1326 – SABOROSOS ARQUIVOS CONFESSIONAIS
Pelos Correios acabo de receber Diários Intermitentes: 1937-2002, Celso Furtado (1910-2004), São Paulo, Companhia das Letras, 2019, 446 p., com apresentação primorosa da jornalista Rosa Freire d’Aguiar e prefácio de João Antônio de Paula, professor do Cedeplar – Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Minas Gerais.
Desde 1938, a apresentação da sua esposa Rosa Freire de Aguiar comprova, Furtado se tinha atribuído uma tarefa hercúlea, “a de pensar o Brasil”, mais precisamente “a civilização brasileira”.
Para quem anda historicamente “desligadão”, Celso Monteiro Furtado, nascido em Pombal PB, 26 de julho de 1920 e eternizado no Rio de Janeiro em 20 de novembro de 2004) foi um economista e pensador brasileiro, responsável pela arquitetura de inúmeras políticas de cunho econômico-social no Brasil nas últimas décadas. Adepto de uma atitude intervencionista no funcionamento da economia, seu pensamento apresenta-se, sob vários aspectos, em sintonia com as ideias promovidas pela CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina), órgão da ONU, no Chile, criado para auxiliar os países latino-americanos no desenvolvimento de ações que permitissem evolução social e econômicao.
Celso Monteiro Furtado era filho de Maria Alice Monteiro Furtado, de família de proprietários de terra, e Maurício de Medeiros Furtado, de família de magistrados. Após seus estudos secundários no Liceu Paraibano e no Ginásio Pernambucano, Recife, chega ao Rio em 1939, entra para a Faculdade Nacional de Direito e começa a trabalhar como jornalista na Revista da Semana. Em 1943, é aprovado no concurso do DASP para assistente de organização, indo trabalhar no Rio e em Niterói. Expedicionária da Força Aérea Brasileira, segue para a Itália, na Toscana, servindo como oficial de ligação junto ao V Exército norte-americano, lá sofrendo acidente quando em missão durante a ofensiva final dos aliados no Norte da Itália.
Foi Doutor em Economia (1948) pela Universidade de Paris (Sorbonne). Realizou estudos de pós-graduação na Universidade de Cambridge, Inglaterra (1957), sendo Fellow do King`s College. Posteriormente, Celso Furtado ocupa o cargo de diretor do então BNDE (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico) onde permanecerá por um ano, para logo depois ser convidado pelo presidente Juscelino Kubitschek para elaborar o Plano de Desenvolvimento do Nordeste, que daria origem à SUDENE, órgão pelo qual foi responsável durante cinco anos (1959-64).
Em 1949, instala-se em Santiago do Chile para integrar a recém-criada Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL), órgão das Nações Unidas que se transformará na única escola de pensamento econômico surgida no Terceiro Mundo. Nasce seu filho Mário. No ano seguinte, quando o economista argentino Raúl Presbisch assume a secretaria-executiva da CEPAL, Furtado é nomeado Diretor da Divisão de Desenvolvimento, e até 1957 cumpre missões em diversos países do continente, como Argentina, México, Venezuela, Equador, Peru e Costa Rica, e visita universidades norte-americanas onde então se inicia o debate sobre os aspectos teóricos do desenvolvimento. É de 1950 seu primeiro ensaio de análise econômica, “Características gerais da economia brasileira”, publicado na Revista brasileira de Economia, FGV.
Em 1953, preside no Rio o Grupo Misto CEPAL-BNDE, que elabora um estudo sobre a economia brasileira, com ênfase especial nas técnicas de planejamento. O relatório do Grupo Misto, editado em 1955, será a base do Plano de Metas do governo de Juscelino Kubitschek. Em 1954, com um grupo de amigos, cria o Clube de Economistas, que lança a Revista Econômica Brasileira. Nasce seu filho André. Em 1956, mora na Cidade do México, em missão da CEPAL. Passa o ano letivo de 1957-58 no King’s College da Universidade de Cambridge, Inglaterra, a convite do professor Nicholas Kaldor. Aí escreve Formação Econômica do Brasil, seu livro mais difundido.
De volta ao Brasil, desliga-se definitivamente da CEPAL e assume uma diretoria do BNDE. É nomeado, pelo presidente Kubitschek, interventor no Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste. Elabora para o governo federal o estudo “Uma política de desenvolvimento para o Nordeste”, origem da criação, em 1959, da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), com sede no Recife. Em 1961, como seu superintendente, encontra-se em Washington com o presidente John Kennedy, cujo governo decide apoiar um programa de cooperação com o órgão. Em 1962 é nomeado, no regime parlamentar, o primeiro titular do Ministério do Planejamento, quando elabora o Plano Trienal apresentado ao país pelo presidente João Goulart por ocasião do plebiscito visando a confirmar o parlamentarismo ou a restabelecer o presidencialismo. No ano seguinte deixa o Ministério do Planejamento e retorna à Superintendência da SUDENE, quando concebe e implanta a política de incentivos fiscais para os investimentos na região.
O Ato Institucional nº 1, publicado três dias depois do golpe militar de 31 de março de 1964, cassa os direitos políticos d Celso Furtado por dez anos. Têm início seus anos de exílio. Ainda em abril, aceita um convite para dar seminários em Santiago do Chile. Meses depois, em New Haven, Estados Unidos, será pesquisador graduado do Instituto de Estudos do Desenvolvimento da Universidade de Yale. Faz conferências em diversas universidades norte-americanas e participa de vários congressos sobre a problemática do Terceiro Mundo. Em 1965, muda-se para a França, a convite da Faculdade de Direito e Ciências Econômicas da Universidade de Paris, e assume a cátedra de professor de Desenvolvimento Econômico. É o primeiro estrangeiro nomeado para uma universidade francesa, por decreto presidencial do general de Gaulle. Permanecerá nos quadros da Sorbonne por vinte anos.
Em junho de 1968 vem ao Brasil pela primeira vez após sua cassação, a convite da Câmara dos Deputados. No correr do decênio de 1970, faz diversas viagens a países da África, Ásia e América Latina, em missão de agências das Nações Unidas. No mesmo decênio, é professor-visitante da American University, em Washington, da Columbia University, em Nova York, da Universidade Católica de São Paulo e da Universidade de Cambridge, onde é o primeiro ocupante da cátedra Simon Bolívar e é feito Fellow do King’s College. Entre 1978-81, integra o Conselho Acadêmico da recém-criada Universidade das Nações Unidas, em Tóquio. No mesmo período, recebe um mandato do Commitee for Developement Planning, da ONU. Entre 1982-85, como diretor de pesquisas da Ecole des Hautes Études en Sciences Sociales, dirige em Paris seminários sobre a economia brasileira e internacional.
A partir de 1979, quando é votada a Lei da Anistia, retorna com frequência ao Brasil, reinsere-se na vida política e é eleito membro do Diretório Nacional do PMDB. Casa-se com a jornalista Rosa Freire d’Aguiar. Em janeiro de 1985 é convidado pelo recém-eleito presidente Tancredo Neves para participar da Comissão do Plano de Ação do Governo. É nomeado embaixador do Brasil junto à Comunidade Econômica Europeia, em Bruxelas, assumindo o posto em setembro. Integra a Comissão de Estudos Constitucionais, presidida por Afonso Arinos, para elaborar um projeto de nova Constituição. Em março de 1986 é nomeado ministro da Cultura do governo do presidente José Sarney. Sob sua iniciativa, é aprovada a primeira lei de incentivos fiscais à cultura. Em julho de 1988 pede demissão do cargo, retornando às atividades acadêmicas no Brasil e no exterior. Torna-se Doutor Honoris Causa pela Universidades Técnica de Lisboa, pela Estadual de Campinas-UNICAMP, pelas universidade federai de Brasília, do Rio Grande do Sul, da Paraíba e da Université Pierre Mendès-France, de Grenoble, França.
Em agosto de 1997 é eleito para a cadeira nº 11 da Academia Brasileira de Letras. Empossado em 31 de outubro, é saudado pelo Acadêmico Eduardo Portella.
Ele foi Patrono dos Economistas 1966 da Universidade Católica de Pernambuco, onde me graduei. Ele não comparecendo à solenidade por impedimento verde-oliva.
A leitura dos Diários Intermitentes do Celso Furtado é excelente oportunidade para quem deseja ampliar suas análises sobre os amanhãs brasileiros! E para quem deseja conhecer um cadinho mais a caminhada de um nordestino arretado de ótimo !!
Fernando Antônio Gonçalves é pesquisador social