1408 – COMO ESPIRITUALIZAR SUA EXISTÊNCIA


A Nevinha, filha do estimado Lucas dos bancos UNICAP e já no ensino superior, me enviou, quinze dias atrás, um zapzap  declarando-se muito enfadada com o isolamento social de mais de ano. Que lhe tem causado algumas enervantes angústias existenciais, desfavorecendo até sua espiritualidade “meio fraquinha” (expressão dela). E encarece sugestões sobre como fortalecer seu “caminhar para Deus” (outra expressão dela). Eis a resposta, demorada porque exigiu algum estudo reflexivo:
Querida Nevinha: 

Parabéns por continuar espiritualista nestes tempos de inconformismos e revoltas. Ser espiritualista é aquele que acredita que nele nem tudo é matéria, o que, de modo algum, implica na crença das manifestações dos Espíritos. O que você está buscando é se espiritualizar mais, fortalecer o seus campo de interesse na transcendência, vivendo num mundo sem a ele prender-se, nem para ele ser exclusiva. 

Para espiritualizar-se mais, creio que o melhor caminho é o erradicar suas atuais angústias existenciais que a estão incomodando muito, provocando uma “desespiritualização cumulativa”, creio que por ausência de leituras que fortaleçam sua natureza cognitiva. Indico-lhe algumas leituras, para mim interconectadas por derradeiro, que muito ampliarão sua enxergância na área das Ciências Humanas, favorecendo seu fortalecimento técnico-científico na área da Informática, sua graduação futura. 

Entretanto, para favorecer um caminhar seu mais resoluto e resiliente para os amanhãs que já chegaram, encareceria preliminarmente uma boa varredura das suas angústias, medos, culpas, entre os desconfortos existenciais que estão tumultuando seus sonhos e prazeres cotidianos, lúdicos e lúbricos, através de páginas que ratificam o dizer de Carl Jung: “Aquele que olha para dentro, desperta.” O livro chama-se Talvez você deva conversar com alguém: uma terapeuta, o terapeuta dela e a vida de todos nós, Lori Gottlieb, São Paulo, Vestígio, 2021, 446 p. A autora tem um estilo delicioso, levíssimo, altamente reflexivo e provocador, sincero e cativante, próprio de quem busca conhecer melhor a condição humana. Ela escreve semanalmente no New York Times e seu livro, no Brasil, já vai  na 6ª. reimpressão. Adquira um exemplar para consumo próprio, lendo, relendo e rabiscando sem dó nem piedade. As páginas do livro servindo-lhe de espelho.

Um segundo livro muito favoreceria sua caminhada: Nietzsche hoje: sobre os desafios da vida cotidiana, Viviane Mosé, Petrópolis RJ, Vozes, 2018, 154 p. A autora, brasileira capixaba, é psicóloga e psicanalista, mestra e doutora em Filosofia. Sem erudições cavilosas, a autora nos aponta os impasses que vivemos nesta complexa conjuntura civilizatória. Ela nos mostra como algumas pessoas possuem imaturidades múltiplas, inclusive políticas, sempre opondo os bons contra os maus, como se fôssemos sempre ótimos.

Por fim, para não comprometer suas atividades discentes, familiares, profissionais e namoricais, permito-me recomendar a leitura de um livro que está me comovendo muito, estando eu na sua metade: Humanidade: uma história otimista do homem, Rutger Bregman, São Paulo, Planeta, 2021, 464 p. Um livro que desmorona a visão cínica dos negativistas que afirmam que os seres humanos são mesquinhos e egoístas. O autor, historiador e autor de cinco outros livros, é considerado um dos mais aclamados pensadores europeus. A partir de uma argumentação revolucionária e convincente, ele mostra que uma humanidade generosa e solidária não é mais uma simples hipótese, mas uma realidade amplamente comprovável. Leitura obrigatória e inspiradora para quem busca reconforto diante das situações pandêmicas, onde incultos e insanos mentais se postam como salvadores da pátria, inimigos das pesquisas  científicas e fomentadores de ódios nada civilizatórios.  

Não tenha pressa em ler as páginas acima. E lembre-se sempre da advertência de quem nasceu  cega, surda e muda, tonando-se mundialmente notável, Hellen Keller: “A única coisa pior do que ser cego, é enxergar mas não ter visão.”

Disponha sempre deste tio que se sente permanentemente inconcluso.


Fernando Antônio Gonçalves é pesquisador social