1452 – A ARTE DA PRUDÊNCIA


Decididamente, nos últimos tempos, a sociedade brasileira, através dos seus setores midiáticos, tem presenciado um festival de besteiras de grosso calibre, tudo explicitado como procedimentos da pós-modernidade. Aplaudo notáveis inteligências  da sociedade brasileira, deplorando muito uma penca de baboseiras que tem sido a bandeira maior de entrevistados e entrevistadores. Parabenizo de público os talentos brasileiros, técnico-científico-cultural consistentes, dotados de esplêndidos  poderes analíticos, que muito dignificam o Brasil nos quatro cantos do mundo.

A criticidade sadia, instrumento do mais alto nível civilizatório, merece um tratamento mais respeitoso da parte daqueles que se metem a cavalo do cão, paletó e gravata a serviço de uma imbecilidade humana que de há muito já deveria estar defenestrada dos nossos mais diferenciados meios.

Tudo faz crer que um cenário muito acinzentado está sobrepairando a nação brasileira desde os últimos anos, desfavorecendo nosso caminhar civilizatório. Tudo muito agravado nos recentes dois anos por uma pandemia assassina que barbaramente atrofiou os canais do nosso desenvolvimento pátrio.

Há mais de duzentos anos, um jesuíta chamado Baltasar Gracián, escreveu um bocado de aforismos, intitulando-os de A ARTE DA PRUDÊNCIA. Recentemente reeditado no Brasil pela Sextante, com um prefácio de Domenico de Masi, o livro é composto de cento e cinquenta aforismos plenamente atuais, como se tivessem sido escritos para os pocotós e as eguinhas daqui, todos eles com os respectivos currículos situados abaixo da linha de cintura.

Para que não se pense, abestalhamente, que o livro do Gracián é rabisco da época dos dinossauros, ressalte-se: os seus aforismas cativaram talentos notáveis como o psicanalista Jacques Lacan, o filósofo Nietzsche, o irônico Voltaire, hoje sendo consulta contínua nas bibliotecas do mundo inteiro, pela juventude não-pocotó, tampouco rabolátrica e ruminante.

Segundo Domenico de Masi, os aforismas de Gracián foram escritos “com o intuito de  oferecer aos homens e mulheres do seu tempo um guia para ajudá-los a se desemaranhar nos labirintos das intrigas, das dúvidas e das maledicências cotidianas”. Um método salutar de não resvalar para o cometimento de imbecilidades que descidadanizam comunidades, evitando a classificação de mané, peidão, arroz, arame-liso, prego, bucha e péla-saco, conforme a nova gíria carioca, reproduzida em número recente da revista Carta Capital.

O trabalho de Gracián busca educar o ser humano na sua plenitude moral, religiosa, social e política. Alguns deles explicito aqui, a carapuça caindo na cachola de quem desejar:

– “Os tolos erram porque não pensam”.

– “O que importa não é receber aplausos na entrada, mas na saída”.

–  “Ocupar-se dos erros dos outros é sinal de que a própria reputação está arranhada”.

– “É tolice ter o coração atormentado por um assunto que não lhe diz respeito e que nem sequer toca a quem lhe importa”.

– “Não se vive de um só critério, nem de um só costume, nem de um só século”.

Ler Baltazar Gracián aos pouquinhos é um exercício salutar para se ampliar cidadania x criticidade,  jamais se deixando levar pelos disse-me-disses dos ananicados de todos os matizes. Os aforismas do jesuíta nascido em 1601, numa província de Saragoça, Espanha, nos permitem adquirir consciência do que foi dito por Gilberto Freyre, reproduzido por Masi, na apresentação do livro: “Se depender de mim, nunca ficarei plenamente maduro, nem nas idéias, nem no estilo, mas sempre verde, incompleto, experimental”.

  1. Parabenizo efusivamente a todos aqueles aprovados no ENEM,. Que suas vitórias se multipliquem pela vida afora, sem euforismos bobos nem pabulagens desnecessárias. Nunca ficando despercebidos dos incentivos da Criação, nos seus caminhares de profissionais sempre em construção evolucionária.

Fernando Antônio Gonçalves é pesquisador social