BOAS NOVAS


Recentemente, mais de 600 pessoas lotaram um auditório, na Espanha, para ouvir o teólogo José Antonio Pagola, autor de Jesus – Aproximação Histórica, Vozes, 2011, que há muitos anos se dedica a pesquisar o Homão da Galileia. E o tema da convocação não poderia ter sido mais oportuno: Voltar para Jesus, o Cristo. O questionamento é provocativo: “Que segredo se esconde neste galileu fascinante, nascido há dois mil anos numa aldeia insignificante do Império romano e executado como um malfeitor perto de uma antiga pedreira, nos arredores de Jerusalém, quando beirava os 30 anos?”

E Pagola não desapontou: “É o momento do povo simples reivindicar o Evangelho, antes que a hierarquia se apodere dele”. E prognosticou: “Acredito que Francisco será o último chefe de Estado do Vaticano. Na palestra, Pagola descreveu uma Igreja “com atitudes de nervosismo e medo, de autodefesa, que vê o mundo como um adversário, que faz da condenação e a denúncia todo um programa pastoral. Uma instituição marcada, até a chegada do novo papa, pelo restauracionismo, passividade generalizada, sem atitudes de renovação, com o pecado da autorreferencialidade à flor da pele.”

Pagola, no entanto, ressaltou que “existe muita gente comprometida, mas uma massa de 1,2 bilhão de católicos vive na submissão, obediência e silêncio, em meio a uma religião de autoridade, e não de chamado”. Onde “o pessimismo cresceu”. Frente a isso, Pagola evocou a necessidade urgente de retornar para Jesus. “Não apenas uma reforma religiosa, sim uma conversão ao Espírito de Jesus. Não apenas adesão doutrinal, mas seguimento. Não apenas mudanças, mas atualização da experiência fundante”, criticou o teólogo, diante do aplauso da multidão reunida. Que precisa vir do povo, pois “a hierarquia, hoje, não pode liderar uma conversão a Jesus”. E foi além: “Devemos retornar ao que é a fonte e a origem da Igreja. Deixar que o Deus encarnado em Jesus seja nosso único Deus”.

Para Pagola, “é preciso reformar a Cúria, claro que sim, e mudar a doutrina, mas, primeiro, é preciso voltar para Jesus. Invocar um clima mais humilde, mais prazeroso, porque, caso contrário, seremos cada vez mais uma instituição decadente, mais sectária, mais rara, mais triste, mais distante do que Jesus quis”.

O teólogo demonstra uma coragem de jovem, apesar dos seus 76 anos, apontando para uma tragédia contemporânea. “É tarde. Deixamos morrer a Ceia do Senhor, porque a Igreja não se questionou seriamente sobre a razão das pessoas saírem”, proclamou Pagola, denunciando que, para além da crise vocacional ou do sacerdócio para a mulher, é preciso voltar a entender Jesus, “não como um Pai ou como um Rei, mas, fundamentalmente, como o que foi: um Profeta”.

O teólogo cita o papa Francisco com frequência: “Antes não me atreveria a dizer algumas coisas, mas é o Papa que está dizendo-as, toda manhã, nas missas em Santa Marta, reconhecendo nosso pecado como Igreja, e se responsabilizando por ele. Questionando nossas falsas seguranças, a santidade da Igreja, porque santificamos tudo e não vemos as traves que há dentro de nossa Igreja”.

O teólogo basco propõe algumas tarefas urgentes. Em primeiro lugar, “reavivar o espírito profético do movimento de Jesus. Não podemos nos resignar a viver uma religião cristã sem profecia”. Em segundo lugar, “uma presença mais ativa, indignada e atualizada”. Uma renovação na qual “a Igreja não é a mais importante, mas, sim, o Reino”. “Esta renovação não pode vir apenas do Vaticano. Chegou o momento de rememorar que o Cristianismo não é uma religião a mais, é uma religião profética, para construir um mundo mais justo, mais solidário, mais santo”. E, em terceiro lugar, “recuperar urgentemente a compaixão. Pois ser compassivos é a única maneira de seguir Jesus e de nos parecermos com o Pai”. E acrescentou. “A Igreja cristã perdeu a capacidade de atrair as pessoas, porque não levou a sério o sofrimento dos inocentes”.

Sua fala incisiva foi além: “Precisamos continuar buscando caminhos, a partir de Igreja que cada vez tem menos poder de atração, ou devemos recuperar o Evangelho de Jesus como única força para transmitir e engendrar a fé?” E afirmou convicto: “Hoje, o Evangelho se encontra aprisionado no interior de uma Igreja em crise”, razão pela qual “é preciso recuperar o protagonismo do Evangelho”. “As pessoas devem reivindicar o Evangelho para a hierarquia. O povo simples deve se apoderar do Evangelho”, pois “Jesus é muito mais atual do que os sermões que nós, padres, damos. Deus não está em crise, nem está bloqueado. Jesus não deu todo o melhor que tem”.

O papa Francisco, tenho certeza plena, está com Pagola. Pois só existe um futuro para a Igreja, um futuro “apaixonante”. E Pagola não tem a menor dúvida: “Francisco está inaugurando um tempo novo. Um novo estilo de Igreja simples, pobre, humilde, próxima e dialogante, que se preocupa com a felicidade do ser humano”. E concluiu sua palestra, sob fortes aplausos: “O Papa deve encontrar um apoio total em nós. Se ele promove a mudança a partir de cima, nós devemos promover o Reino a partir de baixo”.

Confesso o meu entusiasmo com os pensares do Pagola e do Francisco. Ambos são excelentes oxigenadores para uma Igreja que estava sob pilares tridentinos, sem medo de afrontar as forças poderosas que promovem a desigualdade social em nosso planeta. E anestesiando os bispos do mundo inteiro, a maioria deles “bonzinhos”, embora sem coragem alguma de promover a libertação dos oprimidos.

(Publicada em 05.08.2013, no Jornal da Besta Fubana, Recife, Pernambuco)
Fernando Antônio Gonçalves