AS BELEZAS DA MATEMÁTICA
Sempre rendo homenagens aos professores de Matemática que proporcionaram excelentes aulas na minha trajetória ginásio-colégio. Seus ensinamentos até hoje se fazem presentes no cotidiano profissional.
Por recomendação de um deles, meu pai me presenteou com o livro O Homem Que Calculava, de Malba Tahan, pseudônimo do professor de matemática Júlio César de Mello e Souza. Um livro que se encontra na sua 76ª. edição. Que narra, num clima de aventura e suspense, as proezas de um calculista persa chamado Beremiz Samir, homem dotado de raciocínio excepcionalmente veloz, tornado lenda no mundo árabe, encantando nobres e plebeus, xeques e sábios, todos interessados em resolver os desafios por ele propostos.
No livro, Tahan conta como encontrou, às margens do rio Tigre, com o homem que calculava. E como dele ouviu, depois do Salã aleikum costumeiro – A paz de Deus esteja contigo! -, uma história de vida, repleta de fatos e feitos inesquecíveis. Como a “descoberta de uma amizade quadrática”, o “encontro dos quadrados mágicos”, “o problema dos três marinheiros” e “como se acha a raiz quadrada de 2025”, aqui apenas citando uma amostra mínima.
No final do ano passado, o IMPA – Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada – proporcionou uma palestra a um grupo de jovens de todas as classes sociais. De bermudas e chinelos e por mais de duas horas, os futuros matemáticos se encantaram com a exposição feita pelo professor Michael Atiyah, 81 anos, ganhador da Medalha Fields quando tinha 37 anos de idade, a láurea mundial mais prestigiada da Matemática. E também honrado, em 1983, com o título de Sir, a ele concedido pela rainha Elizabeth II, da Inglaterra.
O professor Atiyah iniciou sua preleção, plena de entusiasmo e empatia contagiante com a “meninada” presente, citando três reflexões de Einstein: “Quero saber como Deus criou mundo. Não estou interessado neste ou naquele fenômeno. Quero saber como Ele pensa. O resto é detalhe”, foi a primeira delas, arrancando aplausos contidos dos presentes. A segunda entusiasmou mais ainda: “O aspecto mais incompreensível do mundo é o fato de ele ser compreensível”. A terceira foi uma demonstração de fé: “Deus é esperto, mas não é malicioso”.
Ao final do encontro, Michael Atiyah convocou os alunos a jamais abrirem mão do rigor científico, muito embora todos eles “à noite, devem se libertar dele, para sonhar deslumbrados com o milagre dos céus”. Segundo relato divulgado pela revista Piauí 52, janeiro 2011, “o auditório demorou a esvaziar. Atiyah ficou cercado de jovens. Queriam uma fotografia”.
Lamento o grau de desconhecimento das belezas da Matemática por professores e alunos dos nossos sistemas educacionais de ensino. Os professores, em sua maioria e os mais débeis principalmente, imaginando-se integrantes de uma corte de privilegiados decifradores de regras atordoadoras. Ainda que incapazes de didaticamente transmitir “os pulos do gato” aos seus alunos, os quais, complexando-se diante de tantas sabedorias não transmitidas pedagogicamente, imaginam os docentes além do Bem e do Mal, dotados de faculdades extraordinárias em domar números.
O matemático Ian Stewart afirma em seu Incríveis Passatempos Matemáticos, Zahar 2010, que “vivemos num mundo em que é cada vez mais difícil trabalharmos de modo sistemático num argumento ou numa discussão longa e complicada”. Porque “a matemática é essencial para tudo o que afeta nossas vidas”.
Como seria salutar se o MEC exigisse, de cada IES um projeto de curso de licenciatura em Ciências para cada projeto de curso em Ciencias Humanas, ambos submetidos às instâncias competentes de aprovação, ficando mutuamente dependentes.
Que se multipliquem os IMPA’s no Brasil, favorecendo a inteligência da gente brasileira. E que a Didática da Matemática afugente para bem longe as vítima discentes oriundas de enganadoras “falcudades”, mais preocupadas em “mais-valias”.
Jornal do Commercio, 16.02.2011
Fernando Antônio Gonçalves