1477 – COMO SEGUIR UM JESUS LIBERTÁRIO
Encarecemos uma meditação serenamente binoculizadora para as seguintes citações: A primeira: “A Bíblia pode ser usada – e já o foi inúmeras vezes – para legitimar sistemas de opressão e múltiplas violências. Essa mesma Bíblia, contudo, inspirou e inspira práticas de amor, solidariedade e profunda entrega à humanidade. É fundamental que consigamos retomar esse olhar.” A segunda: “Dedico este livro aos irmãos e irmãs da minha comunidade de fé, a Igreja Batista do Caminho. Sou fruto dessa construção pastoral, teológica, comunitária e militante. Desde 2009 caminhemos juntos, buscando dat testemunho da beleza da mensagem de Jesus. Sinto-me acolhido, compreendido e impulsionado por essa amada tarefa. Posso dizer com alegria que amo nossa comunidade de fé!”
As citações acima estão num livro que muito diferencia algumas comunidades evangélicas dos proselitismos idióticos ruminantes que infestam o atual período de campanha eleitoral, com mensagens que enojam os sensatamente críticos espiritualistas e espiritistas de todos os quadrantes brasileiros, que buscam recriar o compromisso do Nazareno para com os menos favorecidos, na construção de um mundo mais justo e digno para todos. Num ambiente terrestre sem preconceitos, em favor da vida plena para todos, com solidariedade e fraternidade integrais, cuidando da Terra com afeto cósmico, sem aprisionamentos de qualquer natureza.
O livro: JESUS DA GENTE: UMA LEITURA DA BÍBLIA PARA OS NOSSOS DIAS, Pastor Henrique Vieira, Rio de Janeiro, Objetiva, 2022, 126 p. Um livro escrito por quem acredita que o cristianismo se distanciou bastante das mensagens do Evangelho de Jesus, não levando na devida conta os atuais movimentos evolucionários da teologia da libertação, da teologia negra, da teologia feminina e de uma leitura popular das Escrituras Sagradas, do Novo Testamento em particular.
O prefácio do livro acima é de um teólogo muito respeitado, autor de um livro que já se encontrava na 21ª. Edição em 2012: JESUS CRISTO LIBERTADOR: ENSAIO DE CRISTOLOGIA CRÍTICA PARA O NOSSO TEMPO, 21ª. ed., Leonardo Boff, Petrópolis RJ, Vozes, 2012, 351 p. Um autor de mais de 70 livros, onde um deles, Ecologia, grito da terra, grito dos pobres, foi considerado em 1977, no Estados Unidos, como um dos três livros publicados naquele ano que mais favoreciam o diálogo entre ciência e religião. Um prefácio que ressalta a fundação pelo Pastor Vieira da Igreja Batista do Caminho, “que se caracteriza por um profundo resgate da gesta de Jesus de Nazaré, um Jesus como a gente, que pouco tem a ver com o Jesus adorado pela principais Igrejas: um Jesus Deus, cercado de pompa e glória como como convém a um Deus. Sem negar que seja Deus, acaba se esquecendo o que de especial da fé cristã está tão bem formulado por São Paulo na Epístola aos Felipenses 2,6-7.”
Bem apetrechado teologicamente, o Pastor Henrique Vieira ressalta em seu livro como Jesus-gente se apresentava nas estradas poeirentas da Palestina, proporcionando o bem a todos, abrindo os olhos dos que O ouviam, nunca sendo olvidados os dizeres do salmo 23, que diz como o Senhor renova forças e guia todos pelos caminhos certos, como Ele prometeu, ainda que andemos por vales muito escuros, sem medo de nada. E ainda reproduz, o Pastor Vieira, os versos inesquecíveis do poeta Thiago de Mello, no seu Já faz tempo que escolhi: “A luz que me abriu os olhos / para a dor dos deserdados / e os feridos de injustiças / não me permite fechá-los / nunca mais enquanto viva”.
No prefácio, Leonardo Boff concorda plenamente com o Pastor Vieira, quando ele afirma em seu livro dotado de muito caráter pedagógico: “Jesus foi preso, torturado e executado pelo Império Romano, entregue por líderes religiosos articulados com aquele poder imperial. Três séculos depois, o movimento que Jesus havia criado se tornou a religião oficial do mesmo Império que o matou.” E conclui: “O fato que é que o cristianismo se afastou da mensagem do Evangelho de Jesus.”
O livro do Pastor Henrique Vieira deve ser lido, relido, amplamente rabiscado e intensamente debatido nas comunidades brasileiras menos favorecidas. Saibamos transmitir suas lições memoráveis em todas as comunidades e redes sociais, esclarecendo os mais desatentos que toda fé é política, como é amplamente analisado no capítulo 7 do livro do pastor. Que traz uma advertência do famoso Pastor Martin Luther King, contida no livro Um apelo à consciência, Clayborne Carson & Kris Shepard (orgs), Rio de Janeiro, Zahar, 2006: “Eu não quero passar a impressão de que será fácil. Nenhuma grande conquista social será feita sem perdas individuais. Mas se a morte física é o preço que teremos que pagar para libertar nossos filhos e nossos irmãos brancos de uma eterna morte psicológica, então nada poderá ser mais redentor.”
Saibamos ampliar nossa BCC – Binoculização Crítica Cristã, sempre batalhando por Igrejas Libertárias, livres das acomodações impostas por mentores nada evangelizadores.
Fernando Antônio Gonçalves é pesquisador social