1559 – LEITURAS RECONSTITUINTES


Certa feita, num dos seus livros famosos, A Civilização do Espetáculo, o escritor peruano Mário Vargas Llosa assim se expressou nas primeiras linhas: “É provável que nunca na história tenham sido escritos tantos tratados, ensaios, teorias e análises sobre a cultura como em nosso tempo. O fato é ainda mais surpreendente porque a cultura, no sentido tradicional dado a esse vocábulo está prestes a desaparecer em nossos dias. E talvez já tenha desaparecido, discretamente esvaziada de conteúdo, tendo este sido substituído por outro, que desnatura o conteúdo que ele teve.”

Lamentavelmente, o NCP – Nível de Criticidade Propositiva da atual população brasileira está muito abaixo de um mínimo indispensável, com inúmeros hipnotizados por leituras idiotizantes, adquiridas pelos que persistem em permanecer distanciados de uma realidade contemporânea. O premiado economista sueco Gunnar Myrdal (1898-1987), autor do notável livro Teoria Econômica e Regiões Subdesenvolvidas, já proclamava, em palestras proferidas nos quatro cantos do mundo, que “o pior subdesenvolvimento é o mental.” E o atual progresso tecnológico mundial está contribuindo para a ampliação de uma não-cognitividade crítico-analítica da maioria dos seres humanos, favorecendo o crescimento de um “espírito de manada” planetário, salvo as exceções que teimam em ampliar o saber dos mais jovens.

Com o atual sistema educacional brasileiro prioritariamente direcionado para resultados eleitoreiros, o ideário de Paulo Freire apenas está sendo considerado como mais um dos talentos brasileiros passados. O ensino robotizando mentes e corações infanto-juvenis, especializando a grande maioria em saber apenas como apertar teclados e fazer cálculos aritméticos primários em calculadoras que desnecessitam dos neurônios sementeiros dos educandos.

Sem menosprezar o atual crescimento tecnológico, urge um gigantesco incentivo às leituras que erradiquem três sinais que muito estão nos asfixiando como sociedade: a perversidade, a futilidade e a ameaça, além de uma espiritualidade sem substância, de muita encenação midiática, sem levar em conta os clamores e dúvidas de uma sociedade gradativamente desesperançada que ainda acredita que religião não causa violências, cada crença puxando a brasa para suas sardinha, pouco se importando por uma consistente fraternidade mundial.

De muita urgência, um sistema educacional mundial integrado se faz indispensável, favorecendo uma reconstrução cognitiva planetária, com sólidos conhecimentos humanístico-tecnológicos, justificando uma advertência do nunca esquecido economista paraibano Celso Furtado: “o quadrado da hipotenusa é a soma dos quadrados dos catetos. Mas será que o triângulo é retângulo?

Para todos, duas leituras extremamente oportunas. A primeira: A GRANDE NARRATIVA: INTRODUÇÃO À HISTÓRIA DO NOSSO TEMPO, Johann Chapoutot, Petrópolis RJ, Editora Vozes, 2023, 415 p. A segunda: CRISTIANISMO À PROVA, Rebecca McLaughlin, Rio de Janeiro, Thomas Nelson Brasil, 2024, 288 p. Duas leituras que se imbricam num contexto mundial que ainda teima em buscar uma convivialidade amplamente libertadora para todos os Filhos Amados pensantes do Criador, semeadores de amanhãs pacíficos, sem ódios, agressões bélicas, racismos, machismos, antissemitismos e outros ismos ruinosos.


Fernando Antônio Gonçalves é pesquisador social