações, entusiasmos e os “desmedos” (não-medos).
Um estudioso de fanatismo, Amós Oz, judeu militante do Movimento Paz Agora, diz que “o fanatismo está em todos os lugares, e suas formas mais silenciosas, mais civilizadas, estão presentes em nosso entorno”. E enfatiza: “a semente do fanatismo sempre brota ao se adotar uma atitude de superioridade moral”.
Qual a melhor arma para se combater o fanatismo? O senso de humor é a indicação eleita em todos os quadrantes, psiquiátricos, psicológicos e comportamentais. E a prova é cabal: nunca se viu um fanático com senso de humor, a recíproca também sendo muito verdadeira, nunca se viu uma pessoa dotada de senso de humor tornar-se fanática. Resultado: quem tiver senso de humor fica como que imune ao fanatismo. É sempre bom reparar o comportamento de uma pessoa, civil, militar ou religiosa, diante de uma outra bem humorada, que sabe contar uma boa história, algumas até bem apimentadas, sem resvalar para mediocridades: geralmente olhando de soslaio, de cara semi-amuada, externando risinhos mínimos para não ser identificado como um que não compreendeu devidamente o “espírito da coisa”. E geralmente não tolera que o bem humorado esteja no centro das atenções, quando ele deveria ter para ele todos os holofotes, dada sua superioridade auto-imaginada.
Tenho um amigo-irmão que me relembra, vez em quando, como sua avó querida explicava aos netos a diferença entre judeu e cristão. Dizia ela: “Vejam só: os cristãos acreditam que o Messias já esteve aqui e que certamente voltará algum dia. Os judeus sustentam que o Messias ainda está por vir. Já houve tanta raiva, perseguição, derramamento de sangue, ódio a respeito disso … Por que? Por que as pessoas não podem simplesmente esperar e ver? Se o Messias vier e disser “oi, é bom revê-los”, os judeus vão ter reconhecer seu engano. Se, de outro modo, o Messias chegar dizendo “muito prazer, é um prazer conhecê-los”, todo o mundo cristão terá que pedir desculpas aos judeus. Entre o dia de hoje e aquele momento futuro, apenas vivam e deixem viver”.
Não se deve ser pacifista sob cargas sentimentalóides, muitas delas camuflando covardias e frouxidões. Acredito que toda guerra é terrível, embora considere que o pior de tudo é a agressão.
E o poeta Robert Froes estava recheado de razão: “uma boa cerca faz bons vizinhos”.