1524 – UMA BÍBLIA SEM PRECONCEITOS


Encareço a atenção dos irmãos espiritistas e espiritualistas para uma afirmação contida no item 3 do Capítulo XXIII do livro O Evangelho Segundo o Espiritismo, escrito por Allan Kardec em 1864, intitulado Estranha moral. Reproduzo-a o texto abaixo:

Certas palavras, aliás muito raras, atribuídas ao Cristo, fazem tão singular contraste com seu modelo habitual de falar que, instintivamente, se lhe repele o sentido literal, sem que a sublimidade da sua doutrina sofra qualquer dano. Escritas depois de sua morte, pois que nenhum dos Evangelhos foi redigido enquanto Ele viveu, lícito é acreditar-se que, em casos como este, o fundo do seu pensamento não foi expresso, ou, o que não é menos provável, o sentido primitivo, passando de uma língua para outra, há de ter experimentado alguma alteração. Basta que um erro se haja cometido uma vez, para que  os copiadores o tenham repetido, como se dá frequentemente com relação aos fatos históricos.” E Kardec dá como exemplo o termo odiar na frase do Evangelho de Lucas, que diz ”se alguém vem a mim e não odeia a seu pai e a sua mãe”, como prova cabal de um não-dizer do Nazareno.

Uma pesquisa feita por especialistas do Seminário de Jesus, fundado na Califórnia pelo teólogo Robert Walter Funk (1926-2005) chegou a uma conclusão que está a merecer amplas meditações conclusivas: “Apenas 18% do total de palavras e apenas 16% das ações atribuídas a Jesus nos Evangelhos ‘podem’ ser realmente consideradas autênticas, ou seja, aproximadamente 82% das palavras e 84% das ações atribuídas a Jesus não são verdades históricas, mas crenças cristãs.”

Recentemente, a leitura de um relato escrito por um talento feminino hebraico me eixou convicto da intenção positiva do Papa Francisco de instituir Comissão Especial para uma edição do Novo Testamento, dele sendo extraídas as expressões não condizentes  com o pensar amoroso e sem preconceitos de nenhuma espécie do filho hebreu de Maria e José, enviado pelo Criador para promover a regeneração integral e definitiva de povos e nações, respeitadas integralmente as demais crenças, povos e nações, etnias e gêneros.

O livro por mim lido: DECIFRANDO AS PALAVRAS DIFÍCEIS DE JESUS: UM GUIA PARA DESVENDAR OS ENSINAMENTOS MAIS SURPREENDENTES DO FILHO DE DEUS SOB A ÓTICA DO JUDAÍSMO, Amy-Jill Levine, São Paulo, Hagnos, 2022, 207 p. A autora é professora de Estudos sobre o Novo Testamento e Estudos Judaicos na Universidade Vanderbilt, USA. É investigadora e autora de diversos livros sobre o tema do Jesus histórico, entre os quais o acima citado. Foi a primeira judia a ensinar Novo Testamento no renomado Pontifício Instituto Bíblico de Roma, tendo sido, em 2021, eleita para a Academia Americana de Artes e Ciências.

Chamo a atenção dos irmãos e irmãs leitores (as) para alguns textos do Novo Testamento que revelam uma urgente reapresentação escritural, favorecendo uma maior fraternidade em toda área monoteísta. Ei-los: Ef 6,5-8; Mc 10,44; Mt 10, 5b-6; Mt 28, 19; Mt 25,30; Jo 8,44; Ap 2,9; e Ap 3,9.

Para quem busca ler as frases originais do Homão da Galileia, sem os preconceitos e desprezos para os não-acompanhantes do Nazareno, recomendo o livro acima, que muito restaurará a veracidade das lições transmitidas pelo Galileu que tanto amamos, como espiritistas que somos.

Sejamos cristãos, sem perseguições odiosas, sem complexos nem obsessões, fraternais com todos, sem distinções de nenhuma espécie, todos nos considerando filhos amados de um mesmo Criador do Todo.


Fernando Antônio Gonçalves é pesquisador social