1444 – GARIMPAGEM SILVÍNICA


Quase não reconheço o João Silvino da Conceição na reportagem da televisão que filmava a multidão que assistia, na Praia da Boa Viagem, a pirotecnia sem barulho que comemorava a chegada de 2022. Com duas loiras geladas já devidamente emborcadas goela abaixo, ele remexia uma sacola repleta de recortes de jornais, revistas e outros trecos, todos contendo pitacos e anotações das mais variadas modalidades. Sem nenhum esforço, encareci dele pelo zapzap que me enviasse os apontamentos, o que recebi logo na manhã do sábado, dia primeiro de janeiro.  Com auxílio da Sissa, sempre atenta, escolhi algumas anotações silvínicas, para explicitá-las neste JBF famoso, sem nem um pingo a mais.  Eis uma amostra para um janeiro de muita solidariedade para com as comunidades vitimadas pelas enchentes brabosas, pela Covid-19 e pela Influenza, para não falar das besteiradas fétidas cometidas por dirigentes públicos de alto escalão, alguns negativistas escondidamente vacinados:

  1. Gosto de pessoas alpinistas, prontas para novas escaladas, que possuem um sistema operacional mental que sabe bem como ultrapassar obstáculos. Na razão inversa, abomino os que cerebralmente já se aposentaram, abandonando impulsos fundamentais básicos, tornando-se azedos, sem mais qualquer resistência, integrantes de manadas.
  2. Para quem deseja distinguir mito e realidade na vida de Jesus de Nazaré, recomendo o livro do jornalista Juan Arias, da Objetiva. Frequentador assíduo do Vaticano por mais de uma década, sua reportagem é leitura obrigatória para fiéis e agnósticos, desabestalhando os primeiros e abalando as convicções dos demais. Imperdível leitura.
  3. Outro dia, nos classificados de um jornal sulista, encontrei um anúncio: “Mimi, lindíssima, irresistível, seios fartos, bumbum generoso, corpo escultural, nível universitário, poliglota, educadíssima e supercarinhosa. Tenho tantas qualidades que nem sei por que é que fui virar puta”. E me perguntei até quando  nossas elites desconhecerão que existem outros lados?
  4. Não consegui descobrir para quem foi destinada a carapuça da letra de música cantada num mega evento: “Eu só peço a Deus / Que a injustiça não me seja indiferente / E se um só traidor / Tem mais poderes que um povo / Que esse povo não se esqueça dele facilmente”.
  5. Aprecio a Campanha do Quilo, promovida pelos meus irmãos kardecistas. Principalmente pelas mensagens distribuídas. Eis uma delas, oportuníssima para 2022: “Fácil amontoar, difícil distribuir. Fácil falar, difícil fazer. Fácil reprovar, difícil compreender. Fácil crer, difícil discernir. Fácil sofrer, difícil aproveitar”. Um recado de bom tamanho para um bocado  de farofeiros metidos a cristãos falantes e a outros tantos socialites sem ontens, todos sentindo-se coitadinhos em um mundo que não os compreende, segundo eles próprios proclamam.
  6. O Fernando Pessoa é mesmo um arretado tampa de foguete. O que ele escreveu nos primeiros anos 1900 continua válido nos umbrais deste novo ano de 2022: “Para vencer – material e imaterialmente – três coisas definíveis são precisas: saber trabalhar, aproveitar oportunidades e criar relações”. Pra lá de ótimo esse portuga de proféticas reflexões!
  7. Para quem se acha cobra criada na política estadual, mal se cabendo num papel de minhoca lamurienta, o questionamento de um espanhol famoso: “Como é possível as rãs discutirem sobre mar, se nunca saíram do charco?” Um baita pontapé na bunda de muitos!
  8. O César Ferreira, o Gatão, pedinte paraplégico de um campus universitário, para os abilolados do terceiro grau de lá: “Dinheiro que nem vocês tenho não, embora paixão de viver, que vocês desconhecem, tenho demais”. Gatão sabe, aos 28 anos, que navegar é preciso, muito embora viver não seja de modo algum.
  9. Para alegria geral, o papa Francisco disse, no Natal passado, que o nome de Deus não pode ser usado para a prática de violências. Que se recolham às estrebarias os descendentes da Santa Inquisição, os que se utilizam de posturas pastorais opressoras e os todo-pequenos que se vestem de capatazes de Jesus, quixotes grotescos em seus mundinhos de bosta.
  10. Ano eleitoral de 2022 não pode tornar-se refém de manifestações esculhambatórias dos que buscam aparecer de qualquer maneira, até de intestino entupido. Atividade política é luz que esclarece, mobiliza e faz crescer, jamais produto de chiliques fuxicosos e denúncias histéricas. Estas, sem criatividade nem comprovação, revelam apenas uma ânsia de aparecer, típica das mentalidades quengadas.

Fernando Antônio Gonçalves é pesquisador social