ALÉM DE UM PRÊMIO NOBEL


Li com incontido entusiasmo entrevista concedida pela mãe e cientista Ada Yonath, 71 anos e Prêmio Nobel de Química 2009, a um jornal paulista de circulação nacional. Ela ganhou o Nobel pelos seus estudos sobre ribossomos, estruturas celulares que fabricam proteínas e que ensejam a descoberta de novos antibióticos.

A entrevista não foi de natureza técnica, mas de uma mulher e mãe, a primeira mulher israelense a ganhar um Nobel e que ainda trabalha no Instituto de Ciências Weizmann, em Israel, onde possui nove orientandos, sempre apaixonada pelos estudos. Entretanto, o que mais impressiona na entrevista é o orgulho por ela sentido em ser possuidora do título de “avó do ano”, a ela atribuído por uma neta de apenas 15 anos. O título que ela mais aprecia.

Indagada sobre as dificuldades de ingressar no mundo científico, Ada Yonath afirma que existem problemas de gênero em toda sociedade, cuja maioria ainda acredita que as mulheres devem ser destinadas apenas à procriação. E declara com simplicidade: “Há muitas mulheres na ciência hoje em dia. Todos têm dificuldades: a ciência pode ser difícil para homens ou para mulheres. Entendo que a única diferença entre homens e mulheres é biológica: mulheres podem dar à luz. Só isso. Não sou uma militante de gênero”.

Suas outras afirmações encantam: “As pessoas devem fazer o que amam, sem modelos”; “Sou de uma família muito pobre de agricultores de Israel”; “Sempre fui interessada em tudo, era curiosa, gostava de entender processos naturais. … Você faz perguntas interessantes a si mesmo e tenta respondê-las. Isso é fantástico”; “Eu me tornei conhecida e, com isso, posso usar essa notoriedade para estimular jovens para a carreira científica”; “Como orientadora de mestrandos, gosto de ver a carreira acadêmica dos meus orientandos evoluindo”; “Diria aos mais pobres para não desistir. Eu fiz todo o possível para ter dinheiro e continuar estudando: lavei louça e lavei chão”; “Gosto de cozinhar, de nadar, de conversar com crianças e jovens, E amo escrever. Estou escrevendo um romance para mim mesmo, sem qualquer intenção de publicação. As personagens estão em construção. Como eu”.

Tenho uma imensa compaixão pelos que possuem alma pequena. Dos complexados por esse ou aquele motivo, dos que se imaginam corporalmente belos e se desestruturam com as primeiras rugas. Dos que não entendem a concepção moderna de família, refugiando-se num tribalismo hermético. Dos que não sabem rir, sentindo-se sempre coitadinhos e mal amados. Dos que se imaginam libertos, somente porque não prestam mais contas dos seus atos e andanças a companheiros, cônjuges, superiores ou subordinados. Dos que se arvoram de poderosos quando espezinham humildes, de quatro se postando, rabinho entre as pernas, diante dos imediatos superiores.

Aflige-me a incapacidade daqueles que não sabem transformar “coisas invisíveis” em paz e felicidade, nunca assimilando, porque sempre dependentes, que “o inferno é a incapacidade de amar” (Dostoievski), ignorando também, porque ficaram na superficialidade, que foi o próprio Dostoievski quem disse que o único meio de evitar os erros é adquirir experiência, esta somente emergida através dos erros cometidos. E percebo quão infelizes se estão tornando aqueles que não reconhecem, porque portadores de uma portentosa transitividade ingênua, que livrar-se do que não se quer não é equivalente a obter o que se deseja.

Ultrapassados os burburinhos de mais uma temporada junina, as esperanças por um mundo mais humano persistem solidamente plantadas nos corações dos menos desavisados. Sempre antenados com o pensamento de Erich Fromm, autor de Ter ou Ser, um famoso livro de cabeceira de muitos: “Pela primeira vez, na História, a sobrevivência física da espécie humana depende de uma radical mudança do coração humano. Todavia, uma transformação do coração humano só é possível na medida em que ocorram drásticas transformações econômicas e sociais que deem ao coração humano a oportunidade para mudança, coragem e visão para consegui-la”.

Nunca esquecerei que a coragem é a primeira das qualidades humanas, porque é a que garante as outras, frase dita por Aristóteles quatro séculos antes do nascimento da Criança, esse Amor Infinito de quem sou servo apaixonado.

Permanecer no centro do seu ser, ainda é a melhor maneira de se aprender um pouquinho mais. E de apreender derredores, fatos e cenários. Vacinando-se contra a confiança em demasia, a especialização individual excessiva, a rotinização do convívio e a cegueira dos amanhãs.

E sonhar sempre. Sempre com os pés bem plantados e o coração apaixonado, posto que a lição de T.S.Eliot continua contemporârea: “Somente quem se arrisca a ir longe fica sabendo até onde pode chegar”.

(Publicada em 02/07/2012, no Portal da Revista ALGOMAIS, Recife – PE)
Fernando Antônio Gonçalves