1418 – LÍDERES E MEGANHAS


Costumo diferenciar bem das lideranças, tenham elas qualquer nível de escolaridade, os embostalhados mentais que, embromadores de carteirinha, fingem que comandam, ainda que noticiem alta envergadura, algumas delas conferidas por algumas “instituições”.

O inesquecível Gilberto Freyre chamava de PhDeuses os que se imaginavam tampa de foquete, mal passando de rabos de galinhas semimortas.  E foi para os “notabilíssimos de araque” da sua época, tenho quase certeza, que Fernando Pessoa – um muito antenado que ainda será, um dia, devidamente melhor aclamado pelos seus irmãos de Língua Portuguesa – redigiu o Poema em Linha Reta, aqui transcrito na íntegra:

Nunca conheci quem tivesse levado porrada. / Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo. / E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil, / Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita, / Indesculpavelmente sujo, / Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho, / Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo, / Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas, / Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante, / Que tenho sofrido enxovalhos e calado, / Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda; / Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel, / Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes, / Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar, / Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado / Para fora da possibilidade do soco; / Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas, Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo. / Toda a gente que eu conheço e que fala comigo / Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho, / Nunca foi senão príncipe – todos eles príncipes – na vida… / Quem me dera ouvir de alguém a voz humana / Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia; / Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia! / Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam. / Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil? / Ó príncipes, meus irmãos, / Arre, estou farto de semideuses! / Onde é que há gente no mundo? / Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra? / Poderão as mulheres não os terem amado, / Podem ter sido traídos – mas ridículos nunca! / E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído, / Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear? / Eu, que venho sido vil, literalmente vil, / Vil no sentido mesquinho e infame da vileza”.

Se eu pudesse, abraçaria os que se sentem ingenuamente líderes, muito mal se apercebendo meganha, recomendando com toda sinceridade a cada um: seja menos burocrata, menos carimbológico, menos criador de projetos inócuos. Elimine sua babaquice oratória e abandone sua mania de provocar distúrbios hidrocélicos nos companheiros de trabalho, percebendo que liderança se constrói a partir da admiração dos pares, jamais por posicionamentos inocuamente fiscalizadores. E principie a pensar alto, como Ser Humano, sem complexos de sacristão babão de padreco puritano, sendo mais congregacional sem perder a ternura jamais, nunca confundindo afetividade com fricote de menino fresquelete que nunca comeu um churrasco pra não se entregar aos prazeres da carne.

E vou terminando por aqui, se não acabo revelando o nome do dinossauro amebento, enrolocrata, nanico mental com obsessões de Calígula, muito embora só possua uma besta metida a cavalo lá pelas suas terras.