1415 – UMA ALTERNATIVA PÓS PANDEMIA
Diante das bobajadas regulatórias explicitadas pela atual equipe econômica brasileira, Paulo Guedes e equipe, sempre me recordo das palavras do notável economista Celso Furtado, primeiro Superintendente da SUDENE, dirigidas aos que chegavam da CEPAL, com matematizações e outros procedimentos econométricos: “Atenção, atenção! O quadrado da hipotenusa é igual à soma dos quadrados dos catetos. Mas será que o triângulo é retângulo?
Vou contar uma história real, depois explicitando as consequências: Em outubro de 2008, uma jovem nascida na China e criada em Yorkshire chegava em Oxford para estudar Economia. Mente criativa, estudiosa e empreendedora, Yuan Yang estava determinada a estudar novos amanhãs, tornando-se economista século XXI. Mas logo nos primeiros meses de curso mostrou-se frustrada com os ensinamentos recebidos, absurdamente estreitos, com excesso de matematizações, como se o sistema financeiro não fosse parte importante da economia, à época o sistema financeiro mundial em plena crise, provocando crises cada vez mais fortes no mundo real e afetando as mudanças climáticas. Quando externava suas preocupações aos seus professores, eles lhe garantiam que suas preocupações estariam sanadas no seu próximo nível de estudo. No mestrado que se inscrevera na famosa London School of Economics, ao invés de soluções efetivas, as exposições docentes tornavam-se cada vez mais complexas, deixando-a cada vez mais aturdida. Em determinada ocasião, sua mente clareou: em lugar de tentar questionar tudo, o que ela necessitava fazer seria dominar a matéria. E juntou-se aos estudantes de Economia que possuíam uma mentalidade similar a sua, instituindo uma rede global, onde logo estariam conectados mais de oitenta grupos de mais de trinta países, incluindo Estados Unidos, Alemanha, França e Peru. E rede exigia que se estudasse uma Economia que estivesse em sintonia com os desafios mundiais que se acumulavam. E propunha derrubar velhas ideias, como externava Buckminster Fuller, um dos notáveis do século XX: “Você nunca muda as coisas combatendo a realidade existente. Para mudar algo, construa um modelo novo que torne o modelo existente obsoleto.
Daí a edição de um livro que propõe sete maneiras pelas quais poderemos pensar como economistas do século XXI, mormente em cenários pós pandêmicos radicalmente necessários e desafiadores.
Quais seriam as sete maneiras de pensar como um economista do século XXI? Eis as propostas: 1. Mudar o objetivo. Ao invés de basear-se, como há anos, no PIB, estabelecer metas que busquem atender os direitos humanos de cada pessoa dentro dos meios do nosso planeta gerador de vida, envidando esforços e iniciativas de como prosperar com equilíbrio; 2. Analisar o quadro geral. Deixar de retratar o limitado diagrama do Fluxo Circular, que reforçam a narrativa neoliberal sobre a eficiência do mercado, a incompetência do Estado, a domesticidade do agregado familiar e a tragédia dos bens comuns, fortalecendo o Sol como fonte de energia; 3. Estimular a natureza humana. Favorecer um novo retrato da natureza humana, com seres sociais, interdependentes, próximos, fluidos em matéria de valores e dependentes do mundo vivo; 4. Compreender o funcionamento dos sistemas. Todo cuidado com as metáforas equivocadas dos equilíbrios mecânicos, oferta x procura, do século XIX; 5. Projetar para distribuir. Identificar as maneiras de projetar economias de modo que sejam melhor distribuídos os valores gerados; 6. Criar para regenerar. Evitar a degradação ecológica, evitando a continuidade de uma concepção industrial degenerativa; 7. Ser agnóstico em relação ao crescimento. Talvez não seja difícil desistir do crescimento do PIB como objetivo econômico, mas será muito mais difícil superar a dependência que temos em relação a ele.
O livro onde contém as estratégias acima, mais detalhadas: Economia Donut: uma alternativa aos crescimento a qualquer custo, Kate Raworth, Rio de Janeiro, Zahar, 2019, 367 p. A autora foi considerada, pelo The Guardian, o John Maynard Keynes do século XXI. E o livro foi classificado como o texto que vai mudar o mundo.
Urge uma nova mentalidade econômica. Economia é um conjunto de conhecimentos que engloba política, história, sociologia, antropologia, sistema emocional e empreendedorismo.
Sem tais perspectivas bem cultivadas, cursos de Economia estarão apenas graduando economerdas incompetentes ou economísticos metidos a galos doidos.
Fernando Antônio Gonçalves é pesquisador social