1561 – MANDAMENTOS DE UM CAMINHEIRO


Quando Castro Alves – o mais belo espetáculo de juventude e de gênio que os céus da América presenciaram, no testemunho de Jorge Amado – escreveu A Cruz da Estrada, em 1865, no Recife, ele buscava reverenciar um escravo morto pela estupidez de então, encarecendo aos passantes que deixassem a marca da sepultura em paz dormir na solidão1. Sua poesia bem que poderia, hoje, ser uma excelente bússola para os profissionais de todas as idades e especialidades. Estes, atônitos, ainda não perceberam a chegada de um século fascinante e cruel, conforme definição de Henrique Iglesias, presidente do BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento. E ainda não prestaram a devida atenção aos mandamentos que necessitam ser apreendidos pelos que desejam preservar sua trabalhabilidade por longo tempo:

1. Nunca critique à toa, sempre busque colaborar. Toda colaboração resulta na ampliação da profissionalidade do colaborador, posto que quem ajuda também aprende, inúmeras vezes apreendendo mais que o lado beneficiado.

2. Nunca se omita, sempre participe. Não se solidarize com as posturas dos três macaquinhos chineses2, percebendo que a parábola dos talentos3, transmitida pelo Homão da Galileia4, tem uma descomunal força sementeira.

3. Mantenha suas relações no melhor nível possível. Nunca feche definitivamente uma porta, nem jamais apregoe desta água não beberei, pois o amanhã pode nos reservar surpresas nunca dantes imaginadas. Cervantes já dizia, pela boca do Dom Quixote, que quem perde sua coragem, perde tudo. Acautele-se contra os azedumes, distanciando-se dos sisudos demais, que contaminam com muita facilidade. Mantenha-se sempre vivo, situado e datado.

4. Resolva os seus problemas e os do seu trabalho com serenidade comportamental. Cuidado com os PLs (porras-loucas) e os PTs (picas-tontas), que oferecem soluções doidivanas, que terminam por asfixiar tudo e todos, nada resolvendo.

5. Nunca haja como PC (piolho de cu). Afaste-se dos que enxergam defeitos mil em tudo. Busque ser moralizador, jamais moralista, nunca esquecendo o que proclamava Dom Hélder Câmara, o sempre amado e jamais esquecido arcebispo de Olinda e Recife: até um relógio parado tem razão duas vezes ao dia.

6. Nunca abandone seu barco. Amplie culturalmente sua mente, preservando sempre a sua individualidade, sem descambar para os individualismos pernósticos, inevitavelmente autofágicos.

7. Nunca se deixe levar pelos extremismos, posto que “in medium virtus est”, já proclamava os antigos.

E jamais esqueça que toda a beleza corporal, com seus mil e um remendos plásticos, passa com muita rapidez, apenas sendo eterno o verdadeiro EU de cada um.


Fernando Antônio Gonçalves é pesquisador social