1516 – PENSANTES PARA UMA ERA RADIANTE
Impressiona-me bastante a quantidade de cristãos desatentos ao que escreveu o Apóstolo Paulo na Primeira Carta aos Coríntios. Reproduzo: “Quando eu era criança, falava como criança, sentia como criança e pensava como criança. Agora que sou adulto, parei de agir como criança” (1Cor 13, 11). Preocupa-me muito a quantidade de irmãos/irmãs possuidores de ingenuidade infantil, recusando ser possuidores de uma criticidade cidadã adulta, nunca se postando como uma metamorfose ambulante diante das complexidades de uma pós-modernidade, como proclamava Raul Seixas, aquele menestrel saudoso que anda fazendo uma falta danada entre nós.
Entretanto, nada de desesperanças na semeadura de novas pensações orientadoras nos quatro cantos do planeta, a favorecer novas enxergâncias crítico-construtivas nos ambientes de uma pós-modernidade ainda indefinida, repleta de positividades fantásticas e negatividades que ainda humilham bastante milhões de seres humanos nossos irmãos, também filhos de um mesmo Criador.
Tenho uma admiração profunda pelos notáveis que não menosprezam suas estruturas humanísticas e suas crenças religiosas, ainda que não-institucionais e aparentemente desconcertantes, mesmo dotados de uma sólida bagagem científica. O físico Albert Einstein e o poeta Fernando Pessoa integram a comissão-de-frente de um grupo que ampliou a minha capacidade de continuar acreditando na fraternidade universal e na transcendentalidade da espécie humana.
Certa feita recebi uma carta desesperançada de amigo muito querido, inteligência acima da média. Em determinado trecho da correspondência, ele dizia: “Estou muito cansado, muito cansado mesmo e nada mais que venha da Vida ou de Deus me importa.”
Mesmo amando fraternalmente os desiludidos, posto que gosto de ser solidário com os que estão down, em Einstein, encontrei uma explicação parcial da apatia existencial revelada na correspondência. Diz o Nobel de Física, inteiramente despido dos orgulhos e imodéstias dos pouco densos:
“O mistério da Vida me causa a mais forte emoção. Este sentimento suscita a beleza e a verdade, cria a arte e a ciência. Se alguém não conhece este sentimento ou não pode mais experimentar espanto ou surpresa, já é um morto-vivo e seus olhos se cegaram. Aureolada de temor, é a realidade secreta do mistério que constitui também a religião… Deste modo e somente deste modo, sou profundamente religioso.”
Na atualidade brasileira, vale o alerta do especialista Gabriel Perissé, também educador de primeira:
“Um dos maiores desafios da educação no século XXI está em formar e atualizar nossos professores, especialmente no que diz respeito à sua formação continuada. Além da formação inicial e da experiência própria, é necessário que todo docente reflita com frequência sobre sua prática cotidiana e que entre em contato com leituras que o ajudem a se aperfeiçoar como ser humano, cidadão e profissional.” (IN: EDUCAÇÃO E ESPIRITUALIDADE, Gabriel Perissé, Belo Horizonte MG, Autêntica, 2022, 122 p.)
Já o poeta luso Fernando Pessoa, possuidor de “uma religiosidade não definida e visionária, de um acontecer mítico cuja significação se inscreve fora dos próprios acontecimentos em que se exemplariza”, segundo a ensaísta Maria Aliete Galhoz, nos legou inumeráveis momentos de muita fidelidade, no seu modo de ver e sentir a Criação. Ele, que morreu quase totalmente ignorado pelo público lisboeta, que se extasiava, à época, com textos de inteligibilidade quase primária da lírica de então, escreveu um dia:
“Tivesse quem criou / O mundo desejado / Que eu fosse outro que sou / Ter-me-ia outro criado.” … “Sejamos simples e calmos, / Como os regatos e as árvores, / E Deus amar-nos-á fazendo de nós / Belos como as árvores e os regatos, / E dar-nos-á verdor na sua primavera, / E um rio aonde ir ter quando acabemos!” … “Anjos ou deuses, sempre nós tivemos, / A visão perturbada de que acima / De nós e compelindo-nos / Agem outras presenças.” … “Quanto mais alma ande no amplo informe, / A ti, seu lar anterior, do fundo / Da emoção regressam. Ó Cristo, e dormem / Nos braços cujo amor é o fim do mundo.”
Para todos os cristãos desejosos por mais pensação crítica, recomendo uma leitura que muito revigorou meus interiores relacionais com o Criador: TEOPOÉTICA: PROVOCAÇÕES DE UM PASTOR CONECTADO, Ricardo Gondim, São Paulo, Editora Recriar, 2021, 192 p.
E como professor que fui com muito orgulho, continuo ratificando nos meus escritos o pensar do saudoso educador Paulo Freire, sempre lembrado e nunca reinventado:
“Minha fé não é imobilizante, estar nela é mover-me, é engajar-me em formas de ação coerente com elas.”
Sem jamais associar docência com traficância, como ruminantemente afirmou, dias atrás, um deplorável parlamentar do nosso Congresso Nacional, que ainda pode um dia ruminar.
Fernando Antônio Gonçalves é pesquisador social