1414 – FÁBULA VERSÃO COVID-19


A Lucimary Landim, Terrinha para os mais achegados ao seu mundo, costuma dividir seu tempo em três grandes momentos: o tempo profissional, com dedicação ímpar às missões que lhe são conferidas; o tempo de folia carnavalesca, desde quando, com poucos meses de nascida, resolveu ensaiar uns passinhos de frevo, hoje sendo considerada a maior “tarada” em folguedos momescos, incluindo até os fora de época, daqui e d’além Pernambuco; e o tempo de ser uma pessoa dedicada à meditação transcendental, de guru e tudo o mais a que tem direito, encantando seus amigos e admiradores com ensinamentos que energizam e provocam reconversões periódicas de muitos ao gênero humano.

Entre seus diversos tempos, costuma a Terrinha brindar seu derredor com “pérolas” ouvidas quando de seus múltiplos contatos com animais das mais variadas espécies. E uma das suas últimas, uma das melhores diga-se de passagem, foi capturada diretamente de um boquirroto metido a “pessoa de fino trato”, vomitada numa churrascaria de muito bom gosto ambiental da Zona Sul. Ei-la, sem as discordâncias gramaticais emitidas pelo distinto, extraídas por absoluto respeito aos sempre sagazes leitores:

Um formiguinho, franzino acima da média, afogava-se num lago de pouca profundidade, muito embora para ele mais que abismal, quando vislumbra um baita paquiderme passeando bem perto da margem direita.

– Elefante, socorra-me!! Estou me afogando!!!!

– Formiguinho querido, eu não estou conseguindo lhe alcançar! O que devo fazer??

Num raciocínio mais que rápido, sem qualquer preconceito sexual, o formiguinho estruturou seu processo salvamento:

– O lago não é profundo. Entre nele e quando chegar perto de mim, bem em cima de mim, estique seu pinto, imaginando-se nos braços de uma elefoa bem boa, que eu me segurarei nele.

– Não vais ficar encabulado, formiguinho?

– De jeito algum, seu babaca!! Ande logo, senão eu me lasco todo.

O elefante seguiu rigorosamente as orientações do formiguinho. E foi um sucesso o salvamento daquele animalzinho trabalhador. Com direito até a foto em primeira página do pasquim A Selva, editado pela Bicho’s University, famosa mundialmente pelos seus dinossauros catedráticos.

Passado algum tempo, eis que o formiguinho sofre mais um bafejo da sorte. Ganha na quina, ficando pra lá de bem situado na sua cidade, abandonando até um antigo sonho, o de fazer concurso para professor de ensino superior. Com a bolada, comprou um baita BMW, óculos escuros, celular e umas meninas que gostariam de naufragar no Titanic nos braços daquele galã capaz de arrepiar orgasmicamente adolescente taradinha, pré  freqüentadora do mais alto meretrício.

Todo pimpão, eis que, uma tarde, passando pelo local do seu acidente, o formiguinho deparou-se com uma situação absolutamente inversa. O amigo elefante, já quase sem fôlego, afogava-se numa parte profunda do lago, gritando desesperadamente por socorro:

– Socorro me acudam!! Tou me afundando!!! Help!!!!

O formiguinho, plenamente consciente do tamanho do seu pipiu, mais uma vez aplicou estratégia vitoriosa: da mala do BMW retirou um cabo de aço, atrelou-o ao paralama traseiro, atirando a ponta contrária na direção do pobre paquiderme, que já despendia os últimos suspiros.

Mais uma vez nas manchetes dos jornais da selva, o formiguinho foi entrevistado por um ratinho falastrão metido a popular. Microfone em punho,  cristalinamente forneceu a moral do acontecimento recente: Quem tem BMW não necessita de pinto grande.

Disseram-me que aquele formiguinho tá paquerando cada égua….


Fernando Antônio Gonçalves é pesquisador social