1499 – RELIGIÃO E DEMOCRACIA
Outro dia, li no Google um texto que muito me incentivou a ler um pouco mais sobre o tema do título acima. Eis o texto lido:
“A liberdade de crença ao fanatismo que ameaça as liberdades
Os Estados modernos criaram mecanismos políticos para assegurar as liberdades individuais, incluindo a religiosa. Os princípios da tolerância e laicidade foram conquistados em diferentes instantes e processos históricos.
A autonomia da esfera privada, que marca as questões de fé, e, ao mesmo tempo, a ampliação das ações públicas que, por exemplo, limitariam o poder das religiões em temas como educação, saúde pública ou temas culturais, armaram um histórico de contínuas tensões. No cerne do Estado moderno está a tensão entre a autonomia das escolhas e a condução dos destinos coletivos.
Excetuando-se os estados autoritários, que negam a liberdade religiosa, ou os teocráticos, que negam a autonomia da vida política, há impasses profundos entre religião e política nas sociedades atuais. No Brasil, um desses campos de disputa é a discussão sobre a teoria de gênero. A filósofa Judith Butler foi alvo de protestos em sua recente passagem por São Paulo. A menção a fogueiras inquisitoriais é reveladora dos obscurantismos e dos riscos embutidos na suposta liberdade de expressão dos que defendem doutrinas que negam os princípios da laicidade.
A opinião pública forma-se por elementos complexos e até mesmo contrários ao respeito e à dignidade das pessoas. A pluralidade e a convivência entre grupos sempre serão ameaçadas, se algum grupo se considerar acima do bem e do mal, se algum grupo se afirmar como porta-voz de uma verdade suprema ou iluminada, seja de matriz religiosa ou política.
Os messianismos são uma verdadeira ameaça à convivência dentro de um Estado plural. Quando esses messianismos se convertem em ódio e ultrapassam as fronteiras da legalidade ressurgem os velhos demônios que estão disponíveis para queimar todos os que são diferentes. Como as mulheres acusadas de bruxaria, estamos vulneráveis diante da insensatez dos que, em nome de uma moral ressentida, querem por fim à convivência entre pessoas com hábitos, práticas, crenças e visões de mundo diversas.
A tensão entre a política e a religião só poderá ser dissipada se os limites e o respeito entre seus campos de atuação forem firmemente respeitados.”
O texto acima cita a teórica feminista americana Judith Butler, que em novembro de 2017, quando opositores da chamada “ideologia de gênero” atearam fogo a uma boneca da teórica em frente ao Instituto de Arte Sesc Pompeia, em São Paulo, quando ela ministrava uma palestra no auditória do Instituto. A boneca era um protótipo de bruxa e foi queimada por católicos e protestantes conservadores aos gritos histéricos de “Queima bruxa!”, numa demonstração inequívoca dos furores praticados durante a Inquisição, que inclusive assassinou a francesa médium Joana D’Arc.
Orientado por amigos especialistas, adquiri, e muito recomendo sua leitura, o livro Religião e a Democracia Brasileira: dos bancos das igrejas para as urnas, Amy Erica Smith, Petrópolis RJ, Vozes, 2023, 389 p., cuja autora possui doutorado em Ciência Política pela University of Pittsburgh, sendo atualmente docente da Iowa State University, especializada em investigações sobre Cidadania, Democracia e Religião, com foco da América Latina.
A orelha do livro revela seu objetivo: “Este livro contribui para os estudos sobre religião e política comparadas, sintetizando abordagens em vários domínios, tanto da oferta quanto da demanda. E demonstra como a política praticada por determinados setores cristãos estabiliza a democracia brasileira, ampliando suas representações no Congresso Nacional.”
Uma leitura que muito desabestalhará todos aqueles que se imaginam “apolíticos”, como se existisse sociologicamente esse tipo de comportamento proclamado pelos idióticos sem pensação.
Já dizia um religioso asiático famoso: “Quem sabe pensar, sabe conviver com contrários. Os que não pensam, caminham sem esperanças, apenas acordando todas as manhãs sem objetivos exequíveis.”
Saibamos Esperançar com racionalidades objetivas, propositivas e sempre positivamente enxergantes!
Fernando Antônio Gonçalves é pesquisador social