AGIR CRIATIVO


Um documento não muito recente despertou a atenção de inúmeros especialistas das Ciências da Administração, incomodando sobremaneira o setor gerencial, onde muitos se imaginam olímpicos e individualistas donos da verdade. A autoria é de James Champy, co-autor do best-seller Reengenharia: Revolucionando a Empresa, que proclama que incontáveis procedimentos administrativos gerenciais se encontram em apuros vários, sufocados pelas mesmices estratégicas e táticas dos que teimam em permanecer agindo como antigamente, no tempo da Jovem Guarda.

Convocando todos para uma urgentíssima reestruturação estratégico-comportamental, James Champy dá especial relevo a três realidades ultra-contemporâneas: a. Nada mais é simples; b. Tudo é questionável; e c. Todos precisam mudar. A primeira indica que os ambientes sociais, empresariais, políticos e religiosos estão se transformando a um ritmo desconcertante, atordoando aqueles que jamais imaginavam os cenários atuais há trinta ou quarenta anos. A segunda realidade ressalta que não basta apenas administrar as mudanças emergentes, mas criar as necessárias mudanças, toda criação requererendo competência, tesão executiva e contemporaneidade decisória, requisitos indispensáveis para uma efetiva enxergância existencial binoculizadora. E a terceira das realidades implica na necessidade de uma acentuada mudança comportamental, com lema geral que bem poderia desde já ser estabelecido: “Do peão ao ‘seu’ Amaral, mudar pra continuar atual”.

A questão tríplice levantada pelo James Champy é o desafio maior de todo Gerente Hoje, que não pretende se ver tão cedo classificado de Gerente Ontem ou de Gerente Anteontem: “A mudança irá além da técnica. Não trata apenas do que os gerentes fazem, mas de quem são. Não aborda apenas sua noção de tarefa, mas sua noção de si mesmos. Não enfoca apenas o que eles sabem, mas como pensam. Não considera apenas a forma como vêem o mundo, mas também a forma como vivem no mundo”.

Que procedimentos um Gerente Hoje deveria adotar, aprofundando a sua profissionalidade, sem receio de estar perdendo esse ou aquele espaço? Baseado nas diretrizes de Champy, listamos alguns questionamentos que possibilitarão reflexões corretivas, capazes de conduzir os atilados para patamares elevados da Administração: 1. Já abandonou seu ideário organizacional perfeccionista para adotar um pensamento radicalmente experimental?; 2. Já deixou para trás a forma “Faça a coisa certa e continue fazendo”, assumindo definitivamente a moderna forma “Faça a coisa certa, e faça cada vez melhor”?; 3. Já relegou seu sentimento de desespero em relação às pessoas, abraçando uma fé nos seres humanos e na crença de que todos estão ansiosos para aprender e que são capazes de dedicação, sentimentos elevados e responsabilidades individuais?; 4. Já permutou a autoridade do cargo pela realidade da autoridade existencial, a autoridade sendo legitimada pela capacidade de sempre executar melhor as atividades programadas?; 5. Já deixou para trás a tirania da responsabilidade numérica, entendendo que a competitividade moderna se encontra respaldada no julgamento do beneficiado?; 6. Já apreendeu as estratégias de apoio que se respaldam na crença de que as coisas melhoram quando as pessoas do seu derredor podem cometer erros, com eles aprendendo para dar o melhor de si?; 7. Já incluiu na sua devoção ao crescimento a redescoberta da devoção ao serviço, fonte de toda criatividade humana?; 8. Já despachou para as quintas do inferno sua forma monista de raciocínio, acostumando-se na utilização cotidiana da forma pluralista de pensar?; 9. Já sacudiu janela afora a sua disciplina empresarial, abraçando o espírito empresarial, com a sua cultura de disposição aprendida e responsabilidade individual?; 10. E, finalmente, já percebeu de forma cristalina que a única forma de controlar é abrir mão do controle?

Já percebia o poeta Fernando Pessoa, lusitano de quem sou admirador de carteirnha, com o seu estupendo faro premonitório, que algo bem mais “solto” que a razão abriria as portas da criatividade, inventando futuros, construindo efeitos diferenciados dos até então moldados, ampliando utopias e assegurando um “gerenciamento” mais eficaz dos riscos assumidos: “Só uma grande intuição pode ser bússola nos descampados da alma”. E mais: “Frutos, dão-os as árvores que vivem, não a iludida mente que só se orna das flores lívidas do íntimo abismo”.

Compete ao Gerente Contemporâneo mobilizar novos comprometimentos empreendedores, desafiando-se cotidianamente para romper com passados que não mais retornarão. Sempre acolhendo os insights criativos sem pestanejar, favorecendo as mudanças, transformando-as num fato mutavelmente consumado.

(Portal da Globo Nordeste, 08.04.2010, Blog BATE & REBATE)
Fernando Antônio Gonçalves