BILHETE PARA BALTASAR


Embora Baltasar Gracián tenha partido em 1658, vez por outra relembro sua sapiência, do seu jeitão de ser jesuíta espanhol. O seu livro A Arte da Prudência, editado pela Martins Fontes, já se encontra sublinhado de cabo a rabo, sempre a merecer novos rabiscos, como o que fiz, semana passada, quando observei a tibieza do ministro Mercadante: “Quem se rebaixa perde a superioridade que lhe dava sua inteireza, e atrás dela a estima”. Ou quando, uma certa amiga comentou uma novela repleta de talentos globais, ainda que de enredo muito pouco educativo, reproduzindo uma reflexão que parece ter sido feita para os dias de hoje: “Com ninguém convém ter familiaridades: com os maiores, pelo perigo; com os inferiores, pela indecência; muito menos com a ralé, que é atrevida por néscia, e, não reconhecendo o favor que lhe fazem, presume obrigação. A familiaridade é parente da vulgaridade”. Oi, oi, oi….

As advertências do Gracián sedimentam caminhadas pessoais, familiares e profissionais. E devem ser relembradas: “Em todas as coisas, foge do excesso”; “Não se queixar nunca; a queixa sempre traz descrédito”; “Aprovar tudo costuma ser ignorância; reprovar tudo, malícia”; “Um homem atento percebe que é ou será visto. Sabe que as paredes têm ouvidos e que o que é malfeito acaba sendo conhecido”; “O primeiro sinal de ignorância é presumirmos que sabemos”.

Para uma binoculização dos amanhãs nacionais, urge defenestrar as baboseiras propositivas que prestam desserviços às políticas públicas, não sendo mais que massa de manobra para engabelar patuleias acabrestadas pelos cinismos políticos, midiáticos e religiosos. Razão tem o César Benjamin, em seu texto A Opção Brasileira: “Lula atuou metodicamente para demolir a capacidade de organização e mobilização das forças sociais que podem ajudar a mudar o Brasil, que paradoxalmente são as forças que o conduziram à presidência da República. Pregou a paralisia, difundiu o conformismo, infantilizou o povo”. E sobre o partido do ex-presidente, a reflexão é do jornalista José Arbex: “o Partido dos Trabalhadores é a versão taxidérmica ou mumificada do PT de 1979. Nada há nele que lembre o vibrante espírito do partido criado no calor das manifestações sindicais do ABC, responsável pelo aceleramento da queda da ditadura. O PT é hoje uma couraça ressequida, controlado por burocratas engravatados.

Proponho um exercício aos caríssimos leitores. Cada um convide pessoas, não mais que seis. Que releiam as opiniões acima transcritas e debatam sob as seguintes questões: Por que perdemos de vista as grandes questões que vão definir o que o Brasil será no século XXI? Por que hoje, se somos bem mais fortes que nos anos 50, os setores públicos que se dizem socialmente responsáveis só vivem de cortar, vender, desnacionalizar, fatiar, desmontar, desfazer, negar, contingenciar e demonizar os seus funcionários? Por que tanto marketing, slogans, anúncios, demagogias, fingimentos e jogo de poder diante de uma sociedade civil que se tornou aquedada?

Após os esclarecimentos, que todos cuidem carinhosamente dos seus títulos de eleitor. A Cidadania Brasileira agradece essa não-violenta manifestação de desprezo pelos políticos corruptos, despreparados, incultos e descomprometidos com as verdadeiras causas da libertação da nossa gente.
(Publicado no Jornal do Commercio, Recife, Pernambuco, 07.09.2012)
Fernando Antônio Gonçalves