A LA ZARATUSTRA


Para quem desejar entender e pretender agir com mais cidadania crítico-construtiva diante dos acordos estrumados ultimamente celebrados por “lideranças messiânicas”, explicito algumas reflexões inspiradas no livro mais famoso de Friedrich Nietzsche, cujas páginas continuam a desconstruir os simplismos religiosos, políticos, econômicos e sociais contemporâneos. Que também ratificam os cinismos decisórios do atual momento mundial, brasileiro em particular, por aqui o povaréu sendo engabelado com estádios de futebol tomados como amplamente prioritários diante dos indispensáveis saneamento, segurança pública, educação fundamental e preservação do meio-ambiente, que deveriam estar subsidiando soluções diante dos desafios impostos por uma crise mundial que populistas engabeladores chamaram outrora de simples marolinha. Os pensamentos de Nietzsche, abaixo reproduzidos quase integralmente, possuem direcionamentos vários, cabendo aos leitores argutos colocar as carapuças nos eleitos sem contemplação. Ei-los:

“Vi uma grande tristeza invadir os homens, diante de uma doutrina, outrora éticamente compatível com os futuros pátrios, agora expandida sob a crença de que tudo é vão, tudo é igual, tudo passará, pois o próprio fogo está cansando, dando vez a posturas nunca socialmente comprometidas.

Na vida política, fonte de múltiplas esperanças libertadoras, onde bebe a canalha tudo fica contaminado. A canalha envenena os ideários mais puros, explicitando falsas alegrias nos seus propósitos mais imundos, ressecando árvores frutíferas que se imaginavam preparadas para fornecer flores e frutos para redentoras caminhadas. E que continuam teimando em não compartilhar com a canalha a fonte, a chama e o sentimento edificados ao longo dos anos, principiado bem antes da chamada golberiana abertura política. A continuarem mantendo muito amarga, nas entranhas, uma insuportável perspectiva convivêncial com posturas, vestidos, afagos e promessas dos fingidos e amacacados, eternos sanguessugas da soberania nacional.

Como os líderes que ensinaram a bendizer, anestesiados por três grande males – a voluptuosidade, o desejo de domínio e o egoísmo – forçaram o alto libertário a dobrar-se, quando ele poderia erguer ainda mais o que já estava historicamente sendo consolidado? A explicação é por demais simples: quando algumas lideranças se julgam sábias, diante da suas pequenas verdades feitas de raciocínios individualistas e mesquinhos, as suas falaciosas sabedorias exalam o odor dos charcos, neles apenas sendo identificadas o coaxar de fétidos sapos.

Que eternamente sejam considerados vis todos aqueles que só podem escolher entre duas alternativas, tornando-se animais ferozes ou ou revivendo ferozes domadores de animais, nunca assimilando a lição maior que não quiseram ver: a de que não se aprende a voar ao primeiro alçar das asas. E que subestimaram as manhas dos canalhas, que saberão muito bem moê-los bem miudinho, reduzindo-os à branca poeira das lajes tumulares pouco visitadas. Pois eles são muito hábeis, de dedos destros, que sabem bem ultrapassar as simplicidades dos idealistas com suas complexidades apologéticas acerca de estratégias que jamais beneficiarão os trabalhadores de sempre.

Nas caminhadas dos acordos bastardamente construídos pelos arroteiros messiânicos, os legítimos militantes dos ontens edificados com muita bravura e inúmeras mortes sentirão repugnâncias insuportáveis diante das demagogias proclamadas nos horários da propaganda eleitoral, imundiçando ideários e diálogos comunitários decentemente arquitetados.

Que não se misturem os de bons propósitos com as tarântulas que asfixiam doutrinas e sonhos coletivos, especializadas em caluniar a vida dos mais simples e de queimar os heréticos que delas discordarem.

É difícil calar-se diante dos esganadores da dignidade nacional. Mas os joelhos jamais se dobrarão diante da canalha conjunturalmente triunfante. O caminho continuará a se fazer andando, na busca sempre progressiva de traves que sirvas de freio aos reacionários lobos travestidos de cordeiros”.

Imaginemos o pensar irritado do Zaratustra nos tempos de agora e façamos as nossas deduções. O caminha se faz andando e as bestas jamais triunfarão, no último capítulo.

(Publicada em 25/06/2012, no Portal da Revista ALGOMAIS, Recife – PE)
Fernando Antônio Gonçalves